Desinformação sobre esfaqueamento provoca ataques islamofóbicos no Reino Unido
A manifestação violenta acontece após informações falsas sobre o suspeito do esfaqueamento terem circulado nas redes sociais.
Uma multidão aparentemente ligada a grupos de extrema-direita concentrou-se esta terça-feira à tarde junto a uma mesquita de Southport, no Reino Unido, e entrou em violentos confrontos com a polícia, atirando tijolos e garrafas de vidro e pegando fogo a uma viatura policial. Quase 40 polícias ficaram feridos e oito sofreram ferimentos graves, incluindo fracturas.
Os desacatos, que decorreram no fim de uma vigília em memória das vítimas do esfaqueamento ocorrido naquela localidade (uma delas é uma criança portuguesa), ganharam dimensão depois de terem circulado nas redes sociais informações falsas sobre o suspeito.
Um rapaz de 17 anos foi detido na segunda-feira por suspeitas de ter levado a cabo o ataque. A polícia não divulgou quaisquer detalhes sobre a sua identidade, a não ser que se tratava de uma pessoa nascida em Cardiff e residente em Banks, uma vila próxima de Southport. No entanto, segundo o The Guardian, um nome começou a correr na internet e surgiram comentários islamofóbicos e apelos a deportações em massa. A Secretária de Estado dos Assuntos Internos do Reino Unido já condenou, no Parlamento, a disseminação de informação falsa.
As autoridades de Merseyside afirmaram que um polícia ficou com o nariz partido e que vários veículos ficaram danificados depois de os manifestantes lhes terem pegado fogo. O serviço de ambulâncias inglês atendeu 39 pacientes no total, todos polícias. Desses, 27 foram levados para o hospital, os restantes tiveram alta no local. As forças de segurança acreditam que o protesto foi organizado pela English Defense League (EDL), organização islamofóbica de extrema-direita.
O especialista em desinformação e propaganda Marc Owen Jones calculou, ao fim da tarde, que as alegações de que o atacante é muçulmano, migrante ou refugiado tinham chegado a mais de 27 milhões de pessoas. Uma das contas responsáveis pela forte disseminação dessas versões faz-se passar por um órgão de comunicação social mas a jornalista de investigação e especialista em fontes abertas Katherine Denkinson disse à Times Radio que a conta aparentava ter origem russa.
??1/ Thread on the #Southport anti-migrant and anti-Muslim disinformation and propaganda. In this thread I highlight key spreaders of disinformation, the chronology, and some points about some of the inauthentic activity evident. I will focus on X. pic.twitter.com/FepWxb402p
— Marc Owen Jones (@marcowenjones) July 30, 2024
Os manifestantes começaram a atirar objectos na direcção de uma mesquita da cidade por volta das 19h45. À medida que os protestos se intensificaram e começaram a ferir polícias, mais agentes tiveram de ser chamados ao local. O vice-comissário da Polícia de Merseyside, Alex Goss, disse que “é doentio ver isto acontecer numa comunidade que foi devastada pela trágica perda de três jovens vidas”.
O primeiro-ministro inglês, Keir Starmer, reagiu na rede social X, relembrando o sofrimento da comunidade de Southport: "Aqueles que se apropriaram da vigília pelas vítimas com violência e agressividade insultaram a comunidade enquanto faz o luto", escreveu.
Sobre a desinformação que tem circulado nas redes sociais, Alex Goss afirmou que “tem havido muita especulação” e “alguns indivíduos estão a usar isso para trazer violência e desordem para as nossas ruas”. Muitos manifestantes eram homens de rosto tapado que gritavam frases como “não se rendam”, “inglês até morrer” e “queremos o nosso país de volta”.
A polícia lançou gás lacrimogéneo para a multidão depois de uma carrinha das autoridades ter sido incendiada. Os manifestantes tentaram virar outra carrinha da polícia de choque e atiraram vasos e caixotes de lixo vazios contra as forças de segurança e contra a mesquita em Southport.