Com os refugiados não devíamos perder a oportunidade de fazer melhor e diferente
Será o número de refugiados o suficiente para que a exigência de um excelente desempenho e do desenvolvimento em áreas específicas seja suficiente para mudar os nossos padrões de desempenho?
Já fez um ano que a guerra na Ucrânia começou. Há um ano, estávamos à procura de tudo, e todos nos envolvemos em situações de colaboração e de prestação de algum tipo de apoio aos refugiados que chegavam ou que “era preciso” ir buscar. Os professores de Português disponibilizavam os seus serviços para que a língua não fosse mais uma barreira; psicólogos e técnicos de acção social estavam na linha da frente.
Passado um ano, já a maioria de nós ouve as notícias da guerra com relativa despreocupação e este tema já não abre telejornais. Entrámos na banalização das notícias sobre a guerra, nos avanços e recuos de ucranianos e russos, mais a posição da Europa e dos Estados Unidos, da China e da Turquia.
Com as famílias refugiadas que acolhemos naquela altura e com mais alguns deslocados russos que vão chegando, como temos conseguido acolher as crianças em idade escolar e os adultos que vêm com estas crianças? Como têm conseguido as escolas e a sociedade em geral integrar estas pessoas?
Algumas crianças estão na escola pública, outras na privada e outras com programas do seu país de origem em aulas online. As crianças adaptam-se com relativa facilidade e mesmo quando nem sequer o inglês é uma língua comum, outro tipo de linguagem surge até a comunicação conseguir estabelecer um código de referência. Essa linguagem pode ser outra língua, uma pessoa que sirva de interlocutor, um código misturado de outra língua, gestos e tudo o mais que se conseguir.
Naquela altura, vinham por uns meses; nesta altura, esse horizonte temporal alargou-se e não há prazo definido para voltar.
A aculturação acontece, a integração faz-se todos os dias, o desespero acomodou-se e aquilo que iria servir deixou de acontecer, para voltar a haver ambição e padrões valorativos.
Quero dizer com isto, que em termos de educação os países do Leste da Europa têm um padrão de elevada exigência. Para aqueles que vieram e estão a querer reconstruir a vida, numa perspectiva de futuro e de continuidade, importam determinados requisitos e padrões de qualidade, onde não é menos importante a religião.
Assim, para alguns, a nossa escola pública, com as sucessivas greves e tempos de inoperacionalidade, não serve. A inexistência no currículo de ensino da música de forma exigente e progressiva pode ser colmatada com a frequência de uma escola de música propriamente dita, com clara evidência para a aprendizagem de pelo menos um instrumento.
O sentido de urgência dos primeiros tempos de guerra, nas várias vertentes, já não se faz sentir. Recebemos refugiados e deslocados, prestámos acolhimento e disponibilizámos serviços. Na educação, tal como em outros domínios, a abertura a novas culturas faz com que também a nossa se enriqueça com as diferenças que para quem chega são as mais importantes e necessárias encontrar e, para nós, quem recebe, são demandas a prestar.
Quando as necessidades destas pessoas são implementadas, passamos todos a usufruir das mesmas. Será o número de refugiados e deslocados de guerra grande o suficiente para que a exigência de um excelente desempenho e do desenvolvimento em áreas específicas seja suficiente para mudar os nossos padrões habituais de desempenho?
Não há sinais de que estejamos a ter este sentido de exigência com a aprendizagem e mais ainda com a aprendizagem integral, ou seja, o mais completa possível. Todos os que frequentam a escola pública percebem que a prioridade tem sido a luta pela carreira docente, com a associação também dos não docentes.
O embate de dois anos de pandemia e com mais um ano de luta que se concretiza em greves sucessivas tem um impacto muito significativo no ensino e muito na aprendizagem e no bom desempenho dos alunos.
Aquilo para o qual todos nos esforçámos no início da guerra, como sendo passageiro e que se tem vindo a passar cada vez mais como definitivo, não tem havido tempo nem disponibilidade para observar, pensar, reflectir e fazer impactar no nosso sistema de ensino aquilo que de bom podíamos aprender com estas pessoas que acolhemos e temos vindo a acolher.
Parece que a oportunidade de fazer evoluir o nosso sistema de forma mais exigente e capaz, no momento de saída da escolaridade, está a escorregar por entre os dedos, pela banalização da situação de guerra na Ucrânia e pelo foco nas reivindicações sobre e para a carreira docente. Haja oportunidades!