Montenegro, o verdadeiro caçador de gambozinos

Caçador de gambozinos é aquele que se dedica a procurar o que não existe. Diria que a designação assenta melhor a Luís Montenegro do que a Costa ou a Pedro Nuno Santos.

Palavra de honra que me fascina a falta de propostas de Luís Montenegro. As suas intervenções são marcadas pela crítica ao Partido Socialista, a António Costa e a Pedro Nuno Santos. Não me interpretem mal. Criticar é uma arte e faz parte da atividade política. E até podia dar-se o caso de Montenegro ser bom a demolir os socialistas e a fazer disso um exercício digno de apreciação.

Vejamos o que se passou este fim-de-semana. Luís Montenegro precisava de desviar as atenções do congresso do PS e de lançar na comunicação social frases “orelhudas” que os títulos na imprensa repetissem. Percebe-se bem que tenha sentido essa necessidade. Mas percebeu-se também a sua falta de habilidade. “O doutor António Costa e o doutor Pedro Nuno Santos são os maiores caçadores de gambozinos da política portuguesa porque estão sempre à procura do diabo. E vão continuar a procurar.” O conteúdo político destas afirmações é nulo. Como sátira, também não valem muito e não vejo que arranquem uma gargalhada a quem quer que seja. Alguém diga a Luís Montenegro que não é nenhum Ricardo Araújo Pereira.

Montenegro prosseguiu na ladainha de que o diabo “é uma fantasia” dos socialistas e “uma defesa para a sua incompetência e para a sua incapacidade de executar decisões”. Percebemos que tentava responder ao que António Costa afirmou no congresso: “O diabo é a direita.” Por sua vez, Costa rebatia o aviso que Pedro Passos Coelho, em 2016, tinha feito aos deputados do PSD: “Gozem bem as férias que em setembro vem aí o diabo.” Até existia aqui um fio condutor e claro que se reveste de interesse, até político, seguir estes longos fios dialéticos entre opositores políticos. Mas, caramba, é mesmo preciso manter a qualidade e a subtileza no que se diz. Montenegro foi embaraçoso.

Também partilhou, na rede social X, o seguinte: “O Partido Socialista governou os últimos 8 anos e quer dizer ao País que agora é que vai ser? Mais 8 anos de perda de tempo? Nem mais 8 segundos de socialismo a governar Portugal de mão dada com o Partido Comunista e com o Bloco de Esquerda!”

Novamente uma ausência de ideias e de propostas políticas. Esta declaração é, aliás, ilustrativa da argumentação habitual de Luís Montenegro, ou seja, decreta que os socialistas já estiveram muito tempo no poder e que agora é a vez do PSD. A alternância governativa entre o centro-esquerda e o centro-direita tem sido a base do funcionamento do sistema democrático português. Mas isso não significa que o PSD tenha direito a liderar a próxima solução governativa. Continua a ser preciso ganhar as eleições. É essa parte que parece escapar a Luís Montenegro.

Por outro lado, Montenegro referiu-se à solução governativa que, na história da democracia, os portugueses mais apreciaram como se fosse o bicho-papão. Reparem que é objectivo: a "geringonça" mereceu a aprovação da maioria dos portugueses. Dizer que os socialistas podem dar as mãos ao PCP e ao Bloco irrita uma parte dos portugueses, mas é apenas aquela parte que nunca votará à esquerda. Os restantes até ficam animados com essa possibilidade. A direita bem tem tentado equiparar a "geringonça" a um entendimento à direita que inclua o Chega, mas está longe de o conseguir.

Luís Montenegro parece estar cada vez mais afastado dos portugueses. A sua revolta com uma possível continuação dos socialistas no poder não tem reflexo na maioria deles. As sondagens mostram que o PS está a crescer e a distanciar-se do PSD. Isto torna a sua estratégia de comunicação, em vésperas de eleições, ainda mais desajustada. Se a maioria dos portugueses acusasse saturação do Governo socialista e uma vontade de mudança, faria sentido que Montenegro se limitasse a verbalizar esse desejo de mudança e eventualmente que se dispensasse de apresentar propostas e de fazer um combate político entusiasmante. Mas a realidade não é, de todo, essa. Montenegro precisa efetivamente, para ganhar as eleições, de conquistar o voto dos portugueses e de os convencer de que tem melhores soluções para os problemas do país. E continua muito longe de o conseguir.

Caçador de gambozinos é aquele que se dedica a procurar o que não existe. Diria que a designação assenta melhor a Luís Montenegro do que a Costa ou a Pedro Nuno Santos. É Montenegro que se dirige a um país saturado do socialismo, um país onde não precisa de apresentar ideias para conquistar votos, um país que no dia 10 de março lhe dará uma grande alegria.

A autora escreve segundo o novo acordo ortográfico

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