Primeiro-ministro do Kosovo queixa-se de “reacção exagerada” dos EUA
Washington cancelou a participação do Kosovo num exercício militar depois de aumento da tensão em tomada de posse de autarcas albaneses em eleições boicotadas pelos sérvios
Entre os apelos internacionais para fazer descer a tensão no Norte do Kosovo, onde agressões a militares da força de manutenção de paz da NATO causaram alarme, os Estados Unidos levaram as críticas a Pristina mais longe e cancelaram a sua participação num exercício militar, algo que o primeiro-ministro do Kosovo, Albin Kurti, considerou um “exagero” numa entrevista ao Político. Mas Kurti disse considerar repetir as eleições que estão na raiz do problema se a violência parasse.
A onda de violência começou na segunda-feira em Zvecan, uma cidade do Norte, onde em ataques de manifestantes de etnia sérvia ficaram feridos 30 militares da NATO e 52 manifestantes – estes protestavam contra a tomada de posse de autarcas de etnia albanesa em eleições em Abril que a comunidade sérvia, maioritária em quatro localidades do Norte, boicotou. O boicote resultou numa participação de cerca de 3,5% nas eleições, e numa vitória dos candidatos albaneses.
A tomada de posse dos vencedores nestas condições foi criticada pelos EUA e outros aliados. “A decisão do Governo do Kosovo de forçar o acesso a edifícios municipais fez aumentar desnecessariamente a tensão”, disse o secretário de Estado, Antony Blinken.
As autoridades deviam “assegurar-se de que os autarcas eleitos levam a cabo os seus deveres como interinos de outros locais que não os edifícios municipais e retirar as forças policiais de perto destes edifícios”.
Da União Europeia, o alto-representante para a Política Externa e de Segurança, Josep Borrell, disse esperar que "as autoridades do Kosovo suspendam as operações policiais focadas nos edifícios municipais no Norte do Kosovo, e os manifestantes violentos parem as suas acções", prometendo continuar contactos com os líderes do Kosovo e da Sérvia.
Kurti considerou a reacção americana em relação ao exercício como “surpreendente” e “exagerada” acrescentando, ao Politico, que reacções como estas alimentam a violência dos sérvios do Kosovo.
Numa conferência de segurança em Bratislava, Kurti disse, por outro lado: “Se tivesse havido um protesto pacífico para eleições antecipadas isso teria sido compreensível, mas não multidões com a letra Z [o símbolo pró-invasão russa da Ucrânia], que disparam contra soldados e policias, atiram granadas, e gritam “mata, mata”, disse, citado pelo diário britânico The Guardian.
“Não rendemos a nossa república a esta multidão fascista. Se pedirem eleições antecipadas com protestos pacíficos, terão um primeiro-ministro mais do que disposto a ouvi-los e quem sabe concordar com eles”, declarou.
No entanto, Kurti manteve as reticências em aceder à exigência americana de que os autarcas não acedam aos edifícios municipais, questionando onde deveriam então trabalhar.
Os protestos foram, entretanto, nesta quarta-feira maioritariamente pacíficos, com a excepção de vandalismo contra um carro da polícia, que ficou com os vidros partidos, e de dois carros de media albaneses.
As manifestações dos sérvios em Leposavic, uma das localidades do Norte do Kosovo, foram entretanto marcadas pelo uso de símbolos da perseguição à comunidade judaica, uma estrela num pano de fundo amarelo no arame farpado que rodeia o edifício municipal, descreve a cadeia RTS. Também foi posta uma gigante faixa com as cores da bandeira sérvia ao longo do arame farpado.
O Kosovo declarou a sua independência da Sérvia em 2008 e o país é reconhecido por 101 dos 193 Estados-membros das Nações Unidas, incluindo grande parte, mas não todos, os Estados-membros da UE. Tanto a Sérvia como a maioria dos kosovares de etnia sérvia recusaram fazê-lo, e nas zonas de maioria sérvia no Norte do Kosovo tem sido pedida mais autonomia.