Harry mentiu nas suas memórias? Defesa sobre visto norte-americano sugere que sim

As confissões do príncipe no seu livro de memórias sobre o consumo de drogas chegaram a tribunal e ameaçam a sua permanência nos EUA.

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Harry "traiu a rainha", acusou Donald Trump, que garantiu que, caso regresse à Casa Branca, o príncipe não vai contar com a sua ajuda EPA/Andy Rain
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Um advogado do Departamento de Segurança Interna (DHS) defendeu, na audição da acção interposta pela Heritage Foundation (HF) para tornar públicos os documentos de candidatura do príncipe Harry a um visto norte-americano, que “um livro não é um testemunho juramentado ou uma prova”. Ou seja, segundo John Bardo, o facto de o príncipe ter escrito nas suas memórias que consumiu drogas não significa que de facto o fez, avaliando que esses dados poderiam ter sido colocados na narrativa com o objectivo de “vender livros”. “Dizer algo num livro não significa necessariamente que seja verdade”, observou, na sexta-feira, citado pelo The Telegraph.

O causídico apontou ainda outra forma “plausível” para a entrada do príncipe nos EUA: com um visto de categoria A, reservado a diplomatas e funcionários de governos estrangeiros que visitam os Estados Unidos para tarefas oficiais. “Ele continua a ser um membro da família real britânica e tem o título de duque de Sussex, continua a ser um funcionário do governo no Reino Unido pelo seu nascimento e título.”

Para a HF, que desde o lançamento do livro procura saber o que consta nos registos de entrada do príncipe, ambas as defesas são desprovidas de sentido. Por um lado, destacou o director do Centro Margaret Thatcher para a Liberdade da HF, Nile Gardiner, “é um argumento ridículo” sugerir que o príncipe Harry tenha mentido no seu livro. E, por outro, destacou o advogado da HF, Samuel Dewey, a ideia de que o duque poderia ter recebido um visto de categoria A é “absurda”, uma vez que Harry não trabalha para a família real ou para o Governo britânico desde antes de ter pedido residência nos EUA.

Durante a sessão de sexta-feira, Dewey chamou ainda a atenção para a recente entrevista de Harry ao programa televisivo Good Morning America, ao longo da qual admitiu ponderar pedir a nacionalidade norte-americana, desabafando “não ter ideia” do que o está a deter de avançar.

No entanto, o facto de a lei norte-americana o forçar a renunciar os títulos reais pode ser um dos obstáculos. A política de imigração dos EUA estipula que “qualquer requerente que possua títulos de hereditariedade ou posições de nobreza num Estado estrangeiro deve renunciar ao título ou à posição”.

Outro problema potencial para o príncipe será uma alteração na Casa Branca. Com eleições agendadas para Novembro, o candidato Donald Trump aproveitou a Conferência de Acção Política Conservadora, no sábado, para garantir que o príncipe Harry não terá qualquer tratamento preferencial se voltar a ocupar o cargo que assumiu entre 2017 e 2021.

Trump acusou a Administração Biden de ter sido “demasiado gentil” com o inglês, o qual, garantiu o candidato em declarações ao Daily Express, “estaria por sua conta” se dependesse dele. Mas o motivo de Trump é maior que qualquer lei de imigração: “Ele traiu a rainha”, acusou o candidato republicano, referindo-se ao facto de Harry e Meghan terem decidido dar o nome de Lilibet à filha sem consultar a monarca (o que, segundo uma biografia não autorizada, terá deixado Isabel II “zangada”). “É imperdoável”, resumiu Trump.

Mentiroso ou privilegiado?

Há um ano, a HF, um gabinete conservador norte-americano com influência significativa nas políticas públicas americanas, confirmou ao PÚBLICO a existência de um pedido (versão original, em pdf) para que o visto do príncipe Harry fosse divulgado, questionando se o britânico mentiu no formulário sobre o consumo de estupefacientes, que, entretanto, admitiu no seu livro de memórias.

No livro Na Sombra, que só na primeira semana vendeu 3,2 milhões de exemplares em todo o mundo, assim como em várias entrevistas televisivas, o filho mais novo de Carlos e Diana admitiu ter consumido cocaína, marijuana e cogumelos mágicos. De acordo com a HF, um historial de consumo de drogas é habitualmente motivo para a recusa de um visto nos EUA, sendo que a lei de imigração dos EUA prevê duras penas para quem é apanhado a mentir na sua candidatura a um visto, que pode ir desde a recusa da cidadania até à deportação imediata. No caso de Harry, estima a HF, ou o príncipe mentiu ou os funcionários fronteiriços sabiam de tudo e atribuíram-lhe um tratamento especial por ser membro da família real britânica e a sua mulher ser uma conhecida actriz — o que também viola a lei norte-americana.

O uso de estupefacientes é abordado em várias passagens do livro de memórias do príncipe Harry, lançado em Janeiro do ano passado. Sobre o consumo de cocaína, Harry refere ter tido a primeira experiência aos 17 anos, acrescentando que fez “mais algumas linhas” em situações que descreve como sociais.

O duque também recorda a vez em que, numa festa na casa da actriz Courteney Cox, tornada famosa com a série Friends, consumiu cogumelos mágicos — o que o fez conversar com um balde de lixo e uma sanita.

Já sobre a ayahuasca psicadélica, Harry garantiu ter-se tratado de uma experiência positiva. “Sob a influência dessas substâncias eu era capaz de me livrar de rígidas ideias preconcebidas, ver que havia outro mundo além dos meus sentidos fortemente filtrados, um mundo igualmente real e duplamente belo — um mundo sem névoas vermelhas, sem motivo para névoas vermelhas. Havia somente a verdade.” E, numa entrevista cedida ao terapeuta Gabor Maté, um defensor da despenalização de drogas, o duque assumiu que a marijuana “realmente” o ajudou.

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