João da Silva visitou 18 bibliotecas, leu 18 autores e partilha-o durante 18 dias
O cronista lançou-se em mais uma aventura que partilha com os leitores do PÚBLICO: uma crónica por dia.
Não é a primeira vez que João da Silva, jornalista freelance e cronista do PÚBLICO, se lança em aventuras que o levam a percorrer o país. Há dois anos, fez uma caminhada em que ligou o Instituto Português de Oncologia de Lisboa aos de Coimbra e do Porto. Foram 300 quilómetros. O ano passado, juntou-se à Associação Vidas Reais Causas Reais para uma campanha de sensibilização sobre a doença com que já viveu, o cancro do testículo. Agora, o desafio foi fazer uma road trip, com o objectivo de escrever crónicas sobre bibliotecas de cada um dos 18 distritos de Portugal continental. "Esta é a minha forma de agradecer o que os livros fizeram por mim e de homenagear as bibliotecas em geral e as pessoas que lá trabalham", declara ao PÚBLICO. Os textos começam a ser publicados, a um ritmo diário, nesta segunda-feira.
"Sou fascinado por livros e acredito que eles podem fazer a diferença na vida das pessoas. Os livros têm sido amigos muito presentes ao longo da minha vida: deram-me colo, foram bússola nos períodos mais difíceis e fizeram parte dos momentos de maior felicidade e celebração", começa por contar, lembrando como as bibliotecas são "lugares de conhecimento e fantasia que nos convidam a viajar pelo desconhecido, mas que também nos podem mostrar novos rumos".
João da Silva recorda que foi nas bibliotecas que se refugiou "à procura de paz e de caminhos" e, por isso, a ideia de as homenagear. Assim, durante 13 dias, percorreu o país e visitou 18 bibliotecas. Mas antes de se por a caminho, contactou os bibliotecários, a quem apresentou a ideia e combinou a data de visita. A cada um pediu que escolhessem um livro de um autor local. "No fim da viagem, tinha 18 livros para ler e incluir nas crónicas, além de mais uns 70 que me foram oferecidos", relata.
Nos seus contactos, recebeu dois "nãos" por parte dos pelouros camarários que coordenam as actividades das bibliotecas, mas por parte dos bibliotecários houve uma "enorme abertura e entusiasmo, bem como um espanto generalizado pelo facto de alguém se ter lembrado de fazer um périplo pelo país, visitando bibliotecas e conversando com as pessoas que aí trabalham", continua. "Ouvi a expressão 'que ideia maravilhosa' de mais de uma dezena de bibliotecários que contactei", testemunha.
Aonde chegou foi sempre bem recebido, "quase com honras de Estado, passe o exagero", brinca, sublinhando o "imenso carinho" com que foi acolhido e, por isso, seria "injusto" dizer qual a biblioteca que mais o marcou. "Tudo isto é, em primeiro lugar sobre pessoas", explica. Contudo, destaca as bibliotecas públicas de Évora e de Braga, onde "há livros e documentos antiquíssimos, dos séculos XIV e XV, bem como a Biblioteca Municipal de Torre de Moncorvo, onde me foi mostrado um foral do século XIII. Sou um apaixonado por coisas antigas, pela preservação do que é antigo e um atento observador da passagem do tempo, pelo que ver de perto essas obras e folhear algumas foi uma experiência inesquecível", emociona-se.
Mais do que espaços onde os livros são depositados, João da Silva testemunha que as bibliotecas são dinâmicas, têm actividades para várias faixas etárias, bem como espectáculos, conferências, workshops, sem esquecer os clubes de leitura. "Neste périplo, constatei que conhecimento, cultura e diversão se entrelaçam, reflectindo uma adaptação exemplar às necessidades e expectativas das comunidades. E tudo isto é gratuito, tornando as bibliotecas um recurso acessível e inclusivo para todos."
O que falta, para que sejam mais visitadas? "Sinto que em alguns casos é imperativo apostar numa estratégia de comunicação mais eficaz para divulgar e promover as diversas iniciativas das bibliotecas, nomeadamente nas redes sociais e através de parcerias com escolas e outras instituições para aumentar a visibilidade do que oferecem", responde João da Silva, que lamenta haver uma "grande disparidade" nas políticas autárquicas. "Há bibliotecas com orçamentos generosos e outras com recursos muito limitados. Sem livros actualizados e diversificados, é difícil atrair e fidelizar leitores. Notei ainda a falta de investimentos em infra-estruturas e tecnologia em algumas bibliotecas. Os computadores, por exemplo, são ferramentas fundamentais para complementar os recursos tradicionais e atrair um público mais vasto", nota.
O principal objectivo deste périplo e das crónicas que serão publicadas a um ritmo diário, a partir desta segunda-feira, é "despertar a curiosidade sobre o que as bibliotecas oferecem às comunidades em termos de conhecimento, cultura e entretenimento, assim como realçar a dedicação e o amor dos bibliotecários pelos livros, e o seu compromisso em partilhar conhecimento", diz.
Nestas, fará também menção aos autores locais, nomes menos conhecidos em termos nacionais mas que têm muito valor. "Devo dizer que li livros extraordinários de autores que nunca tinha ouvido falar e, graças a isso, aprendi muito sobre as especificidades de alguns dos distritos que visitei". O entusiasmo é tal, que João da Silva está já a preparar uma segunda edição desta road trip. "Há muito por descobrir e partilhar", conclui.