Estrela do cinema iraniano a viver no Irão publica foto sem hijab
Uma das mais importantes actrizes iranianas, Taraneh Alidoosti, promete ficar no país e defender os que protestam contra o regime. Repressão contra manifestantes já fez pelo menos 328 mortos.
Taraneh Alidoosti é uma das mais conhecidas actrizes iranianas e uma das poucas que, sendo crítica do regime, continua no Irão. Há dias, no Instagram, tinha afirmado que recusa deixar o país e que ficaria para “apoiar” as vítimas da repressão; agora, publicou uma fotografia sua sem hijab (lenço islâmico) e segurando um cartaz onde se lê “Jin, Jiyan, Azadi” (Mulher, vida, liberdade), a versão curda do slogan do movimento de contestação, na mesma rede social, onde tem 7,9 milhões de seguidores.
“Vou ficar, vou parar de trabalhar, vou apoiar as famílias dos prisioneiros e dos mortos. Vou ser a sua defensora”, disse a actriz, de 38 anos. “Eu sou aquela que fica aqui e não tenho nenhuma intenção de me ir embora”, afirmou, garantindo que não tem residências no estrangeiro nem passaporte de nenhum país para além do Irão. De acordo com o jornal online IranWire, já houve pelo menos cinco actrizes a publicarem fotografias suas sem o obrigatório hijab desde o início dos protestos que pedem o derrube do regime.
Alidoosti, mais conhecida fora do Irão pelo seu papel em O Vendedor, de Ashgar Farhadi (que venceu o Óscar para Melhor Filme Estrangeiro em 2016), fez uma primeira publicação em apoio às manifestações logo a 16 de Setembro, dia do funeral de Mahsa Amini, a jovem de 22 anos que entrara em coma pouco depois de ser detida pela “polícia da moralidade” por uso incorrecto do hijab. “Digam o nome dela, espalhem a palavra”, pedia. Após alguns dias, partilhou um vídeo onde actrizes de várias nacionalidades (incluindo as francesas Juliette Binoche e Isabelle Huppert) cortavam pedaços do cabelo em solidariedade com as iranianas – numa altura em que estas tinham começado a fazê-lo nos protestos, depois de antes terem queimado os seus hijabs.
Com a morte de Amini, para os iranianos, tudo passou a ser político e qualquer gesto ou palavra passou a ser interpretado como uma mensagem. Em Outubro, quando regressou a casa depois de ter competido sem hijab, a escaladora Elnaz Rekabi surgiu sem lenço, usando em vez disso uma camisola de capuz e por cima cima um boné – isto enquanto afirmava que a falta de hijab não tinha sido “intencional”. As autoridades tinham detido o seu irmão para a forçar a retractar-se e a própria atleta foi colocada em prisão domiciliária.
Já esta semana, Saeed Piramoun, jogador de futebol de praia, festejou um golo imitando o gesto de cortar o cabelo; não foi um golo qualquer, mas o que deu a vitória ao Irão contra a selecção do Brasil na final do Torneio Internacional dos Emirados. Antes do jogo, a equipa manteve-se em silêncio quando o hino foi tocado. “As pessoas que não cumprirem a ética profissional e desportiva serão tratadas de acordo com os regulamentos”, comentou a Federação de Futebol do Irão, num comunicado.
Até agora, segundo a Human Rights Activists in Iran, uma organização não-governamental que monitoriza os protestos, pelo menos 328 pessoas foram mortas na repressão ordenada pelo regime da República Islâmica e 14.825 mil foram detidas. Para além de outros actos de desafio – como andar na rua sem hijab, o que muitas iranianas fazem agora, principalmente em Teerão –, as manifestações continuam a realizar-se com frequência em mais de 200 cidades na maioria das 31 províncias.
Um mês depois das greves iniciadas pelos trabalhadores externos (das empresas privadas subcontratadas pelo Estado) das indústrias petrolífera e petroquímica em apoio aos protestos, a activista dos direitos civis Atena Daemi, escreveu terça-feira no Twitter que “na primeira etapa” de um protesto conjunto, os trabalhadores de pelo menos 37 plataformas de gás recusaram receber comida nas cantinas, avisando que se aproxima “o duro Inverno”. Há ainda notícia de greves numa grande empresa de produção de aço.
Entretanto, nas cidades do Ocidente do país houve greves generalizadas em solidariedade com os familiares das vítimas do massacre de 30 de Setembro na cidade de Zahedan (Sistão-Baluchistão), que na quarta-feira celebraram os 40 dias da sua morte (no Irão, é costume homenagear os mortos 40 dias depois). Nesse dia, as forças de segurança abriram fogo sobre os crentes que iniciavam um protesto à saída das orações de sexta-feira, matando 92 pessoas