Médicos de família lembram que fazem vigilância da gravidez há muitos anos

Presidente do colégio da especialidade da Ordem dos Médicos diz que “corporativismos têm que ficar de lado” e que o que é preciso é promover o “trabalho de equipa”.

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Médicos de família avisam que não aceitarão “atropelos” às suas competências e responsabilidades Nelson Garrido
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O colégio da especialidade de medicina geral e familiar da Ordem dos Médicos (OM) não gostou de ver representantes dos enfermeiros especialistas em saúde materna e obstétrica a afirmar que os médicos de família não têm sensibilidade para a área obstétrica e fez questão de repudiar "veementemente" esta "insinuação". Em comunicado, o colégio presidido por Paula Broeiro lembra que os especialistas em medicina geral e familiar são "altamente qualificados e com formação rigorosa" e têm assegurado, ao longo dos anos, “o acompanhamento contínuo em todas as fases da gravidez, incluindo o diagnóstico e a orientação das situações de maior complexidade".

Os representantes dos enfermeiros especialistas em saúde materna e obstétrica defendem há anos um alargamento das suas funções nesta área, nomeadamente no acompanhamento das grávidas de baixo risco, e consideram que há agora uma oportunidade para fazer valer os seus argumentos, até tendo em conta os problemas - que se têm acentuado e tornado mais visíveis no Verão - nos serviços de urgência de ginecologia-obstetrícia, alguns dos quais estão a fechar intermitentemente por falta de médicos em número suficiente para completar as escalas.

Mas o colégio da especialidade de medicina geral e familiar da Ordem dos Médicos (OM) não gostou de ver posta em causa a preparação dos médicos de família para fazer a vigilância das grávidas. Considerando “inadmissível que se sugira um retrocesso na organização dos cuidados de saúde, desvalorizando a competência dos médicos de família", avisam que não aceitarão “atropelos” às suas competências e responsabilidades.

"Desde 1980 que os médicos de família fazem a vigilância da gravidez nas unidades coordenadoras funcionais e num trabalho de equipa", recorda a presidente do colégio da especialidade, Paula Broeiro, que trabalha numa unidade de cuidados de saúde personalizados nos Olivais, onde segue grávidas “sempre em equipa com enfermeiros especialistas”.

"Conversar uns com os outros"

“Só nos insurgimos por dizerem que não temos sensibilidade para esta área. Não há falta de sensibilidade. O que há é falta de médicos e também há falta de enfermeiros. O que temos é que conversar uns com os outros e encontrar uma solução para a população. Há que mudar muita coisa mas não se deve mudar o que está bem", argumenta a médica, que admite que a solução para a crise das urgências de ginecologia-obstetrícia "se calhar tem que passar por concentrar recursos". "Temos que ser criativos nestes tempos de crise e trabalhar todos em conjunto. E os corporativismos têm que ficar de lado", propõe.

Sem querer entrar em conflito com os médicos, "que são essenciais", a presidente da mesa do colégio de especialidade de enfermagem de saúde materna e obstétrica, Alexandrina Cardoso, concorda que a prioridade "é criar uma lógica de trabalho de equipa", mas volta a defender que a discussão "tem que estar centrada nas necessidades das pessoas, não nos profissionais".

“Estamos noutro tempo. Hoje os profissionais de saúde são altamente qualificados e podem assumir na íntegra as suas competências, que, neste caso, vão para além da vigilância da gravidez. Há todo um trabalho que os enfermeiros especialistas podem fazer, como o de ajudarem as mulheres a ajustarem-se à gravidez, a definirem o seu plano de parto, a compararem as diferentes opções, a prepararem-se para o parto. E podem ainda acompanhá-las no pós-parto, que é uma fase em que as mulheres ficam muitas vezes abandonadas", sustenta. "O que é inaceitável é que haja serviços fechados por falta de médicos. Temos que parar, sentarmo-nos e vermos quantos profissionais são precisos e para fazer o quê", sintetiza.

Já a presidente da Associação Sindical Portuguesa dos Enfermeiros, Lúcia Leite, que é enfermeira especialista em saúde materna e obstétrica, repete que é necessário "insistir na necessidade de mudar a organização dos cuidados" nesta área e que isso é "algo a que a Ordem dos Médicos sempre se opôs" ao longo dos anos. E volta a defender que a situação actual é uma oportunidade para os enfermeiros explicarem o que está aqui em causa e fazerem valer os seus argumentos.

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