Cardeal e poeta

A brilhante carreira de José Tolentino Mendonça no âmbito eclesiástico e universitário testemunha um valor pessoal que granjeou essa coisa rara: um reconhecimento amplo e consensual.

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A notícia da atribuição do Prémio Pessoa ao Cardeal Arcebispo José Tolentino Mendonça suscita na sociedade portuguesa um sentimento de enorme satisfação e orgulho. O Cardeal Tolentino é um homem da Cultura à escala nacional e internacional: em Itália, não é menor o encantamento com que os seus livros são lidos do que no nosso país.

Para um português que gosta de viajar por terras italianas (como é o meu caso), é sempre gratificante encontrar nas livrarias de Milão ou de Roma vários títulos do Cardeal Tolentino. Estou a pensar em Gesù: La sorpresa di un ritratto ou Una bellezza che ci appartiene (entre outros). A brilhante carreira de Tolentino no âmbito eclesiástico e universitário português e, nos últimos anos, nas instituições do próprio Vaticano testemunha um valor pessoal que granjeou essa coisa rara: um reconhecimento amplo e consensual.

Digo "amplo" na acepção mais evidente: muitas pessoas que me abordam a propósito de temáticas referentes à Bíblia confessam a sua paixão pelos livros de José Tolentino Mendonça: desde pessoas que se situam nas franjas mais conservadoras do catolicismo a cristãos que procuram um "novo" cristianismo, idealizado como mais próximo das origens. Julgo não estar a cometer nenhuma inconfidência se eu disser que pessoas tão diferentes como Maria João Avillez e Francisco Louçã já exprimiram, em conversa comigo, a sua grande admiração pelo Cardeal Tolentino. Pela parte que me toca, eu gostaria de sublinhar este traço de personalidade muito meritório: antes de as actividades do Cardeal Tolentino terem ficado mais centradas no Vaticano, ele demonstrou um espírito notável na generosidade com que acompanhou e aconselhou um grupo de católicos homossexuais.

Tolentino encarna, assim, aquilo de que (a meu ver) a Igreja Católica mais precisa neste momento: mostrar a sua vontade de intervir no diálogo "impossível" entre interlocutores aparentemente irreconciliáveis, para dar a ver que existe uma essência inerente ao próprio Cristianismo na qual todos (desde católicos a ateus – e passando por todas as gradações no meio) se podem encontrar.

O facto de o Cardeal Tolentino ter posto o seu talento literário ao serviço da divulgação desta mensagem coloca-o numa longa linhagem de figuras que brilharam em igual medida como homens da Igreja e como homens da Literatura. Podemos pensar, no século XX, em Ronald Knox ou em Romano Guardini. Ocorre também lembrar o Cardeal Newman, a quem o seu mais recente biógrafo chamou "professor, poeta, teólogo, génio". O Prémio Pessoa não podia ter ficado em melhores mãos.

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