Padrões trippy, arabescos e signos: eles fazem tatuagens da calçada portuguesa

Projecto para destacar e preservar a calçada artística que cobre boa parte de Lisboa avança nesta terça-feira. O “Mar Largo” do Rossio, entre muitas outras obras, pode ser tatuado.

Foto
Sereia tatuada por Tiago Caetano, da Mastershot Tiago Caetano (Mastershot)

Chama-se Lx-Tattoos. Envolve a Publicis, grupo de comunicação, a Unidade de Coordenação Territorial da Câmara Municipal de Lisboa (UCT-CML), a Associação da Calçada Portuguesa e um grupo de tatuadores que, a partir desta terça-feira, permite que a velhinha e bela calçada artística salte do chão para a tua pele.

A preservação desta arte é o principal objectivo, revelou ao PÚBLICO Rui Matos, historiador de arte e membro da unidade do centro histórico da UCT-CML: “É também fundamental para fazer chegar a calçada artística portuguesa a novos públicos. Dar a conhecer uma arte que foi classificada como Património Cultural Imaterial pela Direcção-Geral do Património.”

Rui Matos diz que quando a Publicis Group, empresa que criou e desenvolveu o projecto, avançou com a proposta ficou “desconfiado”. “Calçada Portuguesa e tatuagens pareciam não ligar bem. Mas o projecto revelou ser de uma enorme qualidade e seriedade. Transformou-se num projecto brilhante e muito bem concebido que não me deixa hoje dúvidas de que vai contribuir para divulgar e preservar este património importantíssimo”, afirma.

Estima-se que a primeira obra de pedras de calcário preto e branco tenha sido instalada no Rossio em 1848/49, embora por essa altura já tivessem também sido identificados registos no Castelo de São Jorge.

Chico Noras
Chico Noras
Chico Noras
Chico Noras
Fotogaleria
Chico Noras

As largas ondas denominadas “Mar Largo” do Rossio é um dos desenhos que podem passar do chão para a pele de quem o deseje, em pequenos ou grandes formatos. Mas também se pode optar pelos arabescos nos Restauradores ou os signos do zodíaco na Praça do Império, entre muitos outros.

“É um projecto que visa valorizar um dos símbolos máximos da capital, deixando ‘marcas’ nos lisboetas e em todos os que se apaixonam pela cidade. Já fizemos algumas tatuagens experimentais, mas o projecto só arranca amanhã [nesta terça-feira]. Quem desejar fazer uma tatuagem só tem de ir ao site do projecto, clicar no artista cuja obra deseja tatuar e marcar”, contou ao PÚBLICO Steve Colmar, director criativo da Publicis.

Segundo Colmar, o projecto “não tem qualquer benefício financeiro para a CML”, mas “o trabalho e a criatividade dos artistas tem de ser pago”, estimando que, em média, cada tatuagem “deve rondar os 100 euros”.

O projecto teve início há seis meses e os desenhos estão reunidos num portfólio único, impressos em papel, e servem como molde para “assentamento” da calçada na pele. Segundo Steve Colmar, é a “primeira de várias iniciativas que vão decorrer ao longo do ano” no sentido de divulgar e contribuir para a preservação da calçada artística portuguesa.

Mas este pavimento, especialmente a calçada sem desenhos artísticos, tem sido substituído, em muito pontos da cidade, por cimentos ou lajes. “Esse não é o caminho. Pode haver um misto de calcário com outros materiais, como aconteceu no Chiado. Agora, acabar com a calçada, que embeleza a cidade, não é o caminho”, diz Rui Matos.

Foto
Edgar Meira
Foto
Chico Noras

Até porque, “se o calcetamento for bem feito, contribui para a sustentabilidade do meio ambiente como nenhum outro material que se use”, diz. “Se o trabalho for feito de forma tradicional, a calçada é o único pavimento citadino que permite que a água da chuva penetre na terra. Por outro lado, se for necessário abrir um buraco por qualquer razão, é fácil de tirar e voltar a colocar sem deixar marcas. Por vezes, a calçada é escorregadia, mas as outras também são”, acrescenta o historiador.

O membro da unidade do centro histórico da UCT-CML diz ver um futuro “risonho mas difícil” para a calçada artística portuguesa. “Difícil porque é uma profissão com gente envelhecida e não se vê jovens com interesse nesta arte. Talvez também por isso este projecto seja tão importante”, acrescenta.

Segundo os responsáveis pela Publicis Group, o Lx-Tattoos envolve cinco estúdios e seis tatuadores: Dave Santos, Douglas Cardoso, Gonçalo Santos, Igor Gama, Inês Gonçalves e Miguel Brum.

Como dizem os autores do projecto, “se a cidade te deixou marcas, marque-as na tua pele”. Agora já podes.

Sugerir correcção
Comentar