Portugal vs Suíça. Embolo e o perigo de um homem com música
Quando um jogador ganha direito a justificar uma música para si é porque tem carisma ou talento. No caso de Embolo, o maior perigo da Suíça, talvez tenha sido um pouco das duas coisas.
Há poucas coisas no futebol a darem mais prazer aos adeptos do que verem uma música para um jogador “colar” – e melhor: a ficar no ouvido. Ainda há dias, no estádio Al Janoub, ouvia alguns adeptos – que nada tinham que ver com a Irlanda do Norte – a cantarem “Will Grigg’s on fire", inspirados pela música Freed from desire”, que voltou a estar em voga em 2016, depois de ser sucesso no início do século.
Serve isto para dizer que há, na selecção da Suíça, alguém a merecer honra semelhante. E, convenhamos, com um talento bem acima do norte-irlandês Will Grigg.
Para Breel Embolo, canta-se “oh Embolo, oh Embolo”, como em “Wimoweh” (ou “Awimbawe”), no sucesso celebrizado por vários filmes de animação. Ao ver o vídeo em baixo, por sua conta e risco, aceitará a sina de cantar isto o resto do dia.
Conclusão: para Portugal, nesta terça-feira (19h, RTP1), boa parte do trabalho da selecção nacional será evitar que se leve a Lusail estas cantorias de Rei Leão – se existirem, então Embolo provavelmente estará em destaque. E isso, em abstracto, coloca Portugal mais longe dos oitavos-de-final.
Diferente de Seferovic
Breel Embolo é um dos principais perigos da Suíça. É certo que Shaqiri, Akanji e Xhaka são mais renomados, mas é do pé direito do avançado do Mónaco que deverão vir os principais problemas para a selecção nacional.
Não se espera que a Suíça assuma uma postura de controlo do jogo, em ataque posicional, pelo que a capacidade de Embolo nas transições será fundamental. Como o nome sugere, Embolo é forte quando “embala”, até pela potência que coloca no relvado quando dá aceleração a quase 1,90 metros e 90 quilos de força muscular.
E não é nada que Portugal não saiba. Em 2016, foi Embolo quem abriu o marcador na derrota com a Suíça no início da qualificação para o Mundial 2018.
O impacto a longo prazo não foi grande, que Portugal acabou por se apurar, mas passou por dificuldades desnecessárias.
Depois de muitos anos de “reinado Seferovic”, a Suíça cedeu definitivamente aos encantos de Embolo, um jogador de perfil claramente distinto do do jogador do Benfica.
Seferovic também explora a largura, mas é um jogador mais físico e de apoios do que de desequilíbrio. Com Embolo, a Suíça até pode perder no trabalho sem bola (o site Fotmob indica que está bastante atrasado no ranking de bolas recuperadas no último terço), mas ganha uma dimensão diferente no ataque ao espaço, na potência e no desequilíbrio técnico, mesmo não sendo Embolo um driblador.
Depois, o avançado é, por estes dias, uma ameaça aérea e já leva três golos de cabeça na Liga francesa – só Terrier tem mais.
E Embolo nem precisa de muitas oportunidades para marcar. O Fotmob indica-nos que o rácio entre golos marcados e golos esperados é claramente favorável ao suíço, que marca mais do que “seria suposto”, pela qualidade das oportunidades de que dispõe – é dos melhores da Liga francesa nesse domínio.
Há um detalhe que pode ajudar a selecção portuguesa. Segundo o Who Scored, Embolo é o quinto jogador da Liga francesa com mais perdas de bola por más recepções. Isto permite prever que forçar o jogador a trabalhar em espaços curtos, mais do que a “embalar” no espaço, pode colocá-lo em maiores dificuldades e tirá-lo do jogo.
Ganhou “juízo”?
Embolo chega a este Mundial num dos melhores momentos da carreira. Na Alemanha, os anos no Schalke e no Mönchengladbach nunca mostraram um grande goleador – em seis temporadas, só uma vez superou a dezena de golos.
Em 2022/23, no Mónaco, já leva oito golos, pelo que é provável que supere o seu recorde em campeonatos “big 5” – na Suíça, já chegou a marcar 17.
E estar a jogar com maior qualidade pode ser associado a dois domínios importantes. Um deles pela menor fragilidade para problemas físicos, que lhe enevoaram o talento durante alguns anos. O outro tem que ver com um aparente gosto pela tranquilidade.
Durante alguns anos, Embolo, nascido nos Camarões (marcou e não celebrou frente ao país natal, neste Mundial), fez questão de estar na berlinda, nem sempre pelos motivos que os seus treinadores, familiares e fãs desejariam.
Segundo um perfil escrito por Max Kern, do Blick, foi Embolo quem esteve quase a ser expulso do FC Nordstern, por mau comportamento, foi também Embolo quem foi apanhado a conduzir sem carta e foi o mesmo jogador que, já em período covid, foi apanhado numa festa ilegal, sem máscara.
Mas também foi Embolo quem, aos 18 anos, criou uma fundação para ajudar crianças refugiadas na Suíça e jovens com deficiência nos Camarões.
Aos 25 anos, a história de Embolo já é bastante rica, mas parece estar um pouco abaixo do que se previu há alguns anos. Marcar a Portugal e eliminar uma das favoritas ao título mundial seria mais um passo na construção de um legado mais condizente com as expectativas.