Ana Jorge repudia as acusações da ministra do Trabalho: “É preciso justificar o benefício próprio”

Provedora da Santa Casa quer que a ministra explique as acusações sobre alegados benefícios próprios nos aumentos salariais dos dirigentes. Ana Jorge repete tese de saneamento político.

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Ana Jorge deixou escapar que a ministra não pareceu muito preocupada com os aumentos Daniel Rocha
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Primeiro na Rádio Renascença e depois na rádio Observador, em directo, Ana Jorge repudiou as declarações anteriores da ministra Rosário Ramalho e pediu justificações sobre a acusação de benefício próprio feitas pela governante na RTP na noite anterior.

"Nego profundamente essa declaração e é preciso justificar o benefício próprio”, respondeu a ainda provedora da Santa Casa à Renascença, queixando-se de que, em tão pouco tempo em funções, dificilmente a ministra terá “a informação toda sobre a actividade” da instituição.

Em entrevista à RTP, na terça-feira, a ministra do Trabalho, Maria do Rosário Ramalho, afirmou que a maioria dos trabalhadores na Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML) ganha o salário mínimo e que os vencimentos dos dirigentes são muito mais altos. “Os da mesa [da SCML] até foram aumentados, estranhámos. (…) Beneficiaram-se a si próprios”, criticou a governante.

Ana Jorge, por sua vez, já nesta quarta-feira disse que não se podia rever nas declarações da ministra e considerou que estava "a ser maltratada". "O aumento nos trabalhadores foi feito por acordo de empresa celebrado com as duas centrais sindicais e com o mínimo de repercussão financeira para a Santa Casa”, esclareceu já na rádio Observador, usando um exemplo citado por Rosário Ramalho na entrevista à RTP.

Ana Jorge já tem relatório de contas

Além disso, Ana Jorge deixou escapar que a ministra não pareceu muito preocupada com os aumentos. “Disse-me que eu não devia ter feito o acordo de empresa, mas também não havia problema porque ele podia acabar.” E esclareceu que a governante já tem em sua posse o Relatório de Contas de 2023, e só não o teve no dia em que queria porque a Santa Casa tinha “autorização do Tribunal de Contas” para o entregar “até dia 30”.

Na entrevista, Maria do Rosário Ramalho afirmou ter “uma fundamentação muito sólida” para a decisão de exonerar a provedora da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, assim como a restante administração da instituição, negando que esteja a conduzir um "saneamento político".

“Se fosse um saneamento político, eu já teria quatro ou cinco pessoas para pôr lá”, acrescentou a governante, que adiantou que o Governo procura “um perfil financeiro” para o sucessor, não dando como certo que possa ser encontrado dentro de um dos partidos da coligação, mas não o descartando: “Há financeiros muito bons em todos os partidos."

Feita a mesma pergunta à provedora, a resposta foi: “Gostaria que não fosse considerado isso, mas é o que parece.”

Santa Casa "não está em ruptura financeira"

A ministra justificou a demissão de Ana Jorge “por razões de gestão”, acusando-a de “total inacção” face à situação de crise financeira que herdou da anterior administração, reiterando o que o Governo já havia alertado para a inexistência de um plano de reestruturação.

“A conversa que tivemos não evidenciou nenhum sentido de urgência face à situação que existia”, disse Maria do Rosário Ramalho, insistindo que “não havia nada” e que desde a tomada de posse Ana Jorge “não fez nada” para melhorar inverter a situação financeira.

A governante afirmou: “Não nos passava pela cabeça [do Governo], que não tivesse um plano de reestruturação financeira” ou que “tivesse aumentado despesas com pessoal”, referindo que apenas foram cortadas despesas com 19 dirigentes, que perderam esses cargos e os suplementos a eles associados, mas se mantiveram na instituição.

Sobre esses supostos “graves problemas financeiros e operacionais” da SCML e a “ruptura de tesouraria", a provedora sublinhou que a Santa Casa “não está em ruptura financeira” e não “há justificação para fazer despedimento de pessoas que fazem falta para a intervenção social”.

Ana Jorge também falou sobre a reestruturação em curso e a redução de chefias que já ocorreu, frisando que afectou 40 pessoas e “não 19”, como disse a ministra, e “teve impacto financeiro imediato”, como irá explicar no Parlamento.

Governo não avança com acção criminal

Sobre as acusações de “calúnia e má-fé” feitas por Ana Jorge sobre as justificações para a exoneração da mesa da SCML, Maria do Rosário Ramalho disse que acha isso “muito estranho”, referindo uma sucessão de acontecimentos até ao momento da demissão, como a inexistência de um relatório sobre medidas a tomar ou de resposta a um conjunto de “perguntas muito básicas” colocadas pela tutela e às quais Ana Jorge nunca terá respondido.

Apontando “falhas de comunicação”, a ministra disse ter perdido a confiança na provedora exonerada, “absolutamente”, pelo que tomou a decisão de exoneração “nos fundamentos da lei”.

Rejeitou, no entanto, que esteja prevista qualquer acção criminal contra a acção de Ana Jorge à frente da SCML, frisando que o que a preocupa “é a gestão” e que a decisão tomada assenta nos dados recolhidos pelo Governo, que a ministra não quis detalhar antes de os dar a conhecer aos deputados, na audição parlamentar.