Gémeas. Contactos entre Casa Civil e D. Estefânia fora do “âmbito” da IGAS

Objectivo da IGAS é apurar como é que “as entidades hospitalares reagiram a intervenções externas”. Como as gémeas não receberam tratamento no D. Estefânia, contactos da Casa Civil não são relevantes.

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A Inspetora da IGAS, Maria de Lurdes Lemos, ouvida, esta sexta-feira, na comissão de inquérito ao "caso das gémeas" ANTÓNIO PEDRO SANTOS / LUSA
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A Inspecção-Geral das Actividades em Saúde (IGAS) não investigou os contactos entre a Casa Civil da Presidência da República e o Hospital Dona Estefânia, uma vez que o hospital não foi permeável a nenhuma interferência. “O nosso âmbito são as entidades hospitalares”, explicaram as inspectoras Marta Gonçalves e Maria de Lurdes Lemos, ouvidas, esta sexta-feira, na comissão parlamentar de inquérito (CPI) ao “caso das gémeas”.

Na sua audição na CPI, no passado mês de Julho, Maria João Ruela, assessora da Casa Civil da Presidência da República, afirmou que contactou o Hospital D. Estefânia, em Lisboa, para obter "informação genérica" sobre o encaminhamento dado a doentes com atrofia muscular espinhal, a doença das gémeas. Esta sexta-feira, os deputados quiseram saber junto das inspectoras da IGAS quais foram as diligências tomadas pela entidade para perceber quem falou a assessora do Presidente da República.

Ambas as inspectoras responderam que essa linha de investigação não foi seguida, uma vez que o "âmbito" da IGAS "são as entidades hospitalares e o Serviço Nacional de Saúde”. Para Marta Gonçalves e Maria de Lurdes Lemos, não foi necessário perceber com quem teria falado Maria João Ruela, já que, mesmo que tivesse existido uma tentativa de interferência política junto do Hospital D. Estefânia, a entidade hospitalar não teria respondido ao pedido.

As crianças não foram "consultadas" no D. Estefânia e o medicamento Zolgensma não foi prescrito por esse hospital. Por isso mesmo, essa linha de investigação "perde importância", explicou Marta Gonçalves, a primeira das inspectoras a ser ouvida esta sexta-feira em sede de inquérito.

A função da IGAS não é "apurar interferências públicas" mas avaliar como é que "as entidades hospitalares reagiram a intervenções externas", explicou Maria de Lurdes Lemos.

Foi por esse mesmo motivo que a Inspecção-Geral não ouviu Nuno Rebelo de Sousa, responsável por apresentar o caso das duas crianças a António Lacerda Sales, antigo secretário de Estado da Saúde. Terá sido na sequência da reunião entre Rebelo de Sousa e Lacerda Sales que o antigo governante terá solicitado à sua secretária pessoal, Carla Silva que contactasse o Hospital Santa Maria para fazer um pedido de consulta para as crianças - um episódio que a própria relatou à CPI.

Já junto do Hospital Santa Maria, as inspectoras esclareceram que foram inquiridas várias pessoas para se perceber se teriam sido contactadas pela Presidência da República, mas essa informação não foi confirmada.

Na sua audição na comissão de inquérito, a médica Teresa Moreno revelou que as crianças eram tratadas, nos corredores do hospital, por "as meninas do Presidente" - já a mãe das gémeas tinha dito que no Hospital lhe diziam que estava lá a "mando" de Marcelo Rebelo de Sousa.

Sobre os rumores da intervenção da Presidência da República, as inspectoras dizem não ter encontrado evidências. Foram questionados os "vários níveis de decisão" do hospital, mas não foi encontrada "nenhuma evidência que sustentasse esses ditos rumores que estavam a circular pelo hospital", disse Marta Gonçalves.

"Secretária não tem autonomia"

O relatório da IGAS, que concluiu que os requisitos de legalidade no acesso à consulta por parte das duas gémeas não foram cumpridos, tem sido uma das fontes mais utilizadas pelos deputados na comissão parlamentar de inquérito. Esta sexta-feira, as inspectoras voltaram a defender o que já tinham apresentado no relatório, assinalando que não alterariam as conclusões a que chegaram se o relatório fosse elaborado hoje.

Questionadas sobre como chegaram à conclusão de que teria sido Lacerda Sales a pedir a Carla Silva para marcar a consulta, as inspectoras apontaram para o encadeamento dos acontecimentos. A consulta só é marcada depois da reunião entre o antigo governante e Nuno Rebelo de Sousa, sendo que Lacerda Sales já afirmou que o filho do Presidente lhe deu conta do caso das gémeas nesse encontro.

Para além disso, todos os inquiridos pela IGAS "referiram que uma secretária não tem autonomia para fazer essas diligências", sem ter recebido uma "ordem superior", disse Marta Gonçalves.

A consulta foi marcada de "forma irregular", asseverou Marta Gonçalves. No entanto, depois da primeira consulta, as inspectoras não identificaram outros factores que permitam dizer que as crianças tenham tido um tratamento "preferencial". As gémeas eram "elegíveis para o medicamento", sublinhou a inspectora", e, por isso, não foi possível considerar que o "erário público" tivesse sido "lesado".

Antes das audições, a CPI aprovou a suspensão dos trabalhos durante a discussão orçamental, entre 30 de Outubro e 2 de Dezembro.

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