MNE visita túmulos de soldados portugueses mortos em Angola e destaca “reconciliação”

Recuperação de cemitérios em Luanda é feita ao abrigo do programa angolano “Conservação das Memórias” e inclui as campas de 450 combatentes portugueses.

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Paulo Rangel, ministro dos Negócios Estrangeiros Nuno Ferreira Santos
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O ministro dos Negócios Estrangeiros visitou neste sábado os talhões militares portugueses no cemitério da Santa Ana, em Luanda, sublinhando o "verdadeiro espírito de reconciliação" de Angola que permitiu homenagear os soldados ali sepultados.

Paulo Rangel, que termina assim uma visita de dois dias a Angola, destacou a "infinita gratidão" de Portugal ao povo angolano e suas autoridades por permitirem e apoiarem o esforços de reabilitação dos talhões do cemitério de Santa Ana onde repousam os restos mortais de mais de 450 soldados portugueses. "Isto mostra o que é o verdadeiro espírito de reconciliação, que é homenagear estes soldados que morreram ao serviço do seu país, independentemente de estarem numa guerra que era injusta como depois se veio a reconhecer. Mas, obviamente, estes soldados cumpriram o seu dever moral e deram a vida pelo seu país", frisou.

Sobre as autoridades angolanas, destacou a vontade e generosidade de se reconciliar com a história, permitindo homenagear e dar um tratamento digno aos portugueses que estão sepultados neste cemitério de Luanda. Salientando que este é "um acto de enorme dignidade" e "um exemplo para o mundo", Paulo Rangel sublinhou que Angola é tida na comunidade internacional como um país "grande promotor da paz".

"Enquanto português, e para todos os portugueses, este é um gesto que Angola tem para connosco que assinala os 50 anos do 25 de Abril e os 50 anos de independência de Angola. É neste ciclo que esta obra vai ser realizada e concluída. É um momento muito sensível e comovente para todos nós, em particular para os militares das Forças Armadas dos dois países", disse o chefe da diplomacia portuguesa.

Paulo Rangel considerou ainda que na comemoração deste cinquentenário Portugal tem dado "um sinal de reconciliação", não só em relação a Angola, mas também a outros países que foram colónias e com os quais mantém actualmente uma relação bilateral "de igual para igual".

Lembrou também que o 25 de Abril não foi causa, mas também consequência das independências: "Havia uma luta pela independência que também foi motor do 25 de Abril. A democracia e a liberdade em Portugal também se conseguiram porque houve povos em África que estavam a lutar pela sua liberdade."

"Acho que nestes 50 anos temos obrigação de homenagear todos aqueles que contribuíram para que hoje possamos estar aqui com relações excelentes e de respeito mútuo", disse o ministro, que terminou a visita evocando a pátria portuguesa e angolana com o poema de Fernando Pessoa O menino de sua mãe.

O embaixador de Portugal em Angola, Francisco Alegre Duarte, disse que o actual espaço cemiterial "pouco tem a ver com o que encontrou em Abril de 2022", salientando que esta é uma homenagem a todos os que tombaram e foram "irmãos de armas" - os que lutaram por Portugal e os que lutaram por Angola.

Ludgerio Pelinganga, presidente da Federação de Antigos Combatente e Veteranos da Pátria de Angola, parceira da Liga de Combatentes de Angola, que tem acompanhado os trabalhos de requalificação também considerou importante esta homenagem aos combatentes. "Ajuda a apaziguar os espíritos e melhorar a relação de paz e consciência do próprio combatente", disse.

A recuperação dos espaços dos cemitérios de Santa Ana e do Alto das Cruzes, em Luanda, onde se encontram inumados militares portugueses, insere-se no Programa Estratégico Estruturante "Conservação das Memórias" da Liga dos Combatentes (LC), designado como "Operação Embondeiro", iniciado em 2019.

Os trabalhos decorrem no cemitério do Alto das Cruzes, onde estão inumados 123 militares que caíram durante a Grande Guerra, e no cemitério de Santa Ana, com 434 sepulturas de militares que caíram durante a Guerra do Ultramar. Consistem na recuperação das sepulturas que ficarão nos espaços finais dos talhões militares, pavimentação dos espaços entre sepulturas, recuperação dos monumentos e ossários existentes e na exumação de sete sepulturas, no cemitério do Alto das Cruzes, e de 398 sepulturas, no cemitério de Santa Ana, de que resultará a libertação desses espaços cemiteriais. Os restos mortais das sepulturas exumadas serão depositados nos ossários, entretanto recuperados nos trabalhos em curso.

As obras foram entregues, através de concurso, à empresa Teixeira Duarte e estão orçadas em 500 mil euros. Numa etapa posterior está prevista a exumação de mais algumas sepulturas em vários locais espalhados pelo território angolano e respectiva transladação para os ossários em Luanda ou para ossários a construir em alguns cemitérios onde exista maior concentração de sepulturas.

Em Angola, segundo dados oficiais, estão referenciados restos mortais de 1.548 combatentes que caíram ao serviço das Forças Armadas Portuguesas, distribuídos por 187 locais. Durante a guerra colonial foram mobilizados para os teatros de operações em Angola, Moçambique e Guiné 800.000 militares, 30% dos quais oriundos do recrutamento local. Do total de baixas estão apurados cerca de 9.000 mortos e 15.000 feridos ou incapacitados.