Que dizem estes debates para “quem nos acompanha lá em casa”?

No primeiro e único debate entre mulheres desta maratona, as líderes do Bloco de Esquerda e do PAN trocaram argumentos na CNN Portugal.

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Já ia quase no fim o debate entre Inês de Sousa Real e Mariana Mortágua, o único entre duas mulheres desta maratona de confrontos, quando o moderador João Póvoa Marinheiro trouxe à baila a questão de género: não para lamentar que no leque de líderes partidários haja tantas mulheres como pessoas chamadas Rui, mas para recordar que “tanto o PAN como o Bloco têm uma base de eleitorado maioritariamente feminina”. “Gostava que deixassem uma palavra final às mulheres que nos acompanham lá em casa”, pediu o pivot da TVI.

A falta de subtileza não desarmou Mariana Mortágua, a primeira a responder a “porque é que as portuguesas devem confiar no Bloco, Mariana?” com um simples e directo “porque as propostas são justas”. Mencionando brevemente a luta pela igualdade de género e o combate à violência doméstica, bandeiras históricas do Bloco (algo que “certamente não diferencia” o BE do PAN), logo aproveitou a intervenção final daquele que era o seu último frente-a-frente para voltar às suas “propostas para uma vida boa”, que são para todas as pessoas – mulheres, claro, incluídas.

Já Inês Sousa Real, que fez do género uma arma no debate com Luís Montenegro, apanhou a bola destacando as medidas que o PAN tem defendido em matérias de violência de género – mais casas-abrigo para vítimas de violência doméstica (podendo trazer os animais de companhia) ou a luta pela consagração do crime de assédio sexual – e de igualdade no trabalho, com uma proposta para a próxima legislatura referente a “quotas de género nas empresas”. Sem deixar de lamentar, e bem, “o que ainda há a fazer no caminho para a igualdade de género” quando as líderes em debate sejam “apenas a 5.ª e a 6.ª mulheres que lideram um partido político” com assento parlamentar.

O debate entre Mariana Mortágua e Inês de Sousa Real foi um bom debate: conhecemos as ideias do BE e do PAN sobre ambiente e crise climática (tema que, infelizmente, os moderadores só abordaram nos debates em que Sousa Real participou), o papel das empresas no caminho para a descarbonização do país, as propostas para a habitação e o aumento do salário mínimo, assim como as críticas mordazes do Bloco sobre o apoio do PAN ao PSD-Madeira.

Depois de um debate de ideias sobre o país, a pergunta final soou a caricatura de uma das máximas exaustivamente repetidas pelos comentadores dos canais de notícias, de que as lideranças partidárias estão nestes debates a “falar para o seu eleitorado”. Falando ou não apenas para o seu eleitorado, facto é que os partidos apresentam propostas para o país, que é naturalmente feito de uma pluralidade de grupos e interesses: não apenas mulheres ou apenas homens, não apenas trabalhadores ou apenas empresários, médicos ou utentes, professores ou alunos, pessoas que querem (ou podem) comprar casa ou quem as pode construir, não apenas pessoas que ganham do salário médio para cima.

O que fica desta maratona de debates é uma reflexão não apenas sobre quem escolhe falar para o país como se estivesse dividido em segmentos de mercado, mas também sobre o papel da comunicação social neste festival – perdoem-me, pré-campanha –, em que a forma vale mais do que o conteúdo e em que, por vezes, se esquece que a democracia é para todas as pessoas, e não apenas os grupos para os quais os partidos falam e os comentadores comentam.

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