Vegetarianos podem ficar mais deprimidos do que omnívoros — e não é por falta de nutrientes

Um estudo publicado no Journal of Affective Disorders sugere que as pessoas que não comem carne têm mais episódios depressivos do que as pessoas que consomem carne.

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unsplash O estudo aponta que vegetarianos ficam mais deprimidos do que as pessoas que comem carne

Os vegetarianos têm cerca do dobro de episódios depressivos do que as pessoas que comem carne, aponta um novo estudo.

De acordo com uma investigação anterior, as maiores taxas de depressão estavam entre aqueles que renunciavam ao consumo de carne. Este novo estudo, baseado em dados de inquéritos feitos no Brasil, sugere agora que esta ligação existe independentemente do consumo nutricional.

Pode parecer simples olhar para uma ligação entre uma dieta e problemas de saúde específicos e assumir que o tipo de dieta está a causar problemas ao nível da saúde através de alguma forma de deficiência nutricional.

O novo estudo, publicado no Journal of Affective Disorders, teve em conta uma enorme variedade de factores nutricionais, incluindo a ingestão total de calorias, ingestão de proteínas, ingestão de micronutrientes e o nível de processamento dos alimentos. Depois de concluída a análise, verificou-se que as taxas mais elevadas de depressão entre os vegetarianos não são causadas pelo conteúdo nutricional da sua dieta.

O que poderá explicar a relação entre o vegetarianismo e a depressão? Haverá algum mecanismo não nutricional que faça com esta dieta cause sintomas depressivos? Ou será que a relação se deve inteiramente a algo mais?

Em primeiro lugar, é possível que estar deprimido faça com que as pessoas tenham mais probabilidade de se tornarem vegetarianas do que o contrário. Os sintomas da depressão podem incluir o aparecimento de pensamentos negativos, bem como sentimentos de culpa.

Assumindo que as pessoas deprimidas e não deprimidas podem ter o mesmo acesso à verdade sobre matadouros e pecuária industrial é possível, neste caso, que as pessoas deprimidas sejam mais propensas a desenvolver esses pensamentos e ainda mais susceptíveis de se sentirem culpadas pelo papel que desempenham na procura destes bens.

Um vegetariano que se encontra deprimido não está necessariamente errado por pensar desta forma. Embora a depressão seja por vezes caracterizada por percepções negativas irrealistas, há evidências que sugerem que as pessoas com depressão ligeira a moderada têm julgamentos mais realistas sobre o resultado de acontecimentos incertos e percepções mais realistas sobre o seu papel e capacidades.

Neste caso, há realmente um tratamento cruel dos animais na produção de carne. E isto é realmente causado pela procura de carne barata por parte dos consumidores.

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Em segundo lugar, é possível que a adesão a uma dieta vegetariana cause depressão por outras razões que não a nutrição. Mesmo que não falte um “nutriente feliz” numa dieta vegetariana, pode acontecer que a renúncia à carne provoque depressão por outros motivos.

Por exemplo, adoptar uma dieta vegetariana pode afectar a relação com os outros e o envolvimento em actividades sociais e, por vezes, pode estar associado a provocação ou a outras formas de ostracismo social.

O novo estudo baseia-se em conclusões de inquéritos feitos no Brasil, um país conhecido pelo elevado consumo de carne. Alguns desses dados apontam para um forte aumento do vegetarianismo no Brasil nos últimos anos, passando de 8% em 2012 para 16% em 2018. No entanto, este estudo auscultou mais de 14 mil brasileiros e encontrou apenas 82 vegetarianos – um pouco mais de meio por cento.

Será que esta ligação entre o vegetarianismo e a depressão seria observada na Índia ou noutros países onde o vegetarianismo é mais uma norma social? Mais importante ainda, à medida que a taxa de vegetarianismo aumenta no Reino Unido e noutros países desenvolvidos, será que vamos ver esta relação desaparecer com o tempo?

É possível que nem o vegetarianismo provoque depressão, nem vice-versa, mas ambos podem estar relacionados com um terceiro factor: o número de características ou experiências associadas tanto ao vegetarianismo como à depressão.

Por exemplo, comparativamente com os homens, é mais provável que as mulheres se tornem vegetarianas e também são elas que estão mais propensas a passar por depressões. Porém, este estudo desenvolvido no Brasil teve em conta o sexo dos inquiridos, o que permitiu excluir esta última variável em particular.

Não examinada

Uma variável que não foi examinada, mas que está possivelmente ligada tanto ao vegetarianismo como à depressão, é a exposição a imagens violentas da indústria da carne. Prevenir a crueldade contra os animais é a razão mais citada pelos vegetarianos para evitar o consume de carne.

Documentários como Dominion e Earthlings, que retratam a crueldade na indústria da carne, não podem ser descritos como filmes para fazer as pessoas sentirem-se bem. Pode-se facilmente imaginar que uma pessoa que consome este tipo de produtos nos média se tornaria vegetariana e, especialmente quando a maioria das pessoas opta por olhar para o outro lado, deprimida.

Há várias razões possíveis para a ligação entre o vegetarianismo e a depressão. Este novo estudo sugere que a causa não passa pela qualidade nutricional da dieta vegetariana.

Em vez disso, a experiência social vegetariana pode contribuir para a depressão e a depressão pode levar a uma maior probabilidade para adoptar uma dieta vegetariana ou tanto o vegetarianismo como a depressão podem ser causados por uma terceira variável, como a exposição a imagens violentas da indústria da carne.


Exclusivo P3/The Conversation
Chris Bryant é director da Bryant Research, que faz serviços de consultadoria a diversas empresas de proteínas alternativas e organizações de protecção animal sem fins lucrativos.

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