Passos chegou a pedir apoio do PS para resolver crise da demissão de Portas

Antigo primeiro-ministro aceitou escrever prefácio de um livro de Luís de Almeida Sampaio, que foi embaixador em Berlim.

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Pedro Passos Coelho lançará em breve o seu livro sobre o período em que liderou o Governo PSD/CDS Nuno Ferreira Santos

Ainda sem estar completo o puzzle da chamada crise do pedido de demissão irrevogável de 2013, no governo PSD/CDS, o ex-primeiro-ministro de então decidiu colocar mais uma peça no quadro. Pedro Passos Coelho tentou obter, nomeadamente através de Durão Barroso, o apoio do PS, na altura liderado por António José Seguro, para resolver a crise política aberta por Paulo Portas e fechar o programa de ajustamento. O episódio é relatado pelo próprio antigo primeiro-ministro no prefácio do livro “Diplomacia em tempo de troika”, de Luís de Almeida Sampaio, que foi embaixador em Berlim nessa altura.

No prefácio com 36 páginas, Passos Coelho expõe com detalhe o contexto económico-financeiro que levou ao pedido de resgate em 2011 por parte do Governo de José Sócrates, conduzindo a eleições legislativas antecipadas.

O antigo líder do PSD refere-se aos vários PEC (que se traduziam em medidas para tentar controlar a despesa pública) e à sua disponibilidade (até certa altura) para viabilizar o plano de austeridade do governo socialista. É neste ponto que estabelece um paralelo com a actualidade, lembrando que, apesar das medidas restritivas impostas em várias áreas, os socialistas passaram “o Verão naquele ano [2010] a acusar o PSD de ser neoliberal e de querer destruir o Estado social”. “De resto, ao fim de todos estes anos o registo mantém-se. Há, infelizmente, coisas nos responsáveis socialistas que não mudam em Portugal”, escreveu.

Só um outro momento político, embora com muito mais contenção, foi escolhido para incluir neste prefácio: as dificuldades em tentar estender as maturidades dos empréstimos europeus associados ao programa de ajustamento e os obstáculos em fechar a sétima avaliação da troika já quando o CDS assumia contestação aberta a algumas medidas de austeridade (curiosamente, uma delas era a aplicação de uma taxa às pensões).

Essas objecções e a substituição do então ministro das Finanças, Vítor Gaspar, por Maria Luís Albuquerque culminaram na demissão de Paulo Portas como ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.

Passos Coelho prefere não se debruçar sobre “esse episódio propriamente dito” – abrindo o apetite para o livro que está a escrever – já que isso “necessitaria de outro espaço com outro fôlego”. Mas relata um “desenvolvimento” que considera não ser “indiferente” para a “história do que aconteceu no país”.

Na noite da demissão de Paulo Portas, o antigo primeiro-ministro fez uma comunicação ao país onde garantiu que não abandonaria o Governo e manteve no dia seguinte uma deslocação à Alemanha para participar numa conferência europeia sobre emprego.

Nesse dia em Berlim, as preocupações sentidas eram as de saber como resolveria a crise.

“Ora, eu ainda não tinha a solução para a crise, mas sentia que estaria em condições de a resolver. No entanto, o que estava em jogo era suficientemente relevante para que tivesse de explorar todas as possibilidades”, escreveu, referindo que no dia em causa “não tinha obtido uma garantia” de que o CDS se manteria no Governo.

“Em bom rigor, naquela manhã eu não sabia sequer se teria ou não governo no dia seguinte. O que sabia era que mais nenhum partido poderia chefiar o governo do país naquele quadro parlamentar, e a realização de eleições naquele contexto significaria pelo menos ter de pedir um novo resgate”, lê-se no texto.

O antigo primeiro-ministro pediu então a Durão Barroso, na altura presidente da comissão Europeia, e ao líder dos socialistas no Parlamento Europeu, e presidente desse parlamento, Martin Schulz, para que propusessem a António José Seguro a sua concordância em “dar o apoio parlamentar necessário à conclusão do programa”, prevista para um ano depois. Como contrapartida, Passos Coelho comprometia-se, logo a seguir ao fecho do programa, a apresentar a demissão “e abrir o caminho à realização de eleições legislativas antecipadas”.

Do outro lado, “infelizmente”, a resposta foi negativa. O líder do PS “considerava que era já demasiado tarde para gestos de apoio ao Governo e entendia que o país precisava de eleições, não dali a um ano, mas naquele mesmo momento”.

O então Presidente da República, Cavaco Silva, também tentaria promover um acordo de “salvação nacional” entre PSD, PS e CDS mas igualmente sem sucesso. A crise política na coligação governativa terminou com uma nova recomposição no executivo: Paulo Portas recuou na sua intenção de abandonar o Governo (que tinha sido descrita como “irrevogável) e tornou-se vice-primeiro-ministro, a par de outras alterações ministeriais.

Outras revelações sobre este período da governação PSD/CDS são esperadas no livro de Passos Coelho, que deve sair em breve. Para já, o livro de Luís de Almeida Sampaio é apresentado por Durão Barroso, dia 4 de Outubro, na Universidade Católica de Lisboa.

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