Relatório aponta para recuo de liberdades e garantias em vários países europeus em 2023

Organização Liberties afirma que em países como Suécia ou Itália (onde há apoio ou liderança da direita radical) existe um processo gradual de erosão do Estado de direito.

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A Itália de Giorgia Meloni é um dos países em que a Liberties considera que houve uma “regressão” na área do “espaço cívico” JUAN MEDINA/Reuters
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O ano de 2023 mostrou uma tendência de enfraquecimento de vários direitos democráticos em vários governos da União Europeia, segundo um relatório da organização Liberties divulgado nesta segunda-feira.

A organização sublinha que, em algumas democracias mais antigas e bem estabelecidas, o desafio ocasional ao Estado de direito é uma preocupação maior pela possibilidade de um partido extremista ganhar poder, “o que poderá tornar estas questões esporádicas num problema sistémico no futuro”. Estes são os casos de França, Alemanha, ou Bélgica, diz a Liberties no relatório que inclui 19 países da União Europeia (Portugal não está incluído).

Noutras democracias também mais antigas, como Itália ou Suécia, em que partidos da direita radical chefiam o Governo ou lhe dão apoio parlamentar, o relatório diz que há “uma erosão do Estado de direito que parece ser um processo gradual”.

Na Suécia (onde há um Governo minoritário com acordo parlamentar da direita radical desde o final de 2022), alguns dos problemas passam por uma abordagem securitária com alterações que deixam poder nas mãos das forças de segurança com pouca supervisão (o exemplo do relatório é de a polícia poder decidir declarar zonas para buscas sem ter de o justificar), ou o enfraquecimento de organizações não-governamentais, em especial das de cariz étnico ou religioso, como as muçulmanas (um exemplo é o fim de apoio governamental, essencial para que estas associações mantenham as suas actividades).

A “segurança nacional e a ameaça de terrorismo ou crime organizado são invocadas de modo rotineiro para justificar políticas policiais cada vez mais repressivas e a expansão de poderes dados às forças de segurança”. Algumas das medidas, como escutas telefónicas e buscas ou revistas, podem ser aplicadas a pessoas que nem sequer são suspeitas, nota o relatório.

O relatório aponta ainda “novas leis e propostas legislativas” na área da justiça que têm potencial para deixar a Suécia em situação de incumprimento quanto às suas obrigações internacionais, como a que permite testemunhos anónimos em tribunal, por exemplo.

UE “não se está a aperceber”

Em Itália, onde há desde o final de 2022 um Governo liderado pelo partido de direita radical Irmãos de Itália, em coligação com o nacionalista Liga, de Matteo Salvini, e a Força Itália, liderada por Silvio Berlusconi até à sua morte em 2023, “tem havido reformas que tendem a tornar o sistema de justiça menos eficiente, promovendo em particular uma abordagem securitária”, lê-se no relatório.

Há ainda “um aumento preocupante no nível de influência política no sector mediático italiano”, com interferência no serviço público e em relação aos media, em que alterações na lei deram prioridade ao direito à reputação de queixosos sobre a liberdade de expressão e a protecção dos jornalistas.

O relatório dá conta de uma “regressão” na área do “espaço cívico” em Itália, apontando a lei de 2023, que “criminaliza as operações de resgate no mar” e “põe em risco o direito à vida e ao asilo de migrantes”.

Além disso, diz o relatório, o Governo de Giorgia Meloni impôs “restrições ao direito à greve” e “tem sido especialmente hostil em relação a manifestantes”.

O direito à manifestação é um dos que são apontados no relatório como tendo sofrido erosão em vários países, incluindo na Suécia, mas também na Bulgária, República Checa, Estónia, Alemanha e Hungria. “As restrições ao direito a protestos pacíficos aumentaram de modo significativo” em 2023, segundo o relatório, “mas em muitos casos são aplicadas selectivamente a protestos pró-Palestina e pelo clima”.

As democracias mais recentes são aquelas em que o Estado de direito pode ir sofrendo mudanças mais rápidas, aponta ainda a organização, mudanças que podem ir “em direcção à recuperação ou ao declínio”. Ainda assim, o caso da Polónia ilustra “o desafio de voltar ao Estado de direito sem quebrar as bases legais que se quer recuperar”.

O director da organização, Balázs Dénes, escreve, numa nota à comunicação social que acompanha o relatório, que a análise mostra a necessidade de uma acção mais forte e decisiva da União Europeia contra retrocessos no Estado de direito.

“A Comissão, a União Europeia, têm ferramentas muito poderosas mas mostram relutância em usá-las de modo rápido e assertivo”, declarou, dando como exemplo de medidas os “procedimentos por incumprimento ou congelamento condicional de fundos europeus”.

A organização está “alarmada pela falta de análise séria sobre o que está realmente a acontecer em alguns sítios”, conclui Dénes, dizendo que a União Europeia “não se está a aperceber de que alguns governos estão a destruir deliberadamente o equilíbrio de poderes”.

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