Há mais turbulência nos voos, mas se usar cinto não se preocupe: “Os aviões aguentam”

Alterações climáticas contribuem para aumento do fenómeno, aponta estudo da Universidade de Reading. Comandantes recomendam manter cinto apertado todo o voo, dizendo que não há razão para alarme.

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Avião levanta voo MARK R. CRISTINO / EPA
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Um homem morreu e 54 pessoas ficaram feridas após um voo da Singapore Airlines ter enfrentado turbulência severa, esta terça-feira. O avião caiu abruptamente cerca de 1800 metros, provocando o pânico entre os passageiros. Apesar de consequências como estas serem muito raras mesmo nos casos de turbulência intensa, os dados recolhidos mostram que há cada vez mais turbulência durante os voos comerciais – e que isso pode estar intimamente ligado com as alterações climáticas.

Um estudo da Universidade de Reading (Grão-Bretanha) publicado em Junho de 2023 estima que a duração da turbulência severa na rota do Atlântico Norte – uma das mais usadas no mundo – tenha aumentado 55% entre 1979 e 2020. Também se registaram aumentos nas vertentes da turbulência moderada (37%) e da ligeira (17%).

Os investigadores britânicos dizem que o aumento da temperatura ligado às mudanças climáticas contribuirá para um agravamento deste fenómeno. Mas se entrar no avião já o deixa desconfortável, não precisa de redobrar as preocupações com este caso. Os especialistas em aviação ouvidos pelo PÚBLICO elogiam a integridade estrutural das aeronaves, adiantando que o melhor que pode fazer é zelar pela sua segurança e apertar o cinto.

“A turbulência é o principal factor mencionado por quem tem medo de voar, mas não deita um avião abaixo. Não há razão para preocupação, mas, pela vossa saudinha, apertem os cintos. Os pilotos estão sempre com o cinto apertado: por alguma razão é. Precisam de ir à casa de banho ou esticar um bocadinho as pernas, tudo bem. Mas, quando voltarem para o lugar, coloquem o cinto”, apela José Correia Guedes, ex-comandante da TAP e especialista em aviação. No voo da Singapore Airlines, muitos dos passageiros feridos não tinham cinto de segurança, sendo projectados pelas oscilações da aeronave. A vítima mortal neste incidente, um homem de 73 anos, morreu na sequência de complicações cardíacas.

Na longa carreira enquanto comandante da companhia aérea portuguesa, José Correia Guedes admite nunca ter enfrentado turbulência tão forte como a vivida a bordo do voo da Singapore Airlines, mas viveu períodos de turbulência que se arrastaram durante horas: “É importante sublinhar isto: os aviões estão preparados para isto e muito mais. Tive voos com quatro, cinco horas de turbulência permanente. Não se pode ir à casa de banho, dar refeições. Mas a integridade estrutural da aeronave não é posta em causa.”

Algo que também auxilia a segurança é o avanço tecnológico dos radares disponíveis actualmente, instrumentos que permitem cartografar e perceber antecipadamente as condições expectáveis do trajecto. Para o comandante Gonçalo Areia, presidente da Associação de Operadores e Pilotos de Aeronaves (AOPA), este é outro dos factores que permitem conferir uma sensação de maior segurança aos passageiros.

“Há mais capacidade de prever estes fenómenos – e de os prevenir, na óptica de os evitar durante o voo. Na década de 1970, a base era o piloto que ia à frente e comunicava aos restantes que vinham atrás. Todos nós, nas nossas vidas, assistimos à evolução de ver a previsão meteorológica na RTP com uma nuvenzinha desenhada no mapa até aos radares que temos agora nos telemóveis”, explica o responsável.

Também Gonçalo Areia elogia a integridade estrutural do avião, desenhado para suportar forças gigantescas, relembrando que um avião comercial está em circulação diariamente durante anos, sendo também monitorizado de perto pelas equipas de manutenção. “Costumo dizer, na brincadeira, que só me começo a preocupar com a integridade estrutural do avião quando vir toda a gente na cabina a voar, as bagageiras abertas, pessoas desmaiadas com as forças G. A partir daí talvez me comece a preocupar, mas, até esse ponto, o avião aguenta tudo”, ironiza.

Se a segurança não está em causa, que inconvenientes podem trazer estes episódios de turbulência aos passageiros? Fazendo novamente uso da experiência enquanto piloto, José Correia Guedes diz que este é um dos motivos que contribuem para atrasos durante o voo, explicando a táctica usada pela tripulação para mitigar os efeitos.

“Uma das coisas que fazemos quando apanhamos turbulência moderada é reduzir a velocidade do avião, para que o impacto não seja tão grande. É como um automóvel numa estrada cheia de buracos, se formos mais depressa, não amortece tanto. Acredito que o avião afectado tenha feito uma inspecção adicional para ver se não apareceu nada de preocupante a nível estrutural. A turbulência prejudica o negócio, mas não há forma de a evitar”, finaliza o ex-comandante da TAP.

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