Na Islândia é a natureza quem impera
O leitor Pedro Mota Curto partilha a sua experiência na terra do fogo e do gelo. “Em muitos locais da Islândia, a Terra respira, exalando vapores sulfurosos, rapidamente levados pelo vento, géiseres borbulhando infinitamente e lançando jactos de água quente, em rotinas imemoriais.”
A Islândia situa-se muito perto da Gronelândia e à mesma latitude da Sibéria e do Alasca. Aterrar nesta terra do fogo e do gelo ainda no Inverno leva-nos a uma aventura épica e memorável. Nesta ilha, com uma população reduzida e vivendo essencialmente na capital, Reiquejavique, situada no sudoeste do território, num fiorde um pouco mais resguardado das intempéries extremas, quem impera é a natureza. O interior da ilha é desabitado, a costa norte bastante inóspita, sendo que na costa sul as condições climatéricas serão um pouco mais favoráveis.
Deambular pelo sul da ilha, na segunda quinzena de Março, constitui uma experiência inolvidável. O Inverno aproxima-se do final mas as temperaturas permanecem negativas ou rondando os zero graus centígrados. O clima, rigoroso e gélido, todos os dias apresenta as suas variantes e caprichos, numa demonstração clara do poder inabalável da natureza. Nuns dias chove copiosamente, noutros neva, noutros sopra um vento impetuoso, alternando com sol e boas abertas, quando o sol reflecte na neve e no gelo que cobrem o solo, na cidade, no campo, na montanha, por todo o lado, a paisagem é branca.
Ao longo de dez dias percorremos cerca de 1200 quilómetros, sensivelmente entre Reiquejavique e Jökulsárión, caminhando junto a vulcões, observando inúmeras cascatas gigantes, algumas geladas, subindo até ao topo ou até à sua retaguarda, caminhando sobre glaciares milenares ou penetrando no seu interior, em assombrosas grutas de gelo, esventradas por impetuosos rios subterrâneos. As diversas tonalidades de azul, com milhares de anos, alternando com tonalidades de branco e de preto, preenchem a paisagem vítrea dos imponentes glaciares, derretendo e correndo para o mar.
As caminhadas pelas montanhas, percorrendo trilhos almofadados pela neve imaculada, projectam-nos sobre paisagens e desfiladeiros tão profundos quanto harmoniosos, provocando uma sensação de êxtase e de profunda admiração e respeito pela imponente natureza. Tudo envolto por um silêncio esmagador que nos transporta ao início dos tempos, quando o ser humano ainda não povoava este planeta azul nem perturbava as suas dinâmicas cósmicas.
Em muitos locais da Islândia, a Terra respira, exalando vapores sulfurosos, rapidamente levados pelo vento, géiseres borbulhando infinitamente e lançando jactos de água quente, a diversas alturas, com intervalo de alguns minutos, em rotinas imemoriais. Águas e vapores aproveitados para diversos fins, incluindo uma espectacular lagoa Azul, o mais famoso spa geotermal da Islândia.
O vulcão Eyjafjallajökull ficou conhecido há uns anos por ter interrompido o tráfego aéreo na Europa durante muitos dias, demonstrando inequivocamente o poder da natureza, bem visível na Islândia.
À noite, na ausência das nuvens, e de preferência afastado das povoações e das suas iluminações artificiais, é possível assistir ao espectáculo inacreditável da dança irrequieta das auroras boreais, verdes, diáfanas e esvoaçantes. Outro deslumbramento.
Pedro Mota Curto