Comissões de protecção com o valor mais alto de casos de violência doméstica dos últimos cinco anos

Comissões de protecção de crianças e jovens identificaram no ano passado 4188 situações de crianças expostas a violência doméstica, mais 500 do que a média dos quatro anos anteriores.

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Relatório anual das comissões de protecção de crianças foi revelado esta quarta-feira Daniel Rocha
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Os casos de negligência continuaram a liderar a lista das situações de perigo para crianças e jovens identificadas pelas comissões de protecção em 2022. Mas enquanto esse número baixou relativamente a 2021, o da violência doméstica aumentou, passando a barreira das 4000 situações. Mantém-se assim a trajectória ascendente (neste problema) iniciada em 2019.

Em 2022, foram validadas 4188 situações de violência doméstica, o número mais elevado desde 2018, segundo o relatório anual divulgado nesta quarta-feira no encontro anual das comissões de protecção de crianças e jovens (CPCJ), que se realizou no Peso da Régua.

Houve então mais 508 destas situações do que a média de 3680 que tinham sido diagnosticadas pelas mais de 300 CPCJ em todo o território nos anos 2018, 2019, 2020 e 2021. (Até 2018, a exposição à violência doméstica entrava nas estatísticas da negligência.)

Tal equivale a mais de 80 situações por semana registadas por violência entre o casal ou na família em 2022; significa que foram 11 crianças por dia, nos 365 dias do ano, as que tiveram uma situação de exposição a violência doméstica ou de ofensa física nesse contexto.

Daquilo que é do conhecimento das CPCJ e reflectido no relatório de 637 páginas, as crianças mais atingidas pela negligência ou a violência doméstica são, por regra e como em anos anteriores, as mais pequenas. Os bebés e crianças até aos cinco anos são os mais representados numa e noutra situação: 1683 com estas idades vivenciaram situações de negligência; e 1507 estiveram expostas à violência em casa.

Os casos de negligência totalizaram 4655, menos 14 do que 2021. Como tem sido regra em anos anteriores, a falta de supervisão ou acompanhamento familiar é a situação mais comum abarcando mais de 1400 casos. A estes somam-se vários outros tipos de negligência: no acompanhamento escolar com 589 casos; na saúde da criança com 593 situações; ou no plano psicológico e afectivo com 540 casos. A exposição a consumos de álcool e drogas dos pais afectaram crianças e jovens em 779 circunstâncias.

Comportamentos de perigo

Quando comparada a realidade de 2022 com a de 2021, foram os comportamentos de perigo na infância e na juventude que tiveram o aumento mais expressivo, superando o nível de perigo quando está comprometido o direito da criança à educação (que tinha sido particularmente elevado em 2021), e passando a ocupar a terceira maior problemática.

No ano passado, houve mais 624 situações de comportamentos de risco das próprias crianças e adolescentes – de 2417 passaram a 3041. Entre elas, estão os comportamentos graves anti-sociais e de indisciplina, consumos de droga ou de bebidas alcoólicas, o bullying (sobre outros jovens), comportamentos não especificados, e ainda mas em números baixos o gaming (jogos de entretenimento) com 19 situações ou a dinheiro com três casos, e ainda a prática de factos qualificados como crime pela lei penal mas não para as crianças com menos de 12 anos (aqui houve 20 situações).

Enquanto isso, a protecção do direito à educação esteve mais garantida apesar da confirmação de 2387 casos (com uma grande representatividade do absentismo escolar); em 2021 tinham sido mais 600 situações com um total de 2989 casos.

Mais crianças e jovens acompanhados

De 2021 para 2022, mais 4464 crianças e jovens em situações de perigo foram acompanhados pelas comissões. Numa perspectiva mais global, esse universo aumentou de 60.493 para 74.191 crianças e jovens desde 2018, e eram de quase 70 mil em 2021.

Esse aumento também se repercutiu num aumento das medidas aplicadas de acolhimento, quando não é possível proteger a criança com medidas de apoio junto dos pais ou da família alargada, ou mesmo de terceiros.

Mas se o objectivo declarado do Estado tem sido o de abrandar o ritmo dos acolhimentos de crianças em instituições, privilegiando o acolhimento familiar, isso não está a acontecer. Os dados mostram que proporcionalmente as medidas de acolhimento residencial que tinham vindo a baixar nos últimos anos voltaram a subir passando a representar 5,4% em 2022 quando tinham sido 4,5% no ano anterior.

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Acolhimento familiar não descola

O acolhimento familiar não descolou e manteve a sua expressão irrisória com 0,2% do conjunto de medidas (quando era de 0,3 em 2021). Em termos absolutos, enquanto em 2021 foram aplicadas 44 medidas de acolhimento numa família (mostrando algum fôlego relativamente às 23 medidas em 2020, com a pandemia) em 2022 esse número volta a cair para 27 medidas desse tipo.

Se em 2020, tinham sido decididas 562 medidas de acolhimento em instituição, esse número retomou a curva ascendente subindo para 603 (em 2021) e para 735 (em 2022). "Assistimos a uma alteração da tendência", nota o relatório, salientando o acréscimo em termos absolutos com mais 132 medidas de acolhimento e os 5,4% do total a representar "o valor mais alto dos últimos anos".

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