Bullying é para fracos
As práticas educativas parentais baseadas no poder e na coação e caracterizadas pela hostilidade e severidade têm sido associadas ao comportamento agressivo dos alunos.
No mês que assinalou o Dia Mundial de Combate ao Bullying, o caso vindo a público de uma aluna agredir outra, ato incentivado e filmado por colegas de ambas, numa escola no Algarve, voltou a alertar-nos para o problema da violência nas escolas ou na sua vizinhança.
A direção do agrupamento de escolas reagiu prontamente, e bem, tomando como sua a situação, tal como se a agressão tivesse ocorrido no recinto escolar. Aqui reside, desde logo, a importância de se considerar que a responsabilidade da escola não se esgota no espaço físico da mesma, e que os agentes educativos devem estar atentos e interventivos face à ocorrência de comportamentos agressivos.
Não é de hoje a preocupação com a violência na escola, que se tem assumido como um desafio a enfrentar pela nossa sociedade.
Qualquer tentativa de abordagem deste problema exige conhecimento das implicações a ela associadas: meio sociocultural, contexto familiar e falta de apoio parental, circunstâncias que realçam a necessidade de intervenção no âmbito familiar e uma incapacidade de regulação emocional por parte do agressor, entre outras.
Convém recordar que as práticas educativas parentais baseadas no poder e na coação e caracterizadas pela hostilidade e severidade têm sido associadas ao comportamento agressivo dos alunos.
Diversos estudos concluem que o facto de os pais recorrerem a práticas disciplinares punitivas e coercivas os leva a ensinar e até incentivar os filhos a assumir semelhantes comportamentos como melhor forma de lidar com uma situação de conflito.
Deste modo, os alunos agressores encontram-se predispostos ao uso da força, uma vez que a mensagem que os progenitores lhes transmitem acerca das brigas e dos conflitos funciona como reforço.
Qual é o perfil deste tipo de alunos? O padrão estudado aponta para jovens com comportamentos inadequados e fraco rendimento escolar, influência de pares desviantes, falta de supervisão parental, probabilidade de consumo de álcool e tabaco, problemas de saúde mental, bem como problemas familiares.
Os bullies procuram descobrir colegas mais “fracos” ou com baixo índice de autoestima, sobre os quais possam descarregar as suas frustrações ou os seus medos, e a sua conduta resulta, em grande medida, de não conseguirem/saberem lidar de outra forma com os seus sentimentos/emoções.
Esta situação leva-nos a refletir sobre a importância de uma verdadeira educação para as emoções, tema para uma próxima abordagem neste espaço.
O tipo mais comum de agressão passa pelo insulto, chantagem e agressão física ou psicológica, muitas vezes manipulando colegas e amigos do/a agredido/a. Os espaços de recreio são, frequentemente, os mais propícios para exercerem esse comportamento.
Deveremos, pois, sensibilizar a comunidade educativa para a resposta que esta questão exige, aumentando a supervisão dos espaços escolares, porquanto esta prática contribui, decisivamente, para a diminuição do sentimento de insegurança, fragilidade e desproteção dos alunos vitimizados.
Em muitos casos, os alunos agressores, que antes beneficiavam de uma espécie de “consentimento silencioso”, passam a sentir em seu redor, quando observados e censurados os seus comportamentos, um ambiente intolerante às suas manifestações agressivas.
Naturalmente que esta supervisão deve ser incentivada junto dos vários interlocutores, tanto professores como auxiliares educativos, que devem desempenhar um papel mais presente e mais ativo nos recreios, corredores, cantinas e outros espaços escolares mais frequentados pelos alunos, onde os adultos geralmente não acedem (designadamente balneários e instalações sanitárias).
Sabemos que o recreio é um espaço de construção de liberdade e de autonomia, no qual as crianças podem beneficiar do facto de se envolverem em brincadeiras coletivas na ausência de uma orientação próxima do adulto. Mas esse espaço sem supervisão também pode contribuir para reforçar o estatuto de fragilidade e isolamento dos alunos vítimas de bullying, e isso não é admissível.
Um olhar mais atento por parte dos pais e dos professores pode contribuir para despistar eventuais situações de bullying e para que quer as vítimas quer os agressores passem a ser acompanhados, no propósito de ultrapassar as ocorrências.
Se incentivarmos a supervisão dos espaços escolares, devidamente enquadrada por um regulamento direcionado à regulação de comportamentos inadequados, estaremos a favorecer a perceção de um espaço menos ameaçador.
Se a essa perceção de um clima mais securitizante acrescentarmos a adoção de medidas no sentido de ajudar os alunos a ultrapassar alguns défices relacionais, através dos gabinetes de psicologia e de práticas de educação emocional, e a resolver os seus conflitos de forma construtiva, estaremos, seguramente, a contribuir para a diminuição de casos de bullying na escola.
Sabemos que o combate ao bullying não é uma missão de um dia, nem de um grupo de pessoas, mas, sim, de todos os dias do ano e de todas as pessoas, razão que levou o Ministério da Educação a impulsionar um “Plano de Prevenção e Combate ao Bullying e ao Ciberbullying” nas escolas.
Este plano tem associada a campanha “Escola Sem Bullying. Escola Sem Violência”, que se configura como instrumento de sensibilização, prevenção e intervenção, destinado a toda a comunidade educativa e visa a erradicação deste fenómeno.
Importa, contrariar a realidade negra que os dados de um relatório da UNICEF nos revelam: uma em cada três crianças no mundo, entre os 13 e os 15 anos, é vítima de bullying na escola, regularmente.
Esta informação estatística deve obrigar toda a comunidade educativa a refletir, de modo a que as escolas se transformem em verdadeiros e acolhedores espaços de crescimento pessoal e social.
“Bullying é para fracos” — eis como a PSP da Madeira designa a campanha de sensibilização e alerta que ativou na região autónoma.
A autora escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990