Deputados consideram cenário europeu desanimador para encontrar solução nos metadados
Tendo em conta que a nível europeu não foi encontrada qualquer "solução imediata" para ultrapassar a inconstitucionalidade sobre o acesso a metadados para investigação criminal, os deputados do grupo de trabalho admitem que o "panorama não é animador" para encontrar uma solução em Portugal.
Na reunião do grupo de trabalho sobre metadados desta quarta-feira, os deputados apreciaram uma compilação de direito comparado elaborada pela Divisão de Informação Legislativa Parlamentar, que analisou as soluções encontradas por 12 países europeus para ultrapassar a decisão do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), que considerou inválida uma directiva europeia sobre conservação de metadados.
O deputado do PS Pedro Delgado Alves mostrou-se "pessimista" com os exemplos dos 12 países, considerando que "mesmo os modelos mais apelativos" correm o risco "de poder vir a enfrentar uma tomada de posição" de invalidade por parte do TJUE. O socialista considerou que, apesar de alguns países terem encontrado soluções para resolver "problemas parcelares" - designadamente "como conservar e onde" os metadados - a "magna questão dos prazos e da finalidade" continua por resolver.
Perante este cenário, Pedro Delgado Alves questionou se, "sem descurar a jurisprudência" do TJUE, o grupo de trabalho não deveria antes ter como prioridade desenvolver uma legislação que tivesse "compatibilidade completa com a ordem jurídica nacional". O deputado socialista mencionou o caso da jovem de 17 anos que esteve desaparecida durante oito meses e foi recentemente encontrada em Évora, sendo que o Ministério Público demorou seis meses a poder aceder aos dados de localização do telemóvel da jovem, depois de uma juíza ter recusado esse acesso com base na lei dos metadados.
Para o deputado do PS, o caso em questão mostra os riscos de se arrastar o processo legislativo sobre metadados, porque pode pôr em causa casos em que não há "margem para dúvidas" sobre a legalidade do acesso aos dados em questão.
"Tardarmos muito tempo a aguardar pelo fecho da revisão constitucional ou pelo desfecho deste debate europeu corre o risco de dar sinais para os aplicadores de direitos de que tudo o que envolve metadados de alguma maneira estava contaminado com estas decisões, e era importante que, pelo menos isso, também ficasse claro que não é assim", disse.
A deputada do PSD Mónica Quintela também considerou que, após a leitura da compilação de direito comparado, o "panorama não é animador", salientando que, tanto no caso de Espanha como de Itália, não "foi feito nada". "Não vemos aqui grandes soluções, bem pelo contrário: a Alemanha está num impasse, a Áustria a mesma coisa... No actual estado da arte, também em termos de direitos comparado, não temos uma solução imediata", referiu.
Perante este cenário, a deputada social-democrata considerou que "o caminho vai ter que se fazer em conjunto e necessariamente de uma forma supranacional" e salientou que, mais do que o período de tempo ou o local onde os dados podem ser conservados, os deputados vão ter "mais dificuldades" com o "público-alvo que vai ser objecto dessa conservação".
O deputado do Chega Rui Paulo Sousa também convergiu com o PS e PSD, salientando que, mesmo no caso da Irlanda, que já procedeu a alterações na lei dos metadados após a decisão do TJUE, a "entidade oficial de salvaguarda de direitos civis" já veio "apontar fragilidades" à nova lei.
"O que nos leva realmente à questão que se calhar ainda não existe uma solução concreta praticamente em nenhum país da União Europeia", salientou.
Rui Paulo Sousa também abordou o caso da jovem de 17 anos que esteve desaparecida, salientando que a juíza decidiu "erradamente ao não fornecer os dados", o que mostra que a actual discussão sobre metadados pode levar "a uma situação muito crítica". "Estamos a falar de algo muito concreto e que pode, em determinadas situações, ser considerado de vida ou de morte", referiu.
Por sua vez, o deputado do Bloco de Esquerda (BE) Pedro Filipe Soares referiu que o seu partido disse "desde o início" que o problema central da questão dos metadados "advinha da relação entre a Constituição portuguesa e Carta de Direitos da União Europeia", não existindo "nenhuma solução que conseguisse acautelar os direitos dos cidadãos individuais e as pretensões de vigilância que estavam em cima da mesa".
Abordando o caso da jovem de 17 anos, também o deputado do BE considerou que o caso comprova que o debate sobre metadados "ficou muito intoxicado". "O caso referido desta decisão de tribunal não tem nada a ver com as alterações legais que estão em curso. A lei prevê, porque estamos a falar de defesa da própria vítima, o acesso a todos os meios (...) e, por isso, esta intoxicação do debate é algo negativo e, se o grupo de trabalho conseguisse ultrapassar ou ajudar pelo menos a resolver, já seria uma grande vitória", salientou.