Nacionalize-se o Jornal de Notícias, o Diário de Notícias, a TSF já!
O Presidente da República pede um “entendimento de regime” para salvar a imprensa, com particular foco na situação desesperada que se vive na Global Media.
Estamos a viver um momento totalmente crítico na imprensa. Os nossos camaradas da Global Media não receberam o salário de Dezembro nem têm perspectivas de receber. A nova administração, que apareceu cheia de boas intenções anunciando investimentos e contratações, em pouco tempo virou o bico ao prego: não tem dinheiro, não paga, prepara um despedimento colectivo em grande escala.
Como disse Marcelo Rebelo de Sousa na entrega dos prémios Gazeta, “é fundamental olhar enquanto é tempo”. O Presidente da República pediu acção de modo a que “para o ano nos encontremos sem estes despedimentos, sem esta indefinição, sem estes não pagamentos de salários, sem esta indefinição em que ninguém é responsável, não é o proprietário, não é o gestor, não é o financiador, não é ninguém com responsabilidades administrativas, morreu solteira a culpa”. “Às tantas” — diz Marcelo —, “só falta dizer que os responsáveis são os jornalistas que (…) escolheram a porta errada”.
O Presidente da República pede um “entendimento de regime” para salvar a imprensa, com particular foco na situação desesperada que se vive na Global Media.
Se não costumam existir pactos de regime em tempos eleitorais, podemos lembrar-nos do memorando da troika, assinado por um governo em gestão, o do PS, mas com o acordo do PSD — o tal pacto de regime.
Como costumava dizer o falecido Fernando Rocha Andrade, é muito possível que, se o Tribunal Constitucional tivesse sido chamado a analisar os poderes de um governo de gestão para assinar compromissos em nome do Estado português, considerasse inconstitucional a assinatura do memorando da troika por um governo já sem grandes poderes.
O Presidente da República diz que “é fundamental olhar enquanto é tempo”: “O realismo impõe que não se demore mais tempo, que não se encontre solução na 42.ª ou 44.ª na edição dos Prémios Gazeta”. Se o Governo demorar a agir, pode ser já “tarde” para “não sei quantos jornalistas, não sei quantas famílias de jornalistas, não sei quantos órgãos de informação, não sei quantas formas de escrutínio essenciais para a democracia”.
Se é urgente começar a debater o apoio transversal do Estado à generalidade dos órgãos de comunicação social, um tabu em Portugal desde os tempos em que muitos títulos eram públicos — porque eram propriedade dos bancos e os bancos foram nacionalizados a seguir ao 25 de Abril, para a Global Media o tempo é agora. A nova administração já demonstrou por A mais B que não tem quaisquer condições para gerir a empresa nem sequer consegue pagar salários nem subsídios de Natal.
A única solução é a entrada de capital do Estado para não deixar morrer títulos históricos como o Jornal de Notícias, o Diário de Notícias e a TSF. O Estado já “salvou” bancos em nome da estabilidade financeira. “Salvou” a Efacec, porque seria “um buraco negro deixar a empresa colapsar” e importa recordar as palavras de Costa Silva, ministro da Economia: “Dormiria muito mal se mandássemos cerca de duas mil pessoas para o desemprego e deixasse cair uma empresa de alta tecnologia.”
O Governo tem, agora, a obrigação de “salvar” a Global Media, não só em nome de não deixar muitas famílias no desemprego, mas também para em nome da democracia e do pluralismo na informação.
É evidente que a palavra “nacionalizar” faz os liberais e os militantes da direita subirem paredes. A narrativa de que qualquer entrada de capital do Estado é vista sempre como o diabo — porque o Estado, em si, é mau, horrível, come criancinhas ao lanche e por aí fora. Qualquer entrada de dinheiro do Estado para salvar a Global Media vai ser contestada pela direita, nomeadamente pela Iniciativa Liberal. Mas as palavras de Carlos Moedas na entrega dos prémios abre uma janela de esperança: “É um golpe o que estamos a viver em jornais de referência para todos nós, portugueses. É um aviso para valorizarmos a vossa profissão (…) para dar estabilidade e não imprevisibilidade.”
O problema é que a narrativa do “Estado mau” contaminou também o PS, um partido social-democrata, uma família política que, na sua origem, acreditava que deixar tudo ao mercado livre era um erro e o Estado ocupava um papel fundamental na regulação de uma sociedade. Pedro Nuno Santos passou a sua vida política a denunciar a contaminação do socialismo pelo neoliberalismo.
Obviamente, a decisão cabe ao Governo. As palavras do ministro da Cultura, quando perguntou à Entidade Reguladora, “as consequências da crise deste grupo para o pluralismo da informação”, dão a entender que Pedro Adão e Silva percebe o que se impõe fazer. Oxalá não se perca muito tempo.