Com as flores de Nathan Kunigami, a natureza é a nova hóspede do Tivoli

A técnica floral do artista brasileiro assenta na tradicional Ikebana, com raízes japonesas. Até 30 de Setembro, A Mata não pede passagem está patente no hotel da Avenida da Liberdade, em Lisboa.

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Nathan Kunigami vive em Lisboa desde 2019 DR
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As montagens no Tivoli decorreram durante três dias DR
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Cansado da vida corporativa, Nathan Kunigami encontrou nas flores um sonho e, em Lisboa, a nova casa. A Mata não pede passagem é a primeira exposição individual do artista floral brasileiro e reflecte sobre o poder da natureza e da ligação ao sagrado com duas imponentes peças em flores naturais. Está patente no lobby do hotel Tivoli Avenida da Liberdade até 30 de Setembro.

“Já há algum tempo que queria fazer peças em grande escala”, começa por explicar Nathan Kunigami ao PÚBLICO apontando para a escultura Divina, a dar cor à entrada de um dos hotéis com mais história da cidade. “São as maiores peças que já fiz”, conta, detalhando que baptizou a criação com o nome da avó, “que sempre gostou muito de flores” e faz “100 anos neste ano”.

A escultura está assente numa base de metal, “uma coisa quase cirúrgica”, que contrasta com a delicadeza das orquídeas, que nascem entre a base de amarantos, as flores preservadas que formam o corpo das peças. “Vamos fazer a manutenção das orquídeas ao longo da exposição. Os amarantos estão preservados e não morrem”, explica.

O nome para a exposição surgiu das raízes indígenas de Nathan Kunigami. “No Brasil, existe uma crença de que devemos pedir licença antes de entrar no mar ou na floresta. Eu inverti um pouco a lógica: é a mata que não pede passagem. Na cidade, costumamos ver a natureza a ocupar os espaços livres”, analisa. Como tal, o objectivo é deixar que a natureza ocupe o hotel “de uma forma exuberante”.

É inevitável que, entretanto, o olhar não escape para as enormes peças suspensas mais à frente. Os hóspedes sentados no átrio dividem-se entre os que parecem indiferentes e os que, fascinados, tiram fotografias e fazem perguntas, aproveitando que o artista está presente. O conjunto chama-se Shin (céu), Soe (terra) e Tai (humanidade), numa homenagem à Ikebana, a técnica floral japonesa que serve de base ao trabalho de Nathan Kunigami.

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“O objectivo da Ikebana é encontrar o equilíbrio entre estes três elementos: shin, soe e tai. Foi essa a minha ideia também, encontrar harmonia entre as três peças”, detalha o florista. Novamente, o amaranto é a base para o trabalho, mas Nathan Kunigami joga com as cores para fazer alusão ao conceito da obra. Por exemplo, uma das peças é totalmente em branco para evocar o céu.

Seguindo a linguagem da Ikebana — “minimalismo, atenção ao detalhe, às curvas e ao espaço negativo de um arranjo” —, Nathan não utiliza espuma floral, em prol do ambiente, e construiu as peças a partir de uma estrutura metálica directamente no lobby do hotel ao longo de três dias. Para suspender as peças, foi preciso um andaime e a maior ultrapassa os 120 quilos.

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Uma mudança de vida

O gosto pela Ikebana vem da família brasileira, com raízes japonesas, do lado do pai. “A minha mãe já praticava Ikebana há muito tempo, mas eu era criança e não compreendia bem o conceito”, recorda. Mais tarde, em 2017, durante uma viagem ao Japão, fez uma aula de arranjos florais ao estilo Ikebana, em Tóquio. No ano seguinte, cansado da vida de escritório — trabalhava em comunicação para marcas de luxo —, decidiu despedir-se e arriscar numa mudança de carreira.

Voltou ao Japão para estudar mais e, durante um ano “sabático” em São Francisco, na Califórnia, chegou a trabalhar em dois estúdios locais. “Depois, o meu marido é alemão e queria voltar para a Europa. Fizemos uma lista de tudo o que queríamos ter numa cidade, e Lisboa cumpriu”, relata.

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Decisão feita: mudaram-se para Portugal e, em 2019, nasce o estúdio floral Kokuga, a partir do apelido original da família de Nathan. No espaço na Lapa, atende clientes por marcação e trabalha por sistema de subscrições com lojas, hotéis e alguns eventos. “Não vendo flores, só vendo composições”, esclarece, garantindo que não se importa de ser chamado florista. “Digo sempre que sou um florista. Para mim, um florista é sempre um artista floral.”

A exposição A Mata não pede passagem enquadra-se no projecto Tivoli Art Collection, que, desde 2011, tem levado ao hotel nomes como Ana Pérez-Quiroga, Conceição Abreu, Pedro Calapez ou Rui Calçada Bastos. No ano passado, as tapeçarias com a arte da artista sul-africana Esther Mahlangu encheram o átrio de cor, numa mostra com a curadoria de Alexandra de Cadaval.

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