Odemira: “A nossa Teima foi consumida pelas chamas”, mas “animais estão bem”. Fotos mostram destruição
O incêndio por Odemira destruiu alojamentos no Vale Juncal. “Não houve um bombeiro a defender-nos”, queixam-se proprietários, Luísa Botelho e o marido, o jornalista Paulo Camacho. Animais “estão bem”.
Desde sábado que um vasto incêndio percorre vários pontos dos concelhos de Odemira, Monchique e Aljezur e, com uma área ardida de cerca de 7000 hectares, são já centenas as evacuações de casas, com vários pontos críticos e muito património perdido. Incluindo um turismo rural, única "vítima" no sector de alojamentos turísticos confirmada até agora, considerado "um oásis no vale", como se escreveu na Fugas, e que ardeu quase por completo, confirmaram os proprietários.
"A nossa Teima foi consumida pelas chamas", escreveram esta terça-feira no Facebook oficial deste alojamento rural localizado em Vale Juncal (mais precisamente Vale Juncalinho), no concelho de Odemira, onde, em área da freguesia de São Teotónio, deflagrou o incêndio, a poucos quilómetros do início do concelho de Aljezur - em Odeceixe, que também sofreu a ameaça do fogo).
Sendo um turismo rural que unia o luxo com a vida no campo, vivem no recinto vários animais, o que motivou preocupações de muita gente: "Foram todos salvos", explica Luísa Botelho (proprietária, juntamente com o marido, o ex-jornalista Paulo Camacho), compreensivelmente emocionada à Fugas, já esta quarta, após acederem ao recinto e divulgarem fotos dos prejuízos. "As gatinhas fugiram, claro, mas voltaram, os cães levámos connosco e abrimos os portões para os burros fugirem". Mas eles ficaram por aqui: "Andaram a fintar o fogo!, quando chegámos estavam na entrada os três à nossa espera, muito juntinhos", suspira.
Com os olhos em tanto que ardeu, Luísa avalia o prejuízo em mais de 650 mil euros de perdas, não só pelo edificado - quer as casas como "a ponte, que custou uma fortuna", mas por todos os depósitos, infra-estruturas, os anexos que arderam, a casa principal que ardeu 80%". Uma casa salvou-se, mas, perdas acrescidas no global do turismo, todo o artesanato, arte, mobililário e elementos de design de luxo.
A maior "dor" de Luísa, porém, é a "revolta" e "não compreender", por que os bombeiros não actuaram. "Quando fiz as evacuações das casas, liguei, às 13h, à GNR, porque não se conseguia contactar mais nenhuma entidade, e comuniquei que ia arder tudo. Nem sei o número de vezes que liguei até à noite", conta à Fugas.
Ao ver que os seus "pedidos de socorro" não surtiram efeito, Luísa, lembra, furou o bloqueio: "Fui por onde pude, por montes e vales, até perto da Teima. Lá perto [do vizinho hotel Enigma], a 500m, estavam os bombeiros e pedi-lhes que por favor fossem lá porque a casa estava a arder". Sem efeito. E cita o que lhe disseram: "Minha senhora, não podemos sair daqui porque não temos instruções." A proprietária acrescenta que mais tarde o filho repetiu o pedido e recebeu resposta igual.
"Eram quatro da tarde. Chegaram perto das sete. Já tinha ardido tudo". E não vai desistir: "Há que apurar responsabilidades, isto não é brincadeira." As autoridades dizem que "estão a averiguar".
Além desta "situação inexplicável", em que, felizmente, o Enigma se salvou sem grande mossa, mas a vizinha Teima ardeu quase de alto a baixo e para os lados, Luísa Botelho adianta que "aguarda os telefonemas do Turismo de Portugal e do presidente da câmara de Odemira, Hélder Guerreiro" para saber com que tipo de apoios poderá contar. "O presidente do Turismo do Alentejo [José Manuel Santos] ligou-me logo nessa noite, solidário", sublinha.
"Precisamos de apoios, ou não poderemos fazer nada, nada", emociona-se. Até porque tem a certeza que o seguro só cobrirá "uma parte ínfima das perdas". "Isto é algo de luxo, não vai cobrir a reconstrução, tudo o que estava lá dentro." Da sua parte, uma certeza, que já tinha sido expressa em mensagens nas redes, a de que vai continuar a teimar para fazer renascer das cinzas a sua Teima.
O vale era verde
Projecto de 2019, a Teima, com nove alojamentos e retoques de luxo rural como uma casa de campo, pequena quinta e piscina, não resistiu à destruição do fogo.
Acessível por uns 2km de terra batida (N120, aldeia de Vale Juncal), a Teima fica a uns 6km de São Teotónio, a cerca de 10km da Zambujeira do Mar, a pouco menos que isso de Odeceixe, e tem por vizinhos os espaços de outra célebre unidade hoteleira local, o hotel Enigma.
Nas redes sociais, Luísa já tinha escrito: "Não houve um bombeiro a defender-nos. Estiveram no hotel Enigma (mesmo ao lado)", refere, "e salvaram-no". "De nós ninguém se lembrou, apesar dos meus insistentes telefonemas com pedidos de socorro. A nossa tristeza e revolta é incomensurável."
Apesar do desgosto, e ainda antes de serem avaliados os prejuízos e grau de destruição mais profunda, fica uma nota de esperança: "Vamos ter de fechar por uns meses. Espero que...", terminando com um "até breve".
É que, mesmo tendo como imagem de marca a burra Rosa, Teima não deve o nome à lendária teimosia destes espertos animais. “Deve-se à minha teimosia”, contava Luísa Botelho à Fugas em 2021, depois da pandemia e da reabertura, com o turismo rural renovado. Antes ligada à produção de grandes eventos e à comunicação, Luísa, explicava, sentiu um “amor à primeira vista” por estas terras protegidas do Vale Juncal.
“Entrei no terreno e era mato pegado, porque estava abandonado há 15 anos”, dizia-nos a proprietária, que nem tinha por objectivo fazer um turismo. “Fizemos isto para ser a nossa casa." Começou tudo em 2009 e uns anos depois é que surgiu a ideia de passar a casa de campo a hotelaria. Oferecia agora um cenário onírico, com um laguinho e piscina tão comprida que foi usada por atletas de alta competição, além das estrelas que são animais da quinta, porque são uma "paixão" de Luísa.
A Teima estava decorada ao detalhe, com marcas e criações de topo portuguesas, algumas locais e regionais, num ambiente de monte alentejano de luxo pontuado também por escolhas de design internacionais. Um projecto de teimosia para o qual se promete uma possível ressureição em "breve".
[Actualizado a 9 de Agosto, 16h55, com declarações de Luísa Botelho, proprietária da Teima]