Na Turquia e na Síria, os resgates estão “a chegar ao fim”
Uma semana depois, as operações de salvamento ainda não acabaram, mas cada vida encontrada é um “milagre”. Para a ONU, agora é tempo de cuidar dos vivos.
Há uma semana, um sismo fez o mundo voltar-se para a Síria e a Turquia. Debaixo dos escombros, à medida que as horas passam, torna-se mais difícil resistir ao tempo e às condições climatéricas. O subsecretário-geral para assuntos humanitários da ONU, Martin Griffiths, disse esta segunda-feira que a fase dos resgates está “a chegar ao fim”. Mas, quase 200 horas depois do abalo inicial, ainda há pessoas a ser encontradas com vida, há vozes que ultrapassam as pedras e a esperança ainda não acabou. Podem ser mais de 100 mil as pessoas perdidas debaixo dos escombros.
Para as Nações Unidas, a prioridade deve passar a ser o abrigo, a alimentação e o apoio psicológico dos sobreviventes. O terramoto ceifou as vidas de famílias inteiras e deixou muitos ao abandono. Segundo o Ministério da Família e Serviços Sociais turco, há 263 crianças cuja família está incontactável.
Nas primeiras horas após o abalo inicial, a ONU dizia que o número de vítimas mortais podia atingir os 20 mil. Esta segunda-feira, o número de mortes subiu para quase 33 mil, mas as histórias de resgates continuam a circular.
Sobreviver é uma combinação de factores
Para sobreviver tantas horas é necessária uma conjunção de factores, disseram especialistas à Al Jazeera. Primeiro, ter algum espaço para o corpo não ser esmagado e conseguir respirar. Quando essa parte está assegurada, é uma questão de hidratação – já foram vários os relatos de pessoas que sobreviveram por beberem água suja que lhes escorria até à boca. Depois, é preciso esperança e resiliência. Segundo o The Guardian, vários peritos dizem que após cinco dias a taxa de sobreviventes presos cai para os 6%.
Esta segunda-feira, uma mulher foi salva depois de 17 horas de buscas. Um bombeiro que fazia parte da equipa de resgate falou, à BBC Radio Wales, de uma força “sem igual”. Em Adiyaman, na Turquia, uma menina de seis anos foi encontrada com vida 178 horas após o abalo inicial. Na mesma altura, uma mulher de 70 anos foi resgatada, em Hatay: ao ver a mãe a ser salva contra todas as probabilidades, o filho, cá fora, festejava com os olhos postos no céu.
Três metros abaixo do chão, em Kahramanmaras, também na Turquia, há três gerações de uma família presas, sem comida e sem água há sete dias: uma avó, uma mãe, uma bebé e, possivelmente, uma quarta pessoa noutra divisão. Ainda não fizeram qualquer barulho, mas as câmaras térmicas garantem que há vida ali. É “um milagre”, nas palavras da líder da equipa de saúde voluntária turca. Parecem estar em bom estado e as equipas de resgate fazem tudo para as alcançar, apesar de uma coluna estar a dificultar a operação.
No epicentro de uma das réplicas, Elbistan, na Turquia, o frio torna a sobrevivência ainda mais difícil. Quem ficou, vai tentando recuperar o que resta da vida antes do sismo e alguma comida para conseguir subsistir. Por ali, vários residentes gravam em vídeo o que resta “para memória”, disse um homem à Reuters.
Em Hatay, no sábado, foi encontrado um bebé de sete meses com vida. As imagens dos momentos após o resgate mostram membros da equipa de salvamento abraçados e a festejar. É uma das províncias turcas mais afectadas pelos acontecimentos da última semana. Em declarações prestadas esta segunda-feira à agência de notícias espanhola Efe, o presidente da União das Ordens dos Arquitectos e Engenheiros da Turquia, Emin Koramaz, acusou o Governo de permitir a construção de edifícios “sem respeitar os regulamentos de construção”. Deu o exemplo de oito prédios construídos e habitados sem as devidas licenças.
Em 2018, o Presidente turco, Tayyip Erdogan, fez campanha para as eleições presidenciais em várias zonas agora abaladas pelo sismo. Alegava que os problemas habitacionais tinham sido resolvidos. O Conselho da Cidade de Istambul apontou para cerca de 300.000 edifícios legalizados em 2018 nas dez províncias mais afectadas.
O sismo, que atingiu uma magnitude de 7.8, devastou várias cidades. Após uma semana, a esperança de encontrar vida começa a cessar. “O trauma das pessoas com quem falamos é visível e é um trauma que deve ser curado pelo mundo”, afirmou Martin Griffiths.
Texto editado por Pedro Rios