Sindicato dos procuradores arrasa proposta da tutela para oficiais de justiça

Novo estatuto profissional viola independência dos tribunais e favorece surgimento de yes-man, avisa Sindicato de Magistrados do Ministério Público.

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Adão Carvalho, presidente do Sindicato de Magistrados do Ministério Público Nelson Garrido
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É arrasador o parecer que o Sindicato de Magistrados do Ministério Público enviou esta terça-feira ao Ministério da Justiça sobre o novo estatuto profissional proposto pela tutela para os oficiais de justiça.

Assinado pelo presidente do sindicato, Adão Carvalho, o parecer diz que o documento configura nem mais nem menos que uma tentativa do poder político de se imiscuir no funcionamento dos tribunais, comprometendo a sua independência e violando a separação de poderes inscrita na Constituição – além de “destruir por completo a possibilidade de os oficiais de justiça terem acesso a uma carreira digna, devidamente remunerada”.

“Constitui mais um ensaio velado por parte do poder político de tentar, por via da revisão da carreira dos oficiais de justiça, imiscuir-se no exercício da função jurisdicional e na actividade do Ministério Público e dessa forma dar mais um passo no processo de administrativização do sistema de justiça”, lamenta o sindicato dos procuradores.

Em causa está, entre outras coisas, o facto de o documento emanado da tutela não autonomizar as carreiras dos funcionários judiciais consoante trabalhem nas secretarias dos tribunais ou nos serviços do Ministério Público. “Este projecto esquece-se praticamente da existência do Ministério Público, bem como dos seus magistrados, das suas secretarias e dos oficiais de justiça que actualmente nelas exercem funções”, assinala o parecer. “Não podemos aceitar um estatuto exclusivamente orientado para as funções da magistratura judicial e em que o Ministério Público é ignorado”.

Porventura mais grave ainda, continua Adão Carvalho, desperdiçam-se as competências adquiridas por estes profissionais, “alguns com grande experiência, fruto de anos sucessivos de inquirições e interrogatórios”. O que, no limite, escreve, coloca em causa a própria autonomia do Ministério Público.

Mas há mais. Para o sindicato, constitui uma clara invasão da independência dos tribunais a possibilidade de os oficiais de justiça passarem a poder exercer funções até aqui exclusivas dos magistrados, como emitir despachos de mero expediente, bem como a ideia de se poderem tornar assessores de juízes e procuradores mantendo-se, porém, na dependência da Direcção-Geral da Administração da Justiça, em vez de ficarem a depender dos conselhos superiores da Magistratura e do Ministério Público.

“A dependência funcional dos oficiais de justiça à direcção-geral impede, por violação do princípio da separação de poderes constitucionalmente consagrado, a execução, com autonomia técnica, de trabalhos de elevada complexidade que lhe sejam cometidos por magistrado ou o exercício de funções de assessoria técnica aos magistrados”, diz o mesmo líder sindical. Que questiona ainda que a renovação das comissões de serviço desta classe passe a estar exclusivamente sob a alçada do director-geral da Administração da Justiça, “favorecendo ambientes propícios ao seguidismo e favorecimento dos yes-man, em detrimento de se favorecer uma cultura de responsabilidade e qualidade das chefias”.

Contestando ainda a recusa do Ministério da Justiça em atribuir a todos os oficiais de justiça o grau de complexidade funcional 3, ao contrário do que fez com os oficiais de registo, o sindicato termina o parecer declarando a sua oposição veemente à iniciativa do Governo: “As normas constantes do projecto constituem medidas de entorpecimento das funções dos oficiais de justiça, que passam a meros agentes da Função Pública, totalmente dependentes de um serviço central da administração do Estado”.

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