Portugueses preocupados com desinformação. Notícias produzidas por IA geram desconforto
Relatório Digital News Report Portugal 2024, produzido pelo Obercom, mostra que a televisão ainda é a principal fonte de informação e que Portugal desceu no ranking de confiança em notícias.
Mais de 70% dos portugueses estão preocupados em distinguir conteúdo verdadeiro e falso na Internet, indica o relatório Digital News Report Portugal 2024, produzido pelo Obercom (Observatório da Comunicação). Este valor mostra que Portugal é um dos países mais preocupados com o problema da desinformação online, dos mais de 40 onde foram realizados relatórios nacionais, a par do relatório global do Reuters Institute for the Study of Journalism (RISJ), da Universidade de Oxford. Para referência, a média global dos vários países analisados é de 59%.
Dos portugueses que afirmam confiar em notícias online, 81% assumem-se preocupados em distinguir o que é falso do que é verdadeiro na Internet. Entre os restantes, o número é menor (69%). Pessoas mais velhas, com maior escolaridade, maior rendimento do agregado familiar e orientação política declarada também se preocupam mais com a desinformação online.
Os temas sobre os quais os inquiridos portugueses mais encontram desinformação são a política (28%), temas relacionados com economia e custo de vida (19%), guerras — quer na Palestina (18%), quer na Ucrânia (17%) — e imigração (17%). Por outro lado, os inquiridos portugueses relatam encontrar pouco conteúdo falso relacionado com ambiente ou alterações climáticas e temas de saúde, entre os quais, a covid-19.
Em termos de plataformas digitais onde é “fácil ou muito fácil” reconhecer informação fidedigna, 63% destacam o motor de busca da Google. Seguem-se o WhatsApp (54%), YouTube (53%), Facebook (52%), Instagram (50%) e X (37%).
O relatório de 2024 também mostra que, pela primeira vez em nove anos, o Facebook não é a rede social mais utilizada em Portugal. Foi ultrapassada pelo WhatsApp. Ainda assim, continua a ser a mais utilizada pelos portugueses para consumir notícias (35%). O WhatsApp figura em segundo (23%) e o YouTube e Instagram ocupam o terceiro lugar (21%).
No TikTok, 55% dos utilizadores recorrem aos pares como fontes de notícias. No X, por outro lado, é nas contas de políticos, marcas de notícias ou "jornalistas alternativos" que tal acontece. Em geral, a utilização das redes sociais, quer para procura de notícias, quer para uso casual, diminuiu ligeiramente em comparação com o ano anterior.
Portugueses pouco confortáveis com notícias feitas por IA
Os resultados do estudo mostram que os portugueses estão algo cépticos em relação à utilização da inteligência artificial na produção de notícias. Dos inquiridos, apenas 18% afirmaram estar confortáveis ou muito confortáveis com a possibilidade de haver “notícias produzidas por IA com alguma supervisão humana”. Já 43% mostraram-se desconfortáveis ou muito desconfortáveis.
A produção de notícias por jornalistas humanos com apoio de IA é vista um pouco melhor: 36% dos inquiridos afirmam-se confortáveis ou muito confortáveis com esta forma de produção noticiosa; 24% ficam desconfortáveis ou muito desconfortáveis.
Os temas sobre os quais os inquiridos mostram menos reservas em relação às notícias produzidas com IA, com supervisão humana, são os relacionados com ciência e tecnologia (27%), arte e cultura (26%) e desporto (25%). O maior desconforto verifica-se em temas de política e crime.
Portugal desce no ranking de confiança em notícias
Em 2024, Portugal caiu para a sexta posição no ranking de confiança em notícias, depois de nove anos a ocupar a 2.ª ou a 3.ª posições. Fica agora atrás da Finlândia, Quénia, Nigéria, África do Sul e Dinamarca.
Actualmente, 56% dos portugueses inquiridos dizem confiar em notícias em geral e 58% confiam naquelas que consomem. Em 2015, porém, ambos os números eram superiores: 66% no primeiro caso e 71% no segundo.
A descida de Portugal no ranking não se deve, no entanto, apenas à queda de dois pontos percentuais na confiança registados entre 2023 e 2024. A confiança em notícias nos mercados quenianos e nigerianos também aumentou.
Cidadãos mais jovens, com menos escolaridade e menores rendimentos confiam menos em notícias em geral. Em termos de orientação política, os cidadãos que se dizem de esquerda apresentam maiores níveis de confiança (63%), seguidos dos de centro (61%) e os de direita (52%). Mas é nos inquiridos sem orientação política declarada que os valores são os mais baixos (43%).
A característica apontada pelos portugueses (78%) como mais importante para a confiança nas notícias é a transparência.
Em relação ao ano passado, também aumentou a taxa de portugueses que afirmam estar saturados com notícias. São agora 51%, o que representa uma subida de nove pontos percentuais.
Face a 2023, os inquiridos também evitam mais notícias de forma activa. Aqueles que admitem fazê-lo “frequentemente ou algumas vezes” são 37% (mais dois pontos percentuais do que em 2023). O estudo assegura, porém, que “não está estabelecida, pelo menos para já, uma relação de causalidade entre o evitar activo de notícias e o desinteresse por notícias”.
“O evitar activo de notícias poderá estar relacionado com dinâmicas de satisfação, ou seja, é um mecanismo activado quando as pessoas se sentem suficientemente informadas e limitam, consequentemente, o seu consumo de notícias em função dessa satisfação”, lê-se no documento.
Entre géneros, as mulheres mostram estar mais saturadas (58%) do que os homens (43%) e também evitam mais notícias. Em termos de idade, os mais novos estão menos saturados com notícias do que os mais velhos.
Televisão continua a principal fonte de notícias
Como se verificava em anos anteriores, continua a ser a televisão o meio de comunicação mais utilizado para aceder a notícias: 53% dos inquiridos apontam-na como a principal fonte de notícias. As redes sociais são-no para 16% dos portugueses, enquanto a imprensa e a rádio só para 4% e 7%, respectivamente.
Em conjunto, a televisão e a Internet são as principais fontes de notícias para cerca de 90% dos inquiridos. No entanto, a tendência para consumir notícias através da televisão vai aumentando com a idade. Quando falamos em Internet, a tendência é inversa.
Apenas 16% dos acessos a notícias online pelos portugueses são feitos directamente através dos sites das marcas de notícias (onde se incluem os jornais, por exemplo). Dos restantes, a maior fatia é a dos acessos através dos motores de busca (30%), seguidos pelas redes sociais (20%). O acesso consequente de notificações móveis aumentou ligeiramente em relação a 2023 (dois pontos percentuais, para 17%).
O relatório revela também que um terço dos portugueses “consome vídeos curtos sobre notícias pelo menos quatro a seis vezes/dias por semana”. Quando se fala em vídeos mais longos ou emissões em directo, o consumo é menor. A faixa etária dos 18 aos 24 anos (a mais jovem), em geral, é a que consome mais vídeos, principalmente os mais curtos (88%).
O consumo de podcasts aumentou em todas as faixas etárias entre 2023 e 2024, mas com um incremento ligeiramente superior nas faixas etárias acima dos 45 anos.
Apesar da residual subida de um ponto percentual em comparação com 2023, Portugal continua a ser um dos países que menos pagam por notícias em formato digital. A média dos países onde foram realizados Digital News Reports é de 17%, mas em Portugal apenas 12% dos inquiridos referem ter pago por notícias online no ano anterior.