Há mais três “democracias plenas” no mundo e Portugal não é uma delas

Rússia e China são dois países com regressões preocupantes em termos democráticos. “A Rússia registou a maior queda de pontuação de qualquer país no mundo em 2022”, lê-se no Índice de Democracia 2022.

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A qualidade da democracia em Portugal estagnou Daniel Rocha

O ano de 2020 foi mau para a democracia portuguesa, com a pandemia, os estados de emergência e as restrições às liberdades a contribuírem para que Portugal se tornasse uma "democracia com falhas", e, desde então, nada melhorou. Em 2021, o país não conseguiu regressar à categoria de "democracia plena", na qual estava em 2019, e em 2022 também não evoluiu positivamente, mantendo a mesma posição no ranking divulgado anualmente, desde 2006, pela revista The Economist (Democracy Index 2022).

O Índice de Democracia 2022 atribui a Portugal uma pontuação global de 7,95 (em 10), o que significa que continua no 28.º lugar na classificação geral e em 16.º na regional. Em alguns aspectos avaliados, Portugal consegue obter óptimos resultados (9,58 no processo eleitoral e no pluralismo e 9,12 nas liberdades civis), mas noutros, como a participação política (6,67) e a cultura política (6,88), tem muita margem para evolução.

O índice relativo a 2020 dava algumas explicações sobre o que então levou à “despromoção” de Portugal — os sucessivos confinamentos, a reposição de fronteiras, a redução dos debates parlamentares ou a nomeação do presidente do Tribunal de Contas —, mas no relatório agora divulgado o país não merece nenhuma referência mais concreta além da sua posição no ranking, o que pode ser explicado pelo facto de não ter havido oscilação nos valores apresentados. Bélgica, Chipre, Grécia, Itália e Malta são outros países europeus considerados "democracias com falhas". Já fora da Europa, os EUA são o exemplo mais importante.

Os efeitos da guerra

Este ano, o relatório da Economist Intelligence Unit centra-se nos efeitos da guerra e tem como subtítulo a expressão: “Democracia de primeira linha e a batalha pela Ucrânia”. Apesar disso, conclui que o número de "democracias plenas" aumentou de 21 (em 2021) para 24 (em 2022) com a Espanha, a França e o Chile a regressarem a esta categoria, na qual só têm lugar os países que atingem mais de 8 pontos, num total de 10, na avaliação. Já o número de “democracias imperfeitas” ou "democracias com falhas" perdeu cinco países, descendo para 48 em 2022. Os “regimes autoritários” não aumentaram nem diminuíram (continuam a ser 59) e os “regimes híbridos” passaram a 36, quando eram 34 no ano anterior. Feitas as contas, dos 167 países e territórios cobertos pelo modelo, 72 podem ser considerados democracias (o que corresponde a 43,1% do total).

"No geral, a história é de estagnação, com a pontuação média global permanecendo essencialmente inalterada em 5,29 (em uma escala de 0 a 10), em comparação com 5,28 em 2021. Este é um resultado desanimador, visto que em 2022 o mundo começou a superar a supressão das liberdades individuais relacionada com a pandemia, que persistia desde 2020. (...) Este quadro de estagnação no estado da democracia global esconde desenvolvimentos mais sombrios", lê-se nas páginas iniciais do relatório que faz referência à "situação em dois países que abrigam mais de 20% da população mundial, China e Rússia", para concluir que houve uma guinada decisiva para pior em 2022.

"A Rússia registou a maior queda de pontuação de qualquer país no mundo em 2022. A invasão da Ucrânia foi acompanhada por repressão e censura total em casa. A Rússia está numa trajectória de afastamento da democracia há muito tempo e agora está a adquirir muitas das características de uma ditadura", acrescenta o documento. Sobre a China e sua política de covid-zero (que entretanto foi abandonada), o relatório chama a atenção para "os métodos mais draconianos para impedir a propagação do vírus", para a prisão de "dezenas de milhões de pessoas por períodos prolongados" e para a "abordagem repressiva do Estado a todas as manifestações de dissidência" que tiveram como resultado "um declínio adicional na pontuação já baixa da China no Índice de Democracia em 2022".

A ascensão da direita, embora preocupante, não é considerada neste relatório como prejudicial à democracia. "As recentes eleições na Europa Ocidental levaram partidos de direita ao Governo, principalmente em Itália e Suécia. A representação de partidos de direita como o Democratas Suecos ou o Fratelli d'Italia no Parlamento e no Governo não é necessariamente prejudicial à democracia; de facto, a exclusão de tais partidos quando eles têm o apoio de grandes sectores do eleitorado poderia ser interpretada como antidemocrática", lê-se no relatório.

Apesar disso, o índice reconhece que a longo prazo há "preocupações justificáveis" com a possibilidade de os "partidos de extrema-direita minarem a democracia promovendo a intolerância, aprovando legislação iliberal ou censurando os meios de comunicação social".

Na lista de países ou territórios cujas democracias tiveram melhor desempenho estão a Tailândia, Angola, Nigéria, Montenegro, Grécia, Islândia, Sri Lanka, Albânia, Chile e Camboja. Isso não significa, contudo, que todos eles tenham subido de categoria. Algumas, como é o caso de Angola ou da Nigéria, mantêm-se no grupo dos "regimes autoritários". Já no top 10 dos países ou territórios que se tornaram menos democráticos estão Rússia, Burkina Faso, oHaiti, El Salvador, Tunísia, Bielorrússia, Iraque, Jordânia, México e Hong Kong.

Com base na pontuação total, os países são classificados como um de quatro tipos de regime: democracia plena (pontuações superiores a 8), democracia imperfeita ou com falhas (pontuações superiores a 6), regime híbrido (pontuações superiores a 4) e regime autoritário (pontuações inferiores ou iguais a 4).

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