Trump diz que “devia estar morto” e agora quer “unir” o país e o mundo

Nas primeiras entrevistas depois de ter sido alvo de um atentado, ex-Presidente dos EUA antecipa discurso “totalmente diferente” na convenção do Partido Republicano e assume “fotografia icónica”.

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Apoiante de Trump em Milwaukee (Wisconsin), onde se realiza esta semana a convenção do Partido Republicano Cheney Orr / REUTERS
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“Não era suposto estar aqui, devia estar morto”, disse Donald Trump ao jornal New York Post, numa de duas entrevistas que deu no domingo à noite, as primeiras depois de ter sido alvo de um atentado no sábado, durante um comício do Partido Republicano em Butler, no estado norte-americano da Pensilvânia.

A bordo do seu avião, a caminho de Milwaukee (Wisconsin), onde arranca esta segunda-feira a convenção republicana, e com uma ligadura sobre a orelha direita, o ex-Presidente dos Estados Unidos falou sobre a tentativa de assassínio, descreveu o episódio e antecipou o discurso que vai proferir no evento partidário onde verá confirmada a sua candidatura ao cargo que ocupou entre 2017 e 2021.

“O médico do hospital disse que nunca tinha visto nada assim, disse que foi um milagre”, contou Trump. “Foi uma experiência muito surreal”, acrescentou, dizendo ainda que “queria ter continuado a falar” aos seus apoiantes mesmo depois de ter sido atingido por Thomas Matthew Crooks, o jovem de 20 anos armado de uma espingarda semiautomática AR-15 que disparou contra o ex-Presidente antes de ter sido morto pelos serviços secretos.

Questionado sobre a fotografia poderosa captada por Evan Vucci, fotógrafo da Associated Press, pouco depois dos disparos, em que se vê Trump de punho erguido, com sangue no rosto, parecendo segurar o fio da bandeira dos EUA, o ex-Presidente assumiu que a imagem é “icónica”.

“Muitas pessoas dizem que é a fotografia mais icónica que alguma vez viram. Têm razão e eu não morri. Normalmente, é preciso morrer para se ter uma fotografia icónica”, disse Trump.

“É difícil descrever como foi, mas eu sabia que o mundo estava a olhar. Sabia que a História iria julgar aquele momento e sabia que tinha de lhes mostrar [aos seus apoiantes] que estávamos bem”, explicou o ex-chefe de Estado, numa outra entrevista, com a revista Washington Examiner, referindo-se ao momento em que gritava “lutem, lutem, lutem” enquanto era retirado do palco pelos agentes dos serviços de segurança.

Ao seu estilo, o político republicano afirmou que o discurso que tinha preparado para a convenção do partido “ia ser um espectáculo” e o “mais incrível dos discursos”, porque ia criticar a “desastrosa Administração Biden”. Agora, porém, diz que vai fazer um discurso “totalmente diferente”, uma vez que lhe foi dada “uma oportunidade para unir o país”.

“É uma oportunidade para unir o país inteiro e até o mundo inteiro”, defende. “Mas não sei se será possível. As pessoas estão muito divididas.”

O atentado contra Donald Trump no sábado lança a campanha para a eleição presidencial norte-americana, agendada para Novembro, para uma fase nova e sem precedentes, com algum favoritismo para o ex-Presidente.

Apesar de ser um os principais promotores do discurso agressivo e da retórica violenta contra os seus adversários políticos, Trump sai deste episódio com uma imagem de força, que contrasta com a fragilidade aparente do actual detentor do cargo, Joe Biden, que passou as últimas semanas a recuperar de um debate desastroso contra Trump e a tentar provar que tem condições físicas e mentais para exercer as suas funções; e, sobretudo, para vencer a votação presidencial.

Numa declaração no domingo, a partir da Sala Oval da Casa Branca, Biden condenou o atentado contra o seu opositor político e disse que chegou a altura de “baixar a temperatura política” nos EUA.

“Apesar de discordarmos, não somos inimigos. Somos vizinhos, amigos, colegas, cidadãos e, mais importante que tudo, somos compatriotas americanos”, disse o Presidente sobre Trump. “Não pode haver violência nas ruas. Não é assim que se faz democracia.”

É, ainda assim, difícil, argumentar que Trump tem a vitória assegurada. A sua base de apoio já estava mobilizada mesmo antes da tentativa de assassínio, e a campanha democrata ainda tem quatro meses para preparar uma votação que se joga, essencialmente, em estados como a Pensilvânia, o Michigan ou o Wisconsin.

Em declarações ao PÚBLICO, Ross Burkhart, professor de Ciência Política na Universidade de Boise no Idaho, diz que é “demasiado cedo para especular sobre as consequências políticas da tentativa de assassínio” contra Trump.

“É provável que [o atentado] dê ainda mais força aos seus apoiantes, que já falam dele de forma deificada, e é certamente provável que os religiosos sugiram que foi salvo pelos anjos proverbiais. [Mas] é mais difícil imaginar que isto possa trazer mais apoio a Trump, uma vez que os seus apoiantes já o apoiam em força e, aparentemente, restam muito poucas pessoas passíveis de persuasão no eleitorado americano nesta fase da campanha”, considera.

“As suas posições de extrema-direita são bem conhecidas e não vão mudar. E a quinzena muito atribulada de Biden após o primeiro debate presidencial viu-o regressar a um comportamento mais vigoroso, energizando os seus apoiantes. Creio que a dinâmica de uma eleição presidencial muito disputada se mantém”, conclui.

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