João foi um dos 55 bebés prematuros alimentados pelo banco de leite humano do Norte
No primeiro ano de funcionamento, banco de leite humano do Norte, instalado no hospital São João, recrutou 66 dadoras, que cederam mais de 250 litros de leite a bebés prematuros de toda a região.
O bebé de Sílvia quis "nascer mais cedo", quando ainda não tinha completado os sete meses de gestação. A mãe sabia que a gravidez era de risco, mas não contava que João fosse nascer muito prematuro, abaixo das 32 semanas. Dias depois de o bebé dar entrada na unidade de cuidados intensivos neonatais do hospital de São João, no Porto, Sílvia Castro soube que poderia haver necessidade de recorrer ao banco de leite materno do Norte.
"Devido à prematuridade extrema, tive dificuldade em produzir uma quantidade de leite que fosse suficiente, o meu corpo ainda não estava preparado. A produção foi logo estimulada, mas, mesmo assim, no início, podia não chegar. Aceitei logo que ele recebesse leite do banco porque era leite materno, que é muito diferente de um leite da fórmula", conta a mãe ao PÚBLICO.
João, que está nos cuidados intensivos há precisamente um mês, foi um dos 55 bebés prematuros que o banco de leite humano do Norte alimentou durante o primeiro ano de funcionamento, um número que, para Henrique Soares, director do serviço de Neonatologia do Centro Hospitalar e Universitário São João (CHUSJ), é "muito bom e muito grande". O banco, o primeiro do Norte do país, foi instalado — já com dadoras inscritas — no hospital de São João, mas o grande objectivo era servir toda a região, em "cooperação e articulação entre as instituições hospitalares do SNS".
"O grande objectivo de chegar ao maior número de bebés de risco foi cumprido num número bonito de 55 bebés prematuros. Para um período tão curto de tempo, este número orgulha-nos muito. O Banco de Leite Humano do Norte foi pensado para servir os bebés de risco, mantendo-se aqui um princípio quase que de justiça no acesso ao leite", diz Henrique Soares.
E Sílvia, que não sabia da existência do banco, refere que aceitou "de imediato" a proposta. "O bebé tolera melhor o leite materno e também reduz a probabilidade de infecções, que é um grande problema nos bebés prematuros, portanto só havia vantagens. Todo o processo é muito controlado e isso deu-me muita segurança. Ele também recebe leite do meu, mas, como não é suficiente, complementamos com o leite da dadora."
No último ano, do total de 55, 40 bebés prematuros foram alimentados no São João, outros 15 na Unidade Local de Saúde de Matosinhos, no Centro Materno Infantil do Norte, no Centro Hospitalar Vila Nova de Gaia e Espinho e no Centro Hospitalar do Tâmega e Sousa. No total, o banco conseguiu recrutar 66 dadoras, que cederam mais de 250 litros de leite. "Todo o processo de doação de leite por parte das nossas mulheres dadoras superou as nossas expectativas. Estas mães revelaram-se de uma generosidade incrível e isso acabou por ser um elemento que galvanizou toda a cadeia", refere.
Apesar de sublinhar que o leite de dadora não substitui o leite da própria mãe, o médico explica que é a melhor opção para os bebés de risco. "A própria actividade do banco estimula as mães a produzir mais leite para o seu próprio bebé. Acaba por haver aqui um objectivo também de promover a amamentação, e isso é muito importante porque não queremos passar a ideia de que o leite de dadora equivale ao leite da própria mãe ou que é um substituto em igualdade. Na ausência do leite da mãe, o leite de dadora é o melhor alimento para estes bebés."
Para serem dadoras, as mães de bebés saudáveis com menos de seis meses devem apenas contactar o banco. Durante todo o processo, terão o apoio de uma equipa que se deslocará a casa para recolher o leite doado e esclarecer dúvidas, "garantindo o conforto da experiência de amamentação e doação de leite". "Acho que estas mães ficam com a sensação de que são verdadeiramente apoiadas e o feedback que temos é de bem-estar e satisfação", diz Henrique Soares.
Do lado dos pais dos bebés prematuros, o médico diz que não existiu nenhum caso em que o casal recusasse esta dádiva. "A primeira opção é sempre o leite da mãe, e isso é dito aos pais. A nossa percepção é que ficam tranquilos e satisfeitos com a possibilidade de tratar melhor o seu bebé em caso de não haver leite da mãe. E, muitas vezes, falar da doação com estas mães acaba por funcionar como um estímulo para produzirem o seu próprio leite."
Apesar de algumas variações sazonais durante o último ano, "nomeadamente no Verão", o banco conseguiu ter sempre um número de dadoras que garantiu o "fornecimento do leite em quantidade suficiente e até excedente em algumas alturas". Para o segundo ano, os grandes objectivos são estender a rede a outros hospitais e chegar não só a um número mais alargado de bebés em risco da região Norte, mas também conseguir mais dadoras. "À medida que o processo se torna mais maduro, achamos que o consumo vai aumentar e que as doações também vão acompanhar esse processo", sublinha o médico Henrique Soares.