Estamos ainda em Agosto, os brancos já em boa parte vindimados, e as notícias que vão chegando apontam para mudanças ainda mais radicais. As alterações climáticas, o aquecimento global, tem feito antecipar as vindimas de forma vertiginosa. Meados de Setembro, quando ainda há pouco tempo se iniciavam as vindimas, começam agora a ser olhados em muitos casos como horizonte final, com a agravante de que toda a vindima tem que ser feita num curto espaço temporal, com as várias consequências que isso acarreta.

Não vão longe os tempos em que a vindima se iniciava na eira e acabava à lareira. Ou seja, o tempo das colheitas coincidia com o final do Verão e estendia-se até às noites frias de Outono. Até as aulas começavam mais tarde, com o início de Outubro. As escolas abrem agora mais cedo, antecipam-se as vindimas, mas isto é uma forma de enfrentar o problema, não é a solução. E as mudanças anunciam-se também na geografia dos vinhos.

Quer isto dizer que as vinhas começam a fugir para outras latitudes. E, pelos vistos, também os turistas, como alertam as conclusões de um estudo da Comissão Europeia. O que mostra que esta é uma questão abrangente, e o sector vinícola em Portugal começa a ter também uma forte componente turística.

De facto, há cada vez mais vinhas e produtores fora das latitudes tradicionais. À procura de ambientes mais frescos e para prevenir os fenómenos meteorológicos extremos cada vez mais frequentes. Era impensável — e para muitos pode parecer ainda uma loucura – mas as notícias dão já conta da exploração de vinhas na Suécia. Não é miragem nem futurismo. Produzem fundamentalmente brancos, e até já os exportam.

E o fenómeno não é assim tão recente. As videiras estão a ser plantadas cada vez mais para norte e a Suécia não é caso isolado. Já há vinhas comerciais na Noruega e na Dinamarca ou Polónia, e a área de vinha no Reino Unido deve duplicar na próxima década. Neste caso, há muito que são conhecidos os excelentes espumantes que estão a ser produzidos no Sul de Inglaterra, onde, de resto, as grandes casas de Champanhe têm já grandes extensões de vinha.

Um fenómeno que até já tem nome. São os chamados vinhos de latitude, aqueles que são produzidos fora das zonas convencionais do planeta até agora tidas como aptas para exploração da vinha. As latitudes entre 40 a 50 graus Norte, englobando o Sul da Europa, EUA e China, e entre 30 e 40 graus Sul, com Chile, Argentina, África do Sul, Nova Zelândia e a metade Sul da Austrália.

A videira é uma planta muito sensível, e a generalidade das castas tem num curto campo de dois a três graus centígrados o ponto óptimo para expressar as suas melhores qualidades. Demasiado calor dá vinhos concentrados e desequilibrados, muito frio, ácidos e com pouco álcool. As temperaturas mais elevadas estão a mudar todos os paradigmas.

Em relação ao início deste século, as vindimas estarão a ser antecipadas 20 dias em média, mas têm que ser feitas agora num curto espaço de tempo, o que implica questões complicadas, desde logo mão-de-obra e logística de adega. Mas o maior problema com o aumento das temperaturas são os riscos de produção associados às secas e fenómenos extremos, não esquecendo as pragas e doenças da vinha. 

As notícias dão conta de que as vinhas vão emigrando para latitudes mais frescas e os turistas ameaçam seguir-lhes o caminho. Por cá temos acompanhado também um fenómeno migratório das grandes empresas em direcção à frescura do Minho. O caso mais recente – e histórico – é o da conversão da The Fladgate Partnership, (dona da Taylor's, Fonseca, Croft e Kroh) – que entra também na Bairrada e no Dão , mas é generalizado também o caminho dos vinhos em direcção às vinhas dos pontos mais altos, precisamente à procura da frescura. São os vinhos de altitude, cada vez mais registada nos rótulos, uma espécie de versão para consumo interno dos vinhos de latitude.