Greve nas escolas dá falta justificada para ficar com os filhos?
As principais estruturas sindicais que representam os professores e os auxiliares das escolas entregaram pré-avisos de greve que se estendem pelo mês de Janeiro e início de Fevereiro.
O descontentamento dos professores e dos outros profissionais da educação terá reflexos em muitas escolas que, durante o mês de Janeiro e início de Fevereiro, poderão funcionar com perturbações e, em alguns dias, encerrar por causa da greve. Sem alternativa onde deixar os filhos, muitos pais são obrigados a faltar ao trabalho.
Os pais que faltam ao trabalho para darem assistência aos filhos em caso de greve e encerramento das escolas estão protegidos pela lei e têm a falta justificada?
Não. O artigo 249.º do Código do Trabalho tem uma lista das faltas que são consideradas justificadas e a greve escolar não se enquadra em nenhuma delas.
Mas o Código do Trabalho prevê que o trabalhador pode faltar ao trabalho para prestar assistência inadiável e imprescindível a filho menor de 12 anos ou, independentemente da idade, a filho com deficiência ou doença crónica. As faltas dadas por motivo de greve escolar não podem aqui ser incluídas?
Como explica Ana Gradiz Correia, advogada no escritório Gómez, Acebo & Pombo, no que aos filhos diz respeito, as únicas faltas consideradas obrigatoriamente justificadas são as que se relacionam com a prestação de assistência inadiável e imprescindível em caso de doença ou acidente.
Assim, acrescenta Ricardo Lourenço da Silva, advogado da Antas da Cunha ECIJA, “ao abrigo do Código do Trabalho e numa interpretação literal” as faltas relacionadas com os filhos obrigatoriamente justificadas são apenas estas.
Não há margem para uma interpretação mais abrangente da lei?
A opinião dos juristas não é unânime. Há quem entenda que, apesar de a lei não prever a falta ao trabalho por greve escolar, ela deve ser justificada porque os pais têm a obrigação legal de cuidar dos filhos. Mas também há quem considere que cabe ao empregador decidir se justifica ou não a falta.
Para Ricardo Lourenço da Silva, “pode haver faltas justificadas por motivos atendíveis e este seria, em tese, um desses motivos, se o trabalhador conseguir demonstrar que a ausência de um pai ou mãe no trabalho se deveu ao facto de a escola do filho estar encerrada por greve”.
“A situação afasta-se do quadro geral expressamente previsto no Código do Trabalho, mas, tendo os pais a obrigação legal de cuidar dos filhos, vejo com dificuldades que, nestes casos, a falta não seja justificada por necessidade inadiável de prestar apoio ao filho. Sem prejuízo de considerar que a falta pode ser considerada justificada, entendo que a perda de retribuição (ou não) é uma decisão que pertence exclusivamente à entidade patronal”, frisa.
Já Ana Gradiz Correia recomenda que os pais peçam na escola do filho um documento que ateste a greve e que o entreguem na empresa, “ficando na livre disponibilidade da entidade empregadora considerar ou não justificada a falta”.
Como devem proceder os pais que se vêem obrigados a faltar porque a escola fechou?
Na perspectiva de Ricardo Lourenço da Silva, “em todas as situações que a lei não protege, como esta, será fundamental chegar a um bom entendimento com a entidade patronal”, e aconselha o trabalhador - sabendo que a greve pode afectar a escola do seu filho - a avisar com antecedência de que pode não conseguir ir trabalhar.
Além disso, os dois advogados recomendam que o trabalhador peça um comprovativo à escola em como encerrou naquele ou naqueles dias devido a greve e o entregue à entidade empregadora.
E se o empregador não aceitar a justificação?
Nessa situação, e caso entenda que a falta está devidamente justificada, o trabalhador pode fazer queixa à Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) ou, no limite, recorrer aos tribunais para tentar que a falta que deu não seja considerada injustificada, sublinha Ricardo Lourenço da Silva.
Quais são as alternativas dos trabalhadores para evitar a falta e a consequente perda de retribuição?
Os dois advogados consultados pelo PÚBLICO dão algumas sugestões. Desde logo, se a actividade que o trabalhador desempenha for compatível com o regime de teletrabalho e se estiverem reunidas as condições para o efeito, o trabalhador deve optar pela prestação de trabalho a partir da sua residência.
Não sendo possível, e se o trabalhador não tiver a quem deixar os filhos, pode pôr férias. Neste caso, recomenda Ana Gradiz Correia, deve ter a preocupação de avisar a entidade empregadora “de forma que a sua ausência cause o menor transtorno possível à empresa”.
Em alternativa, e como prevê o Código do Trabalho, o trabalhador pode evitar que a falta seja considerada injustificada e se veja privado da retribuição “se, de comum acordo com a entidade empregadora, for acordado que compensará o trabalho não prestado em qualquer outro dia da conveniência de ambos, sempre com respeito pelos limites máximos legalmente definidos”, acrescenta a advogada.