Extrema-direita vence eleições nos Países Baixos, mas formar governo será tarefa difícil

Partido liderado por Geert Wilders deverá conquistar 35 lugares no Parlamento de 150, mais nove do que a coligação de centro-esquerda dirigida por Frans Timmermans.

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Geert Wilders, líder do PVV, festeja a vitória na sua sede de campanha EPA/REMKO DE WAAL
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O Partido da Liberdade (PVV), de extrema-direita, foi o mais votado nas eleições legislativas antecipadas que se realizaram esta quarta-feira nos Países Baixos, segundo as sondagens à boca das urnas, divulgadas logo após o fim da votação.

“Teremos de encontrar formas de estar à altura das esperanças dos nossos eleitores, de voltar a pôr os holandeses em primeiro lugar”, disse Wilders após as sondagens terem mostrado que o PVV dispunha de uma larga vantagem sobre os outros partidos. “Agora é a altura de os partidos procurarem acordos, não podemos ser ignorados”, acrescentou.

O partido liderado por Geert Wilders deverá conseguir 35 lugares dos 150 lugares no Parlamento neerlandês, mais nove do que a coligação Partido Trabalhista-Esquerda Verde (PvDA-GL, centro-esquerda e ecologia), liderada pelo antigo vice-presidente da Comissão Europeia Frans Timmermans, que poderá chegar aos 26 assentos parlamentares.

Em terceiro lugar aparece o Partido Popular da Liberdade e Democracia (VVD, centro-direita), do primeiro-ministro em exercício, Mark Rutte, e agora dirigido por Dilan Yesilgoz-Zegerius, com 23 lugares no Parlamento, seguido pelo Novo Contrato Social (NSC, centro), o partido fundado apenas em Agosto pelo antigo deputado do Apelo Democrata-Cristão (CDA, democracia cristã), Pieter Omtzig.

As sondagens à boca das urnas são geralmente fiáveis nos Países Baixos, com uma margem de erro de cerca de dois assentos parlamentares. A vantagem do PVV parecia, assim, ser demasiado grande para que o resultado se alterasse significativamente.

Numa eleição que se esperava taco a taco, a vitória do PVV acaba por ser mais folgada do que as sondagens prévias ao acto eleitoral davam a entender. Wilders deverá tentar formar um governo de direita com o VVD e com o Novo Contrato Social, que, em conjunto, terão uma maioria de 79 deputados.

As conversações poderão, porém, ser difíceis, uma vez que ambos os partidos afirmaram anteriormente ter sérias dúvidas em trabalhar com Wilders, devido à sua posição francamente anti-islâmica, que inclui o objectivo de banir todas as mesquitas dos Países Baixos, mesmo que, durante a campanha eleitoral, tenha tentado suavizar a retórica anti-islão.

“Estou confiante de que podemos chegar a um acordo”, afirmou Wilders no seu discurso de vitória. “Compreendo perfeitamente que não devemos tomar quaisquer medidas que sejam inconstitucionais”, referiu, dizendo-se pronto para governar o país.

Frans Timmermans, que deixou o cargo de vice-presidente da Comissão Europeia para ir às urnas, disse que, apesar de a coligação que liderou ter ficado aquém das expectativas, ainda vale a pena viver nos Países Baixos.

“Se, nos próximos dias, encontrar pessoas no bairro, na escola ou no trabalho que pensem ‘Será que ainda pertenço aqui?’, digo claramente: sim”, escreveu Timmermans na rede social X.

Numa eleição que contou com 66% de participação, Wilders parece ter capitalizado nas propostas de restrição à imigração — a questão que desencadeou a queda do último Governo de Rutte após 13 anos no poder, quando os parceiros de coligação não conseguiram chegar a um acordo sobre uma proposta do VVD para reformar as leis de asilo nos Países Baixos e que foi um tema-chave durante a campanha.

“Já chega. Os Países Baixos não aguentam mais. Temos de pensar primeiro no nosso próprio povo. Fronteiras fechadas. Zero requerentes de asilo”, dissera Wilders num debate televisivo antes da eleição desta quarta-feira.

Autoproclamado fã do primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, Wilders é explicitamente anti-UE e propõs que os Países Baixos retomem o controlo das suas fronteiras, a que junta a redução significativa dos pagamentos à União Europeia e o bloqueio à entrada de novos membros.

O chefe do Governo da Hungria não perdeu tempo, aliás, a felicitar Wilders pela vitória eleitoral. “Os ventos de mudança estão a chegar”, escreveu Orbán na sua conta na rede social X (antigo Twitter). Já o vice-primeiro-ministro italiano, Matteo Salvini, à frente da Liga, disse: “Uma nova Europa é possível.”

Wilders também tem dito repetidamente que os Países Baixos deviam deixar de fornecer armas à Ucrânia, afirmando que o país precisa delas para se poder defender. No entanto, nenhum dos partidos com os quais poderá potencialmente formar governo partilha estas ideias.

“Decidi votar em Geert Wilders. Penso que o seu manifesto é melhor do que nos últimos anos, um pouco mais suave em tudo. Isso agrada-me”, disse a eleitora Ria van der Vaarst, citada pela Reuters.

A vitória de Wilders nas legislativas neerlandesas surge dois meses depois do regresso ao poder do populista Robert Fico, igualmente anti-UE, na Eslováquia, que se comprometeu a suspender a ajuda militar à Ucrânia e a reduzir a imigração. No ano passado, a Itália formou o seu Governo mais à direita desde a II Guerra Mundial, com a vitória eleitoral de Giorgia Meloni.

A votação decorreu em assembleias de voto que incluíram os museus Anne Frank e Van Gogh em Amesterdão, clubes, estações de comboio e até um jardim zoológico.

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