Garantia pública para compra de casa: bala de prata ou gato por lebre?

Sou um investigador em Portugal, ou seja, para um banco, um desempregado sem IRS. E no entanto, continuo cá a contribuir para a ciência nacional. Que parvo que eu sou, como diriam os Deolinda.

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Megafone P3: Garantia pública para compra de casa: bala de prata ou gato por lebre Manuel Roberto
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Declaração prévia de interesses: se puder e conseguir, tenciono aproveitar a Garantia Pública para a compra de casa.

Um dos focos do Governo de Luís Montenegro é investir nos jovens. Investir para os reter em Portugal, investir para melhorar as suas condições de vida, investir para renovar a demografia do país. Ora, estes fins não diferem dos de qualquer outro partido: todos conseguem fazer um diagnóstico do problema. Nenhum consegue apresentar uma solução.

Quando estava em funções, o PS achava que resolvia os problemas dos jovens portugueses oferecendo um "prémio salarial" para diplomados do Ensino Superior e uma semana de férias para quem acabasse o secundário, sendo que os números falam por si quanto ao sucesso destas medidas. Já o PSD tentou outras abordagens, como a criação de um ministério dedicado à juventude e medidas específicas para áreas como a educação, saúde, impostos e habitação.

O busílis da questão é que o anúncio destas medidas é em grande, mas o seu impacto muito pequenino. Leia-se, pequenino a resolver a emigração e qualidade de vida dos jovens e bem grande no Orçamento de Estado. É aqui que entra a aposta, quero dizer, investimento: o plano é passar a ideia de que o Governo faz e acontece, e que finalmente os jovens terão futuro em Portugal. Chegando o OE, ou este passa e depois logo se vê como se paga a conta, ou chumba e em eleições há bandeiras para abanar e dizer "Não nos deixaram dar resposta às próximas gerações!". É também uma excelente maneira de tentar roubar eleitorado jovem aos outros partidos.

É gato por lebre. E vejamos rapidamente porquê: na educação, as medidas apresentadas não passam de uma fraca continuação do que já foi iniciado pelo PS em termos de alojamento estudantil e flexibilização do acesso às bolsas de estudo. Já na saúde, cheques para ir ao privado e produtos de higiene menstrual gratuitos — esta última importante e necessária mas não exclusiva a jovens, certo? Finalmente, sobram finanças e habitação, e estas merecem mais a nossa atenção.

"Aqui sim, medidas que podem fazer a diferença para aumentar os salários mais baixos e garantir independência à juventude", pensa o leitor. Será? O critério para estas medidas, e assumido diversas vezes pelo Governo, é apenas idade e não rendimento, o que traz um problema até constitucional.

As alterações ao IRS Jovem são o primeiro indício de que a aposta pode não correr assim tão bem. Não só foi uma medida mal desenhada que leva a perda de receita "considerável", segundo o FMI, como implica uma acentuada carga fiscal quando o jovem contribuinte deixar de beneficiar dela. Tirando isso, é uma medida que beneficia os mais ricos: perde-se a "progressividade" pois quem ganha o salário mínimo já não paga IRS e quem ganha cinco mil euros por mês vai deixar de o pagar. Desde que tenham menos de 35 anos, claro.

Finalmente, no que toca à habitação, foi o próprio Governo que baixou as expectativas: "Não há bala de prata". Para quem arrenda casa, não há tectos às rendas, obviamente. O Porta 65 é alargado mas conseguir arrendar continua a ser custoso, apenas menos custoso se se conseguir o subsídio do Estado. Sobra então a compra de casa, o sonho impossível. Como não é suficiente isentar o pagamento de IMT e registos para possibilitar os jovens a comprar um imóvel, o Governo oferece também a entrada. A quase todos, até aos 35. Mais velhos que isso podem emigrar se não conseguem viver cá.

Para alguns a casa fica mais barata, para outros, antes da dívida, fica a dúvida: "Com o meu salário, como consigo pagar a prestação? E se conseguir, como pago os móveis? Já para não falar em obras...". E ainda para outros, os que vendem os imóveis, torna-se uma oportunidade bem mais dourada. Estaria a ser incorrecto se não dissesse que existem outros limites para além da idade: estão excluídos jovens que ganhem mais de 80 mil euros anuais (cerca de 5700 euros por mês) e os imóveis não podem ultrapassar os 450 mil euros. Sem ser isso, é "free real estate" — os jovens entenderão a piada.

Voltando à minha declaração inicial, claro que tenho interesse em aproveitar esta Garantia Jovem, se puder ou conseguir. Sou um investigador em Portugal, ou seja, para um banco, um desempregado sem IRS. E no entanto, continuo cá a contribuir para a ciência nacional. Que parvo que eu sou, como diriam os Deolinda. Ou mudamos de país, ou temos de forçar o país a mudar.

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