O que significa a Gala Michelin para Portugal?
A separação de Espanha garante maior visibilidade para a gastronomia portuguesa. O Turismo de Portugal não revela o investimento, mas tem 700 mil euros para a promoção da gastronomia em 2023 e 2024.
Só desde 2010 é que passou a haver galas para anunciar os restaurantes galardoados com estrelas Michelin e tudo começou em Espanha. Até então, recorda Miguel Pereda-Rivera, director de vendas e marketing da Michelin Espanha, o guia convidava jornalistas, fazia o anúncio e organizava uma pequena refeição depois. Hoje o cenário é completamente diferente. As galas ganharam enorme importância e, dos 40 destinos que têm guias, perto de 80% realiza galas anuais.
Portugal estava, até agora, integrado na gala ibérica, onde, por razões óbvias de dimensão dos países, o grande protagonista era Espanha. 2024 vai ser o ano em que isso muda. Embora não se saiba ainda se haverá um guia impresso dedicado aos restaurantes portugueses - até porque o consumo de informação é cada vez mais digital e, a somar a isso, o site da Michelin permite uma actualização permanente dos dados, o que não é possível em papel - o grande foco é colocado na gala, vista como uma oportunidade de promoção internacional de Portugal como destino gastronómico.
O investimento na gastronomia e vinhos foi assumido como estratégico desde 2017, sublinhou Luís Araújo, presidente do conselho directivo do Turismo de Portugal. “É hora de esta passar a ser a razão da escolha” da vinda a Portugal de turistas estrangeiros, e não apenas algo que se descobre quando já se está no país. Até porque, referiu, registou-se já um aumento de 26% no volume de pesquisas online por temas ligados à gastronomia portuguesa.
A gala da Michelin será, garante Nuno Ferreira, representante do Guia Michelin em Portugal, uma oportunidade não apenas para o país mas para o Algarve - será “a receita que apurará o posicionamento da identidade gastronómica do Algarve”. Mas como se garante uma gala com interesse e conteúdo se não se sabe quantas estrelas poderão vir para Portugal?
Quem assistiu às galas em Espanha sabe que a parte dedicada aos restaurantes portugueses é necessariamente curta - no ano passado foram anunciadas cinco estrelas. A forma de garantir que há conteúdo para alimentar toda a gala passa por anunciar não apenas as estrelas e os Bib Gourmand, mas dar palco aos restaurantes recomendados pelo guia. “A consistência da gala será dada por talento, animação, diversão”, aproveitando uma selecção alargada de “talento”, esclareceu Nuno Ferreira.
De resto, nada pode garantir que a existência de uma gala num país signifique mais estrelas para esse país. O trabalho dos inspectores - que trabalham exclusivamente para a Michelin, mas cujo número não é divulgado, sabendo-se apenas que em média fazem 300 refeições por ano cada um - é totalmente independente e ligado aos critérios rigorosos pelos quais o guia gosta de ser reconhecido.
Sabe-se que estes inspectores são de 15 nacionalidades e que podem passar por Portugal inspectores vindos de diferentes partes do mundo. “Não há uma equipa atribuída a um destino”, frisou Nuno Ferreira, desfazendo a ideia de que quem vem a Portugal são sobretudo inspectores espanhóis.
Até agora, explicou, por seu lado, Miguel Pereda-Rivera, para a gala ibérica eram convidados jornalistas portugueses e espanhóis, mas a ideia é que passem a ser convidados mais jornalistas internacionais, garantindo assim uma maior divulgação do país. Para isso, o Guia Michelin estabelece parcerias com regiões - o Algarve estreia essas parcerias -, com o Turismo de Portugal, cujo apoio foi classificado como essencial, e com privados que queiram associar-se ao evento. Luís Araújo não quis divulgar o montante do investimento do Turismo na gala Michelin, adiantando apenas que para a promoção da gastronomia há, para 2023 e 2024, um montante que ultrapassa os 700 mil euros.
No total, são 500 os convidados que assistirão à gala e participarão no jantar coordenado pelos chefs Dieter Koschina, do Vila Joya, e Rui Silvestre, do Vistas. A do ano passado em Espanha representou, segundo Miguel Pereda-Rivera, “30 milhões de euros em clipping, num dia de cerimónia”. No entanto, Pereda-Rivera diz que as galas não constituem um negócio, embora se paguem. O negócio da Michelin continua a ser a venda de pneus, alargando-se a outras áreas, como a saúde, por exemplo, e os guias destinam-se sobretudo a garantir visibilidade e credibilidade à marca.
O objectivo é que, depois do Algarve, “a gala circule por todo o país”, disse Luís Araújo. As regiões interessadas poderão posicionar-se como parceiras, sendo que ao longo do ano podem realizar-se outras iniciativas - houve recentemente uma “experiência imersiva no território" de jornalistas estrangeiros ao Porto e ao Douro, organizada pela Michelin com o Turismo de Portugal e a AHRESP, que é um exemplo do que pode vir a multiplicar-se no país.