Edni López desapareceu no aeroporto na Venezuela. María Oropeza filmou a própria detenção

Venezuela enfrenta um tsunami de detenções ilegais após protestos contra a anunciada reeleição de Maduro. Quatro jornalistas são acusados de terrorismo. Oposição marca vigília pelos presos políticos.

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A mãe de Edni López, uma professora universitária detida sem razão aparente, não desiste de pedir a liberdade para a filha Stringer / REUTERS
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A última vez que se soube do paradeiro de Edni López foi no domingo, quando enviou uma mensagem ao namorado do Aeroporto Internacional de Maiquetía, La Guaira (Venezuela). “O oficial de imigração tirou-me o passaporte porque expirou. Em nome de Deus, não seja eu tramada por causa de um erro de sistema”, escreveu a professora universitária de Ciência Política numa mensagem partilhada com a Associated Press, antes de se lhe perder o rasto.

A trabalhadora social e poeta premiada de 33 anos preparava-se para embarcar num voo para a Argentina para visitar uma amiga quando foi detida, sem que se saiba sob que acusações, sem acesso a advogado e sem que qualquer informação tenha sido dada à família. “Quando a sua mãe e os seus amigos souberam que ela tinha perdido o voo, iniciaram uma busca frenética nos centros de detenção”, conta o Noticiero Digital.

Na terça-feira – mais de 48 horas depois – souberam que ela estava retida e mantida incomunicável pela polícia de inteligência militar venezuelana. No entanto, nesse mesmo dia, a CNN em Espanhol questionou a Procuradoria-Geral da Venezuela sobre Edni López e, em resposta, o procurador-geral, Tarek Saab, garantiu que não tinha conhecimento do caso e acrescentou que faria as investigações correspondentes.

“Por favor, devolvam-me a minha filha. […] Ela não é nenhuma delinquente”, declarou à CNN a mãe, Ninoska Barrios, dizendo desconhecer o motivo pelo qual foi detida e garantindo que Edni não tem nenhuma filiação partidária: “Espero que tenha sido um mal-entendido”.

María Oropeza, uma advogada ligada à oposição a Maduro, transmitiu em directo o momento da sua detenção. Na terça-feira à noite, horas depois de ter gravado um vídeo condenando a onda de prisões ilegais que o regime está a efectuar por todo o país, a operação tun-tun [truz-truz] bateu à sua porta, num apartamento em Caracas.

“Por favor, estou disposta a colaborar, mas preciso que me diga se tem algum mandado de captura”, ouve-se María dizer, enquanto agentes forçavam a entrada com um pé de cabra, dizendo que não estavam ali para conversar. “Eles estão a entrar na minha casa arbitrariamente. Sem qualquer mandado de busca”, disse ainda, antes da transmissão ficar sem imagem e logo após se ouvirem pancadas secas enquanto alguém dizia: “Não resistas”.

María Oropeza foi a mandatária da campanha da Plataforma Unitária Democrática, liderado por María Corina Machado e o candidato Edmundo González Urrutia, no estado rural de Portuguesa, no centro do país. Durante aqueles minutos que antecederam a sua detenção, María Corina ainda publicou um pedido de ajuda a Oropeza na rede social X.

No vídeo que publicara horas antes, María Oropeza afirmava: “Sabemos que o que estão a fazer – sequestros, desaparecimentos e até bater até à morte, sem sequer uma notificação por parte de algum organismo público – nos mostra que enfrentamos a tirania mais cruel que se vive em toda a história da América nos últimos 40 anos. […] Por isso te digo, venezuelano: sei que estamos num momento muito difícil, sei que temos de tomar maior precaução, mas o medo não nos pode dominar”.

María e Edni são apenas duas entre os mais de 2200 presos políticos que Nicolás Maduro anunciou terem sido detidos por serem “delinquentes” e “drogados” que seriam levados para novas prisões de alta segurança, algumas em construção. Esta quinta-feira de manhã, o Foro Penal, uma organização não-governamental de defesa dos direitos humanos da Venezuela, contabilizava 1229 prisões “verificadas e identificadas, entre os quais 105 adolescentes, cinco indígenas, 16 deficientes e 157 mulheres”.

Pelo menos 13 jornalistas foram também detidos e quatro deles foram acusados de terrorismo, segundo informou o Sindicato Nacional dos Trabalhadores de Imprensa da Venezuela (cujo site está indisponível) num comunicado reproduzido em vários órgãos de comunicação social fora do país e nas redes sociais. Dois deles são fotojornalistas (Yousner Alvarado e Deisy Peña), um é operador de câmara (Paúl León) e outro é o jornalista e líder político (Jose Gregorio Carnero).

“Denunciamos o uso ilegal e arbitrário de leis antiterrorismo na Venezuela, especialmente contra jornalistas e fotojornalistas detidos durante protestos pós-eleitorais no país. Em todos os casos, foi impedida a tomada de posse da defesa privada”, lê-se no comunicado.

O clima de medo e repressão continua, mas ainda assim a oposição organizada no Comando Venezuela, a cúpula da campanha de Edmundo González e María Corina, marcaram para o fim da tarde desta quinta-feira (noite em Portugal) uma vigília pela liberdade dos presos políticos no país: “Leva a tua faixa, cartaz ou foto do teu familiar preso político para quem exiges a liberdade”.

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