As cortinas estão abertas: os Doutores Palhaços recebem miúdos e graúdos no CCB
Fundada há 20 anos, a Operação Nariz Vermelho continua apostada em animar o dia das crianças hospitalizadas com os seus Doutores Palhaços.
O cenário não é de um hospital, embora existam batas brancas espalhadas pelo palco, onde predomina o vermelho. Esta é a mesma cor dos narizes dos Doutores Palhaços. É o “Dr. Bambu” quem primeiro chega à boca de cena e, tocando bateria, abre alas aos seus restantes colegas. É assim que abre o musical da Operação Nariz Vermelho “Compasso de Palhaço – Pequena Sinfonia para as Horas Vagas”, que estreia nesta quinta-feira e é apresentado até domingo, no Pequeno Auditório do Centro Cultural de Belém (CCB), em Lisboa, para assinalar o 20.º aniversário da associação Operação Nariz Vermelho (ONV).
A Operação Nariz Vermelho, fundada em Junho de 2002, por Beatriz Quintella, começou com apenas três Doutores Palhaços no Hospital D. Estefânia, em Lisboa. Hoje, a equipa constituída por 33 profissionais chega a 100 serviços hospitalares dentro de 17 hospitais portugueses e realizando cerca de 53 mil encontros anuais com crianças hospitalizadas. O trabalho consiste em animar as crianças que estão internadas. O balanço feito sobre o trabalho desenvolvido durante estes 20 anos, pela actual presidente da ONV, Luiza Teixeira de Freitas, é positivo: “Temos conseguido crescer de forma saudável e responsável. Estamos sempre a andar para a frente.”
Embora aos pais ou às crianças com que os Doutores Palhaços se cruzam no dia-a-dia, o seu trabalho possa parecer espontâneo, há muita preparação por detrás e Fernando Escrich faz o acompanhamento destes profissionais. É também ele que é o director artístico do musical que agora chega ao CCB, mas que já foi apresentado em 14 dos 17 hospitais onde a ONV marca presença.
“Compasso de Palhaço – Pequena Sinfonia para as Horas Vagas” estreou-se no primeiro hospital que recebeu a Operação Nariz Vermelho, quando a associação foi criada, o D. Estefânia, em Lisboa, na data que assinala os dias do Nariz Vermelho e da Criança, 1 de Junho, e chega agora ao público geral após uma tour pelos hospitais parceiros — depois de domingo, a digressão continua pelos hospitais do Norte do país.
Como surgiu a ideia do espectáculo? “A nossa ideia era agradecer a todos, às pessoas que nos apoiam, mas especialmente às crianças e aos profissionais de saúde”, responde Luiza Teixeira de Freitas.
Fernando Escrich conta também que a ideia por trás deste espectáculo surgiu após o atendimento online durante a pandemia onde, na impossibilidade de os profissionais estarem fisicamente nas unidades hospitalares, “as crianças tiveram oportunidade de estarem praticamente dentro das casas dos palhaços”, através de encontros à distância. Então, eram colocados tablets nos carrinhos do soro para que os meninos pudessem interagir com os palhaços. Agora, com este musical pretende-se levar ao público “um pouco do universo e do imaginário do palhaço”, defende o director artístico.
“Tivemos a oportunidade de em cada hospital evoluir um pouquinho pelo que cada apresentação é única e nos traz novos olhares e novos ritmos”, aponta Fernando Escrich ao PÚBLICO, na véspera da estreia no CCB. Ao longo do espectáculo, com a presença característica dos seus narizes vermelhos e os pequenos detalhes de pintura facial, os doutores palhaços “minimalistas” — como adjectiva Luiza Teixeira de Freitas —, contam aos mais novos um pouco sobre vários momentos do seu dia-a-dia, como o jantar ou o banho, sempre com a música em primeiro plano.
Duas décadas de trabalho
O musical em cena é uma das iniciativas que pretende assinalar o 20.º aniversário da Operação Nariz Vermelho, entre as quais se pode contar também com a exposição itinerante “Da ponta do nariz ao sorriso de uma criança”, que tem estado em diversos átrios de hospitais, contando a história da associação de uma forma interactiva.
Semanalmente, há uma dupla de Doutores Palhaços que, em cada hospital, visita as crianças, permitindo desenvolver “uma relação muito próxima”, descreve Fernando Escrich. Este trabalho foi já alvo de um projecto de investigação intitulado “Rir é o Melhor Remédio?”, feito em parceria com o Centro de Investigação em Educação da Universidade do Minho, que, tal como diz Luiza Teixeira de Freitas, revela “o quanto é que um Doutor Palhaço transforma o ambiente quando entra e o quanto é que o humor pode transformar os espaços e a sociedade”.
Mesmo com 20 anos de trabalho, a associação continua a inovar. Com um projecto pioneiro de visitas ao bloco operatório, a ONV vai um passo além das visitas habituais com um acompanhamento das crianças que vão ser operadas. “Aquele momento da separação dos pais é de muita tensão, o Doutor Palhaço vem amenizar essa tensão, está com a criança até ao momento em que ela adormece, trabalhando em conjunto com os profissionais de saúde”, descreve Luiza Teixeira de Freitas.
O principal desafio é a formação, diz Luiza Teixeira de Freitas. No futuro, a ONV gostaria de ter uma escola para preparar os futuros profissionais. Paralelamente, a presidente destaca a importância de fazer formações e workshops, em prol de um trabalho mais cuidadoso. “É muito importante para nós a profissionalização, para que o público perceba que o trabalho que é levado aos hospitais é resultado de uma formação especializada”, conclui.
Texto editado Bárbara Wong