“Se eu fosse um homem rico…”, escrevia há uns meses Thor, como é conhecido o viajante e aventureiro dinamarquês, “voar seria a escolha mais fácil. Mas qual é a graça do mais fácil?”. Boa pergunta, que a Fugas destacava e a que Torbjørn C. Pedersen, de seu nome oficial, acaba de dar sólida e rotunda resposta: acaba de tornar-se "a primeira pessoa a visitar cada país do mundo sem utilizar um único transporte aéreo, durante uma viagem única e ininterrupta que durou [quase] dez anos" (eram para ser quatro...), resume-se em nota de confirmação do feito.
“Fazer algo novo é emocionante e serve como fonte de inspiração e motivação para muitos. Alguns são naturalmente inspirados a visitar novos países e culturas distantes. Outros são inspirados a terminar os estudos, a casar... Isso fascina-me e faz-me pensar. De onde vem realmente a inspiração? Se eu não conseguir completar esta jornada, então algum dia alguém o fará”, comentava Thor, 44 anos, em entrevista à Fugas, no final do ano passado, ainda sem saber como correriam os meses seguintes.
Correram bem: foi esta terça-feira que esta extraordinária saga de uma década cruzou a meta final, nas Maldivas - Once Upon A Saga, Era Uma Vez Uma Saga, é o nome do projecto do aventureiro.
"Foi a aventura mais inacreditável", diz na mensagem que recebemos, "no entanto, estou muito feliz por ela chegar agora ao fim, bem-sucedida". E, compreensivelmente, desabafa: "Estou esgotadíssimo!". E como começou isto tudo? "Iniciei a visita de todos os países do mundo sem apanhar o avião, porque nunca ninguém o tinha feito no passado", conta. "Costumava trabalhar na logística e pensei que seria uma forma engraçada de pôr em prática as minhas competências. Gosto de desafios, mas posso assegurar que foi o maior desafio logístico que alguma vez aceitei."
"Outros viajantes visitaram todos os países de avião ou interromperam a sua viagem, voltaram para casa e retomaram-na mais tarde", sublinha-se. Thor dá por cima e torna-se "o primeiro aventureiro a realizar, integralmente sem apanhar o avião, uma viagem única e ininterrupta, conformando-se com a regra, que ele próprio se impôs, de ficar pelo menos 24 horas em cada país".
O primeiro passo foi dado em Outubro de 2013, na Dinamarca. Melhor: foi dado às 10h10 de 10/10 (simbolismos...). Depois, foi sempre a ganhar quilómetros, sem nunca voar: "Europa, Américas, África, Médio Oriente, Ásia e Pacífico, de carro, autocarro, comboio, barco, e até a pé." Até que, por fim, cruza a meta a 23 de Maio de 2023 (aguardamos confirmação da hora e minutos exactos considerados, mas apenas por profunda curiosidade).
Foi assim que, na terça, chegou a Malé, a capital das Maldivas, no oceano Índico, "a bordo de um navio porta-contentores". O que significa que, de facto, atingiu "o último de 203 países", o número que firmou para o projecto. Afinal, "quantos países existem?! Essa é uma excelente questão", como sabemos, e Thor também, que aborda essa questão no seu site.
Nesta página e nas redes sociais, a longa, longa viagem de Thor foi seguida por muitos (e por nós também), por entre muitos tempos de espera (burocracias e vistos, guerras e covid, crises e climas, é escolher a dificuldade), aventuras a rodos, muitos conhecimentos e conversas, percursos que pareciam quase eternos. O hiato maior e que realmente pareceu quase eterno: Hong Kong, durante dois anos, quando apenas lhe faltavam alguns países, e, já se vê, por culpa da pandemia.
Durante a odisseia, também a sua vida pessoal deu voltas: casou-se com "a namorada de vários anos, Le" ("que o visitou 26 vezes" durante a jornada), precisamente em Hong Kong.
Agora, inicia o regresso à Dinamarca. Que, naturalmente, será, como se depreende, algo demorado e, "sem, obviamente, apanhar o avião". O que para muitos seria puro tédio, para Thor o regresso é apenas mais uma oportunidade, como ele dizia à Fugas, citando o autor Roy E. Stolworthy, de ganhar mais mundo conhecendo mais gente do mundo, tal como tantos viajantes apreciam : “Um estranho é um amigo que nunca conhecemos antes”, cita. No seu Twitter, horas depois de cumprir o projecto e a rematar a odisseia, um desabafo compreensível e emocional: "Hoje, é o primeiro dia em quase uma década em que não acordei com uma lista dos países que me faltavam visitar. Uma lista auto-imposta que restringiu os meus movimentos e a minha vida. Hoje eu sou livre."