Especialistas em património indignados com a saída do país da pintura de Domingos Sequeira

Historiadores de arte e museólogos publicam carta aberta a apelar à compra da Descida da Cruz, que o então director-geral do Património Cultural permitiu que fosse posta à venda em Espanha.

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Descida da Cruz, do pintor Domingos Sequeira (1768-1837) está à venda na galeria Colnaghi de Madrid, com um valor atribuído de 1,2 milhões de euros wikicommons images
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Numa carta aberta ao ministro e à secretária de Estado da Cultura, um conjunto de doze “reconhecidos especialistas em história da arte, património e museus” manifesta a sua “indignação” com o ex-director-geral do Património Cultural, João Carlos dos Santos, por este ter autorizado, em Novembro, a saída do país da pintura Descida da Cruz, de Domingos Sequeira.

Os signatários, encabeçados pela historiadora de arte e museóloga Raquel Henriques da Silva, ex-directora do Instituto Português de Museus (IPM), lembram que o director do Museu Nacional de Arte Antiga (MNAA), Joaquim Caetano, enviou em devido tempo à tutela um “parecer absolutamente contrário à exportação desta obra de arte, fundamentando-o e manifestando a indispensabilidade, solidamente alicerçada, de esta pintura vir a ser adquirida para integrar as colecções do Museu”.

Um parecer que os autores da carta “subscrevem inteiramente”, manifestando “profunda indignação pelo comportamento do ex-director-geral do Património Cultural [João Carlos dos Santos, actual presidente do Património Cultural, I. P.], e por via dele de toda a DGPC”, acusando-o de “manifestar grave ignorância cultural” e de “não cumprir nem justificar o não cumprimento das claras disposições e orientações da Lei de Bases dos Museus Portugueses no que se relaciona com a exportação de bens museológicos de excepcional valor cultural”.

Considerando “indigna” e “gravemente lesiva do património português” a autorização de exportação da pintura, que se encontra neste momento exposta para venda numa galeria de arte em Madrid, os autores desta carta – entre os quais se contam dois antigos directores do MNAA, o conservador e crítico de arte José Luís Porfírio, e António Filipe Pimentel, actual director do Museu Calouste Gulbenkian – apelam ao Ministério da Cultura para que, “não obstante o prejuízo” provocado pela decisão que permitiu a saída da obra, envide “todos os esforços” para que esta “seja adquirida pelo Estado português e integrada nas colecções do MNAA”.

Os historiadores de arte Vítor Serrão, Anísio Franco, actual subdirector do MNAA, e José Alberto Seabra Carvalho, seu antecessor no cargo e ex-conservador da colecção de pintura do museu, são outros signatários da carta, também assinada pela museóloga Simonetta Luz Afonso, igualmente ex-directora do Instituto Português de Museus, pelos arqueólogos Adília Alarcão e Luís Raposo, pela arquitecta paisagista Aurora Carapinha, por Jorge Custódio, especialista em conservação e restauro com uma longa carreira pública na área do património, e pelo presidente do Fórum Cidadania Lx, Paulo Ferrero.

Os destinatários desta carta aberta – o ministro Pedro Adão e Silva e a secretária de Estado Isabel Cordeiro – já manifestaram a intenção de tentar adquirir a Descida da Cruz e outras duas obras de Domingos Sequeira que integram o mesmo conjunto e que se encontram também na posse de descendentes do primeiro duque de Palmela, que as comprou em meados do século XIX a uma filha do pintor. Na semana passada, Isabel Cordeiro adiantou ter dado indicações à Museus e Monumentos de Portugal (MMP) para “aferir as condições de venda” destas obras, o que estará já a ser feito.

“Tal como noticiado, a Museus e Monumentos de Portugal recebeu esta semana mandato da tutela para desenvolver o processo de contacto com os proprietários das obras em questão, não existindo ainda qualquer informação susceptível de ser partilhada publicamente”, confirmou na sexta-feira ao PÚBLICO fonte oficial da instituição.

Tentamos ainda obter, junto do Ministério da Cultura e do próprio João Carlos dos Santos, uma explicação para se ter decidido não abrir de imediato um procedimento de classificação, que teria impedido a saída da obra, mas não recebemos resposta do MC, e o actual presidente do Património Cultural declinou fazer quaisquer comentários.

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