O Orçamento do Estado passou para segundo plano
Primeiro-ministro foi claro ao afirmar a “centralidade da concertação social” no contexto de maioria absoluta. Aos partidos no Parlamento restará fazer alguns acertos de pormenor.
Em tempos de maioria absoluta que coincide com uma conjuntura de incerteza, o primeiro-ministro coloca toda a “centralidade” das negociações políticas na concertação social e no “diálogo tripartido entre Estado, confederações patronais e confederações sindicais”. Foi o próprio António Costa que o afirmou, na intervenção que fez após a assinatura do Acordo de Médio Prazo de Melhoria dos Rendimentos, Salários e Competitividade.
“Nenhuma maioria, por mais absoluta que seja, se basta a si própria e tem de dinamizar o diálogo”, afirmou o chefe de Governo, lembrando que este acordo segue-se a outros dois: o que foi alcançado em Julho com a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) no âmbito do processo de descentralização e o acordo de princípio conseguido em Setembro com o PSD quanto à metodologia do processo de estudos sobre o novo aeroporto de Lisboa.
Esta foi a principal mensagem política que António Costa quis realçar na véspera da apresentação do Orçamento do Estado para 2023 (OE2023): “Em momentos de incerteza, nada como o diálogo político, social, a todos os níveis”.
Certo é que o Acordo de Rendimentos e Competitividade vai ter reflexos importantes no Orçamento do Estado e na sua negociação com os partidos, uma vez que o diálogo parlamentar fica já balizado pelos grandes objectivos definidos em sede de concertação social, seja ao nível das medidas destinadas ao crescimento da economia, seja ao nível das medidas destinadas ao mercado de trabalho.
Ao nível fiscal, por onde passa grande parte das propostas de alteração à proposta de OE, sobretudo dos partidos à direita do PS, as linhas-mestras estão definidas neste acordo. Ao nível dos rendimentos, por onde forçarão medidas os partidos da antiga geringonça, o Governo ganha uma “bala de prata” que lhe permitirá esvaziar reivindicações dos partidos à sua esquerda.
Ainda que a CGTP não tenha assinado o acordo e mantenha para 15 de Outubro uma manifestação nacional, o Governo sempre poderá dizer que os aumentos previstos para os próximos quatro anos são históricos e incomparáveis com a recuperação de rendimentos dos anos da geringonça (deixando para segundo plano as diferenças nos níveis de inflação).
Durante os últimos dois anos, os partidos à esquerda do PS criticaram a valorização que o Governo pós-geringonça ia fazendo das negociações na concertação social. Agora já pouco ou nada podem fazer: o primeiro-ministro deixou claro onde estão agora os seus principais interlocutores para negociar as grandes políticas do Estado.