Chorar depois do orgasmo ou não querer fazer sexo. É normal? É, responde este livro
À venda a partir de 20 de Março, o livro da psicóloga Leonor de Oliveira responde a questões acerca da sexualidade. “É normal?”, perguntam-lhe várias vezes. E normalmente a resposta é sim.
É correto considerar-me assexual se me sinto assim depois de um trauma? Ou será algo temporário?
Às vezes, as nossas experiências mudam-nos a níveis muito profundos, mas nem sempre são mudanças permanentes. Considerando que esta "assexualidade" é consequência de uma experiência traumática, diria que é contextual e não uma tendência assexual a priori (lembrar que a assexualidade é uma orientação sexual e, portanto, relativamente estável). Este tipo de sentimento é muito comum em sobreviventes de trauma sexual. É uma adaptação perfeitamente expectável a um evento sexual profundamente negativo… é difícil desejar algo que nos feriu emocional ou fisicamente. No entanto, se já passaram várias semanas ou meses e este sentimento persiste, o mais indicado será procurar ajuda psicológica para garantir que esta experiência não causa mais sofrimento nem impede uma sexualidade plena.
A pessoa com quem estou tem dificuldades em manter a ereção. Será só psicológico? Como posso ajudar?
Os problemas de ereção em pessoas jovens têm frequentemente causas emocionais/cognitivas e não orgânicas. Uma forma de saber se é um problema orgânico ou não é verificar se há ereções espontâneas ao acordar, por exemplo, ou se a falta de ereção se mantém durante a masturbação. Se for situacional é, provavelmente, «psicológico». Coloquei entre aspas porque temos a tendência a desvalorizar problemas psicológicos, como se fossem menos reais, e não é nesse sentido que uso o termo. Normalmente, a ereção melhora quando o foco da atividade não é a penetração. Portanto, caso haja problemas de ereção, a solução pode passar por desgenitalizar o prazer, tranquilizando a pessoa de que obtemos prazer de outras formas. Além disso, continua sempre a ser possível desfrutar de penetração usando os dedos ou brinquedos sexuais, caso não haja ereção. A verdade é que não conseguimos estar sempre com ereção e, mesmo que conseguíssemos, fazer sempre tudo da mesma maneira pode tornar-se aborrecido. As dificuldades de ereção, como outros desafios, podem ser uma oportunidade para expandir o repertório de prazer.
Sinto que só tenho vontade de fazer sexo 2/3 vezes por mês. É normal?
Sim. Há grande variabilidade de desejo sexual entre pessoas e ao longo da vida. Não só somos diferentes entre nós como há uma série de fatores contextuais que podem afetar o nosso desejo. A frequência com que desejamos ter relações sexuais só costuma tornar-se problemática quando estamos com alguém que deseja fazer sexo com uma frequência diferente. Curiosamente, o que a investigação tem mostrado é que quem faz sexo com mais frequência não sente necessariamente mais satisfação. É verdade que, no geral, fazer sexo com mais regularidade leva a maior satisfação sexual, mas a satisfação não aumenta, em média, se fizermos sexo mais de uma vez por semana. Isto não quer dizer que todas as pessoas que fazem sexo uma vez por semana estejam satisfeitas, mas, em termos médios, a satisfação não aumenta de forma significativa se fizerem sexo 2/3 por semana. Claro que estamos a falar de estatística, o que significa que apagamos a experiência de muitas pessoas. Por isso mesmo, o que importa é se a pessoa em questão está satisfeita com a frequência com que faz sexo que, independentemente disso, é normal.
Tenho vaginal farts e, quando estou acompanhada, não consigo vir-me porque tenho vergonha. Só sozinha. Help!
Os flatos vaginais, ou queefing, são fenómenos normais que ocorrem quando o ar é forçado para o interior da vagina, como quando há sexo penetrativo, e é depois expulso devido à contração natural dos músculos da parede vaginal. Há quem lhe chame vento vaginal, o que eu, pessoalmente, considero muito poético, e há quem prefira jargão mais complexo, como a "passagem auditiva de ar vaginal", que atinge até 69% das pessoas com vulva, de acordo com um estudo. Isto tudo para dizer que, quer se aplique a "puns" vaginais, quer a outra qualquer expressão da sexualidade, é importante pacificarmo-nos com as nossas manifestações corporais de excitação e prazer. Percebo, evidentemente, que estas manifestações ruidosas possam ser inconvenientes e stressantes. Se for o caso, optar por posições que não forcem tanto ar para o interior da vagina, nomeadamente aquelas em que os corpos estão mais juntos ou em que há menos vaivém do pénis no exterior da vagina, pode ajudar.
Conselhos para relaxar durante o sexo anal? Nem sempre é fácil, o que o torna doloroso.
Talvez o primeiro passo seja tentar localizar a origem da nossa tensão. Tem a ver com o facto de anteciparmos dor ou de que não seja limpo, ou com algum julgamento moral da prática? Em qualquer dos casos, vai ser importante discutir as nossas preocupações com a outra pessoa, para que ajude a conter os nossos medos e para que negociemos formas de nos sentirmos em segurança. Sermos vulneráveis vai aumentar a confiança e conforto na relação, essencial para realizar uma prática que nos deixa hesitantes. Além disso, talvez precisemos de tempo e treino. Antes de considerarmos a penetração com um pénis ou dildo, talvez possamos antes começar por fazer a penetração com dedos, ou com dilatadores, ou beads anais, que possibilitam inserções progressivamente maiores. Além disso, idealmente, o sexo anal deve ocorrer num momento de grande excitação sexual e com lubrificação abundante, de preferência de silicone, que não evapora, já que o ânus não lubrifica naturalmente. Estas são sugestões que podem ajudar a ter mais perceção de controlo sobre a situação e ajudar a que relaxemos e desfrutemos.
Muitas vezes, quando tenho orgasmo, choro. Como resolver esta questão?
Chorar é uma das muitas reações normais pós-orgasmo. Há quem tenha ataques de riso, por exemplo, e também é normal. O orgasmo pode ser uma experiência de descarga tão poderosa que nos leva às lágrimas. Não implica que tenhamos alguma coisa a resolver e, sim, que nos permitimos sentir emoções e sensações com grande intensidade. A verdade é que as expressões físicas pós-orgasmo são múltiplas e não sabemos exatamente o que significam — o que não quer dizer que haja algo de errado connosco.
Como dizer à minha companheira que gostava de iniciar a prática de pegging? Tenho medo que ache que sou gay.
É possível que as fantasias sexuais que comprometem as noções de género tradicionais sejam as que causem mais apreensão ou medo. Há razões legítimas para isto, uma vez que, afinal, vivemos numa sociedade em que abunda a masculinidade tóxica e em que estigmatizamos minorias, mas não quer dizer que não sejam comuns. Afinal, não só a estimulação anal pode dar muito prazer como desvirtuar os papéis tradicionais de género pode ser extremamente empoderador. Trazer um comportamento sexual novo para uma relação pode, por vezes, parecer-nos que vai pôr a relação em risco — e às vezes põe: ou porque levanta questões morais à nossa companheira, ou porque é tão importante para nós que não suportamos a ideia de não a concretizar. Podemos tentar antecipar possíveis reações da outra parte quando comunicamos os nossos desejos, treinar mentalmente o que vamos dizer e, mesmo assim, fugir do nosso controlo. Se a nossa companheira apresentar relutância, é importante perceber porquê e, caso esteja a sentir-se ameaçada, garantir-lhe que o nosso desejo é de pôr em prática uma fantasia sexual com ela, especificamente. No fundo, é explicar que desejamos um tipo de estímulo diferente, experimentar outro papel, ou o que quer que nos excite no pegging. Explicar que não significa que fantasiemos com homens, ou, se assim for, que o queiramos concretizar ou, tão pouco, que sejamos gays — se tudo isto for verdade, claro.
A autora escreve segundo o novo acordo ortográfico.