O muito aguardado segundo capítulo do épico de ficção científica do realizador Denis Villeneuve, Dune - Duna: Parte Dois, chegou aos cinemas recentemente, mas foi projectado secretamente mais de seis semanas antes da sua estreia num local invulgar: um centro de cuidados paliativos, para um cinéfilo cujo último desejo era ver a sequela antes de morrer.
Com as cortinas fechadas numa sala do hospital no Quebeque, o homem, que tinha cerca de 50 anos, e um dos seus amigos viram o filme no ecrã do computador portátil de Villeneuve — que o assistente do realizador levou naquele dia. O sigilo era fundamental, os envolvidos assinaram acordos de confidencialidade e guardaram os telemóveis para evitar fugas de informação.
Fazer chegar o filme ao homem foi uma "corrida contra o relógio", resume Josée Gagnon, cuja instituição de caridade tornou o momento possível. A fundadora da instituição de caridade canadiana L'Avant, que se dedica a ajudar pessoas em fim de vida a realizar os seus sonhos, conta a história em pormenor numa entrevista, nesta segunda-feira, e numa publicação recente no Facebook.
Gagnon explica que só pôde falar livremente depois de o filme ter sido divulgado publicamente, mas recusa-se a revelar a identidade do homem para proteger a sua privacidade. Mas conta que a corrida começou em Janeiro, quando L'Avant lançou um apelo no Facebook a quem pudesse contactar Villeneuve.
"O desejo era levar um pouco de magia a uma pessoa no fim da sua vida", dizia a publicação da instituição de caridade. O tempo era essencial, dizia a publicação, porque a pessoa tinha apenas "mais algumas semanas" de vida. O post não fornecia mais detalhes sobre o pedido, mas pouco depois, a instituição de caridade publicou que a sua mensagem chegara ao destinatário.
Um representante de Villeneuve recusou-se a comentar. Gagnon, no Facebook na sexta-feira, disse que Villeneuve e a mulher, Tanya Lapointe, uma produtora executiva do filme, ficaram "extremamente tocados pelo último desejo deste homem". E continua: "Disseram-me: 'É precisamente por ele que fazemos filmes'."
Por isso, puseram mãos à obra. Inicialmente, Villeneuve e a mulher queriam levar o homem de avião até Montreal ou Los Angeles para que pudesse ver o filme. Mas, era "impossível" porque ele estava "demasiado fraco". E escreve a directora na rede social: "O tempo estava a passar. O doente moribundo estava a morrer."
Depois, um avanço: A 16 de Janeiro, o assistente de Villeneuve voou para o Quebeque com o portátil do realizador e levou-o para o centro de cuidados paliativos.
O homem não falava inglês e teve de ver o filme com legendas em francês, conta Gagnon ao The Washington Post. Ele "estava tão fraco que pensámos que poderia morrer enquanto via o filme", escreveu no Facebook.
O homem acabou por não conseguir ver as duas horas e 46 minutos completas do filme. Estava com dores e viu apenas cerca de metade antes de ter de parar, continua ao The Post. Morreu alguns dias depois.
Gagnon disse ao programa Place publique, da Radio-Canada que alguns dos envolvidos no projecto sentiram que a visualização do filme foi um "fracasso" porque o doente não chegou a ver o final do filme.
Mas Gagnon tem uma opinião diferente. "Eu disse: 'Não estão a perceber, é extraordinário aquilo por que este homem passou. O final de um filme, quando se vai morrer, não quer dizer nada... Tudo isto existiu para ele'".
Perder o final "não importava", continua. O homem teve um "começo de vida muito difícil" e viu as pessoas à sua volta — e as que não o conheciam — trabalharem para realizar o seu último desejo. E isso, escreveu ela, "valeu todo o ouro do mundo".
Agora, ela tem apenas uma mensagem: "As pessoas têm de continuar a acreditar que tudo é possível quando é feito com coração." Gagnon confessa ao The Washington Post que ainda não viu o filme, mas tenciona vê-lo em breve. "Vou sorrir como uma idiota o tempo todo, pensando nesta linda história. A pensar nele", termina.
Exclusivo PÚBLICO/The Washington Post
Tradução: Bárbara Wong