Washington Post não apoia nenhum candidato à Casa Branca: “Facada nas costas” e “cobardia”

Colunistas e funcionários do jornal acusam o CEO de ter cedido ao proprietário, Jeff Bezos, que terá bloqueado apoio a Kamala Harris. Decisão semelhante também deixa LA Times em tumulto.

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Sede do jornal norte-americano, em Washington D.C. Candice Tang / SOPA Images via Reuters
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Colunistas, jornalistas, funcionários e subscritores do The Washington Post (com quem o PÚBLICO tem um acordo para a publicação de artigos) estão “furiosos” e “estupefactos” com a decisão tomada pela direcção do jornal norte-americano, anunciada na sexta-feira, de não apoiar nenhum dos candidatos à presidência dos Estados Unidos na eleição de 5 de Novembro. É a primeira vez em 36 anos que o diário não declara o seu apoio a um dos concorrentes à Casa Branca.

Segundo Will Lewis, director e CEO do jornal, o Washington Post pretende “regressar às suas raízes de não apoiar nenhum dos candidatos”. Mesmo reconhecendo que a decisão poderá ser vista como “um apoio tácito a um dos candidatos, ou como a condenação do outro, ou como uma demissão das responsabilidades” da direcção, Lewis diz que se trata de uma “declaração de apoio à capacidade dos nossos leitores para decidirem por si próprios”.

“Que insulto para aqueles de nós que puseram literalmente as suas carreiras e as suas vidas em risco, para denunciar ameaças aos direitos humanos e à democracia”, atirou, no entanto, Karen Attiah, colunista no jornal, denunciando uma “enorme facada nas costas”.

Através de um comunicado, o sindicato The Washington Post Guild, que representa quase mil jornalistas e funcionários do jornal, garante que a direcção já tinha redigido um editorial a declarar o seu apoio à vice-presidente e candidata democrata Kamala Harris, e que a decisão de não o publicar foi tomada pelo proprietário do jornal, o multimilionário e fundador da Amazon, Jeff Bezos.

“O papel de um Conselho Editorial é precisamente este: partilhar opiniões sobre as notícias que afectam a nossa sociedade e cultura e apoiar candidatos para ajudar a orientar os leitores”, lê-se no comunicado. “Esta decisão prejudica o trabalho dos nossos membros numa altura em que deveríamos estar a reforçar a confiança dos nossos leitores e não a perdê-la.”.

Robert Kagan, um dos mais antigos e reconhecidos editores e colunistas do jornal, apresentou mesmo demissão, em protesto contra a direcção, e, segundo o site noticioso Semafor, o Washington Post perdeu quase dois mil subscritores em cerca de 24 horas.

Um artigo assinado por outros 16 colunistas do Post rotula a decisão da direcção como um “erro terrível”, que “representa um abandono das convicções editoriais fundamentais do jornal” que amam e para o qual trabalharam “durante 218 anos”.

“Este é um momento para a instituição deixar claro o seu compromisso sobre os valores democráticos, o Estado de direito e as alianças internacionais, e sobre a ameaça que Donald Trump representa para eles – os argumentos exactos que o Post fez ao apoiar os adversários de Trump em 2016 [Hillary Clinton] e em 2020 [Joe Biden]”, sublinham os colunistas.

Numa mensagem publicada no X (antigo Twitter), Marty Baron, antigo editor-executivo do jornal, descreveu a posição da direcção como uma “cobardia” e reveladora de “uma perturbadora falta de espinha dorsal”.

A opção do Washington Post de não apoiar nem Harris nem Trump na corrida à Casa Branca foi revelada um dia depois de Patrick Soon-Shiong, proprietário do Los Angeles Times, também ter bloqueado um apoio do jornal californiano a Harris. Um editor, dois membros da direcção e alguns jornalistas demitiram-se em protesto.

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