Abusos sexuais na Igreja: Grupo VITA recebeu 16 pedidos de ajuda na primeira semana de funcionamento
Equipa criada pela Igreja Católica para acompanhar os casos de abuso sexual no contexto eclesial apela ao contacto das vítimas para que ajuda possa ser accionada.
O Grupo VITA, criado pela Igreja Católica para acompanhar vítimas de abuso sexual no contexto eclesial, recebeu 16 pedidos de ajuda na primeira semana de funcionamento, segundo um comunicado divulgado nesta segunda-feira.
"De todos os contactos efectuados, apuraram-se 16 situações que estão já em fase de agendamento para atendimento presencial ou online, com vista à recolha de informação adicional e posterior encaminhamento e sinalização para as autoridades judiciais e autoridades canónicas", refere a equipa coordenada pela psicóloga Rute Agulhas.
Desde o passado dia 22 de Maio, o Grupo VITA recebeu três contactos por dia, em média. "Entendemos o contacto por parte de todas estas pessoas como um sinal claro de confiança em toda a equipa, independente e constituída apenas por especialistas na área da violência sexual. Reconhecemos a dificuldade e a exigência que esta iniciativa representa para cada vítima e sentimo-nos gratos pela confiança que depositaram em nós", lê-se no comunicado.
O Grupo VITA salienta que não tem forma de contactar as pessoas que já anteriormente partilharam as suas vivências. "Apelamos, por isso, a que nos contactem para que possamos ajudar da melhor forma", pedem.
Primeiro relatório em Dezembro
Apresentado publicamente no dia 26 de Abril, o Grupo VITA, em cujo site estão agregados vários recursos para vítimas de violência sexual, vai dar continuidade ao trabalho iniciado pela anterior comissão liderada pelo pedopsiquiatra Pedro Strecht, cujo estudo permitiu estimar em pelo menos 4815 as crianças vítimas de abuso em contexto eclesial, desde 1950 até à actualidade. Mas tem além disso um carácter operacional, o que lhe permitirá encaminhar vítimas e abusadores sexuais para as respostas terapêuticas que vierem a ser consideradas necessárias, além do necessário registo e encaminhamento para as autoridades eclesiásticas e civis de eventuais novas queixas. Para tal, os novos canais de atendimento (91 509 0000, de segunda a sexta-feira, entre as 9h00 e as 18h00, e o email geral@grupovita.pt) deverão manter-se em funcionamento durante pelo menos os próximos três anos.
Além da recepção de casos de denúncias e relatos de casos de abuso sexual, os especialistas do VITA assumiram a tarefa de criar uma bolsa de profissionais, em colaboração com as ordens profissionais dos Psicólogos e dos Médicos. Em equação está também a criação de uma bolsa de juristas especializados no acompanhamento destes casos. Em paralelo, decorre ainda a capacitação das equipas diocesanas para o processo de acompanhamento das vítimas, dado que a ideia é que, dentro de poucos anos, sejam estas a assumir as funções práticas dos especialistas convocados para o Grupo VITA, conquanto estas sejam capazes de ganhar credibilidade junto das vítimas e dar garantias de independência face à hierarquia da Igreja. Para isso, estas comissões passaram a ser constituídas exclusivamente por leigos.
O tratamento dos agressores não será deixado de parte, porquanto haverá respostas para o respectivo acompanhamento terapêutico. Aqui, a ideia é evitar reincidências, o que "é também uma forma de proteger as vítimas", como enfatizou Rute Agulhas ao PÚBLICO poucos dias decorridos da apresentação pública da equipa que coordena. Este trabalho será coordenado por Ricardo Barroso, psicólogo especializado na intervenção com agressores sexuais, segundo o qual a evidência científica sobre esta matéria já demonstrou que 10% dos agressores têm um risco elevado de reincidir, 50% têm um risco médio-alto e 40% um risco médio-baixo.
Quando os agressores são sujeitos a acompanhamento clínico, a reabilitação é possível em 90% dos casos, ainda de acordo com as declarações prévias daquele especialista, que não descartou, porém, a eventual necessidade de “recorrer a outro tipo de medidas”. O objectivo será sempre conseguir que os agressores aprendam a controlar o comportamento.
E porque a prevenção de novos casos é outro dos eixos prioritários de acção do VITA, o grupo propôs-se igualmente criar um “manual de prevenção” que será difundido em todas as instituições da Igreja, de colégios e grupos de catequese, passando pelos escuteiros e pelas paróquias, além de um programa de prevenção primária. Segundo adiantou Rute Agulhas à Rádio Renascença, o Grupo VITA irá apresentar o seu primeiro relatório no dia 12 de Dezembro.
Além de Rute Agulhas e de Ricardo Barroso, o grupo é composto por Alexandra Anciães (psicóloga com experiência em avaliação e intervenção com vítimas adultas), Joana Alexandre (psicóloga, docente universitária e investigadora na área da prevenção dos abusos sexuais), Jorge Neo Costa (assistente social, intervenção com crianças e jovens em perigo) e Márcia Mota (psiquiatra, especialista em sexologia clínica e intervenção com vítimas e agressores sexuais).
Há ainda um grupo consultivo, com a participação do padre João Vergamota (especialista em direito canónico), Helena Carvalho (docente universitária especialista em análise estatística) e do advogado David Ramalho.