Vamos ser amigos?

Li um texto do Bruno Nogueira em que o mesmo dizia que fazia todos os anos uma lista de convidados para a sua festa de aniversário. Um exame de consciência de quem ficou, quem foi e quem chegou.

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Megafone P3: Vamos ser amigos? William Fortunato/Pexels

Há uns dias, uma pessoa amiga disse-me: “fico muito feliz por nos termos conhecido, nesta idade é menos fácil fazer amigos”. Foi, provavelmente, das frases mais inesperadas que já ouvi. Tentei rebater com o facto de a amizade não ter idade e de não haver um prazo em quaisquer relações. Muito tranquila, esta pessoa disse-me de volta: “é tudo verdade e nem na meia-idade estamos, mas também é verdade que a maior parte das pessoas conhece-se em muito tenra idade e depois são as redes que daí resultam”.

Debatemos saudavelmente este tema, mas num contexto de pós-pandemia em que ainda ressoam as estatísticas sobre a solidão em Portugal, que afecta pessoas cada vez mais jovens, esta crónica é para que não nos poupemos a encontrar pertença e amizade.

Todos nós, humanos, temos necessidade de pertença. A pertença (psicológica) refere-se ao sentimento de conexão, identificação/ identidade; de percepcionar que o outro nos vê e aceita. Isto é válido para relações de um-para-um ou em grupos e comunidades. Podemos sentir pertença em vários contextos, com várias pessoas, sem que estas dinâmicas se invalidem entre elas. Em suma, é algo mais do que partilhar um espaço físico, é a pessoa sentir-se parte, alimentar o sentimento de conexão e integração e, acreditem, é um dos grandes motores na saúde mental e emocional.

Isto é importante quando pensamos no papel da amizade na nossa vida. Trata-se de um vínculo que se estabelece entre duas pessoas com base em interesses, afinidades, valores e expectativas comuns, com a certeza de que podemos ver no outro um relacionamento de companheirismo, lealdade, respeito, empatia e apoio para caminhar na jornada da vida.

Embora vejamos que as amizades são quase transcendentais na infância ou adolescência, a verdade é que na primeira há um conjunto de brincadeiras, aprendizagens escolares e muito tempo comum que nos faz querer formar laços; já na segunda, é essencialmente porque as pessoas adolescentes estão a passar por uma fase de transição em que o apoio emocional está em evidência.

Todavia, a amizade é mesmo um vínculo que se pode desenvolver ao longo de toda a vida. Por exemplo: pessoas que se conhecem na faculdade, no trabalho, numa associação, num desporto colectivo ou mesmo numa universidade sénior. Universalmente, é essencial a partilha de visões comuns do mundo e, por vezes, estarmos numa fase de transição em que a pertença é o nosso mecanismo de segurança. Em todas as fases e amizades, há uma pergunta que guia a reflexão: “E quem são estas pessoas?”.

A este propósito, li um texto do Bruno Nogueira em que o mesmo dizia que fazia todos os anos uma lista de convidados para a sua festa de aniversário, guardando-a a seguir. Era uma espécie de exame de consciência de quem ficou, quem foi e quem chegou à sua vida. Neste brilhante texto, com humor, somos convidados a considerar a amizade como uma dinâmica em que há pessoas que se mantêm, umas que chegam e outras que partem por diversas razões. Tudo isto alerta-nos para o exercício central da amizade: saber se sentimos pertença, se temos (ou continuamos a ter) algo em comum; se ainda partilhamos conexão para que seja uma festa e alegria estar com a outra pessoa.

Se tudo isto não é suficiente, podemos ainda pensar que a amizade ajuda-nos a ter perspectiva do mundo; a aprender ferramentas e competências sociais com o outro. Sobretudo, a entender que não somos apenas um conjunto de características isoladas, mas sim uma incrível dinâmica de pertença e aprendizagem nos diversos desafios que vamos encontrando.

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