Andréa Del Fuego é a convidada do Encontro de Leituras de Setembro

A sessão com a escritora brasileira acontecerá a 13 de Setembro, às 22h de Lisboa (18h de Brasília), no Zoom, aberta a todos os que queiram participar. Em discussão estará A Pediatra.

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Andréa Del Fuego André de Toledo Sade

Andréa Del Fuego é a convidada do próximo Encontro de Leituras, o clube de leitura do PÚBLICO e do jornal brasileiro Folha de S. Paulo. A escritora conversará sobre a novela A Pediatra, que aborda as relações de poder, a maternidade e o papel social dos médicos numa linguagem bem diferente da dos seus romances anteriores. Escrito em 2019, antes da pandemia, o livro foi publicado no Brasil pela Companhia das Letras em 2021 e saiu em Portugal neste Verão.

A sessão com a participação da autora brasileira acontecerá a 13 de Setembro, às 22h em Lisboa (18h em Brasília), no Zoom, e como habitualmente será aberta a todas as pessoas que queiram participar.

Pode juntar-se à sessão através deste link ou através da ID da reunião 863 4569 9958 (senha de acesso 553074).

Desafiar convenções

Cecília, a protagonista, é uma pediatra que tem um consultório bem-sucedido embora deteste crianças e as suas doenças. Na sua vida já em desequilíbrio – o marido está a ser medicado para a depressão e ela sofre de fibromialgia surge um “pediatra humanista”, atento às medicinas alternativas e aos partos naturais, que começa a roubar-lhe doentes.

Cecília nunca desejou ter filhos e seguiu as pisadas do pai, também médico. “Ninguém notava que eu tinha pouca vocação e paciência para ser médica, a boa formação garantia que eu não fosse processada, fazia bem-feito o feijão com arroz, procedimentos que qualquer pediatra faz escondiam minha inaptidão. Meu caso é comum, estudei medicina desapaixonada, com o pai no leme. (…) Meu pai era endocrinologista pediátrico e a área da diabetes infantil crescia, proprietário de um andar num edifício comercial, eu podia atender numa das salas. Aceitei a facilidade, segui na pediatria com o apoio paterno, mas não me especializaria num caso único, não queria ver sempre a mesma doença, nem mãe de filho com doença crônica.”

A escritora estava grávida quando veio a Portugal receber o Prémio José Saramago em 2011 pelo seu primeiro romance, Os Malaquias, que fora já finalista do Prémio São Paulo de Literatura e do Prémio Jabuti. Um ano depois contava ao PÚBLICO: “O prémio José Saramago é que pagou o parto que eu queria, com a equipa que eu queria, parto humanizado.” Agora escreveu esta história de uma pediatra que desafia as convenções do papel das mulheres.

A humorista Tati Bernardi escreveu na Folha de S. Paulo que Cecília é “uma das personagens mais apaixonantes” que leu este ano. E acrescentava: “É impossível ler esse livro sem ter vontade de ligar para a autora às duas da manhã e gritar: ‘OBRIGADA’. Estou muito grata, Andréa, por você ter criado essa mulher odiosa, que tira sarro das mães que acreditam ser muito superiores por darem à luz em uma piscininha de brinquedo cheia de fezes; das doulas que fazem reiki em parturientes que correm risco de vida (ou que estão desesperadas por alguma analgesia) e adoram aquele papo sobre os orgasmos na hora do parto e, por fim, crêem que seres que precisaram nascer de cesárea estão fora da bolha dos ‘olímpicos e imortais’.” Para a actriz e escritora Fernanda Torres, “o humor vil de Del Fuego tanto choca quanto fascina, nesse cirúrgico absurdo literário passado no sacrossanto momento do parto”.

Prazer de escrever

Andréa Del Fuego estava há cinco anos a tentar escrever um romance protagonizado por um personagem ligado ao universo masculino das artes marciais e do kung-fu. Para descansar, abriu outra página no computador e começou a escrever umas linhas na voz de uma mulher. Foi assim que nasceu Cecília, a personagem deste livro, que a autora acabou por escrever muito rapidamente, com uma voz e linguagem muito diferentes daquelas que caracterizam os seus anteriores romances.

Cecília é um pouco disfuncional, uma mulher branca, heterossexual, de classe social privilegiada e que dificilmente cria laços afectivos com alguém. As suas relações – com a empregada Deise, com a secretária no escritório, com os doentes – são sempre relações de poder, até mesmo com o pai, no qual ela busca protecção e colo.

A voz única deste livro que não dá ao leitor outros pontos de vista é a de um pensamento sem filtro. Andréa quis criar uma personagem que não soubesse que estava a ser escrita. Foi essa a ideia que a guiou neste romance que lhe deu muito prazer escrever. Assim é o início do segundo capítulo: “Marido infeliz mina até um jequitibá. Eu jogava na cara dele a rigidez das minhas articulações, uma fibromialgia se instalava por sua culpa. Ele estava havia meses de folga da construtora da família, os tratamentos para depressão surtiam efeito no início. (...) Claro que o deprimido não saía de casa, mas eu circulava.”

A escritora, que nasceu em São Paulo em 1975, tem formação em publicidade, fez produção de cinema e realizou duas curtas-metragens, Morro da Garça, inspirada nas paisagens de Guimarães Rosa, e O Beijo e Ela. É mestre em Filosofia pela Universidade de São Paulo e estreou-se literariamente em 2004 com a antologia de contos Minto enquanto posso, a que se seguiram Nego tudo (2005) e Engano seu (2007).

Em Os Malaquias, que lhe valeu o Prémio José Saramago, conta a história da sua família, e em particular dos bisavós, que morreram atingidos por um raio. Em Portugal, este romance que tem muito de realismo mágico está publicado na Porto Editora, que também editou o seu romance seguinte, As Miniaturas.

O Encontro de Leituras junta leitores de língua portuguesa uma vez por mês e discute romances, ensaios, memórias, literatura de viagem e obras de jornalismo literário, na presença de um escritor, editor ou especialista convidado. É moderado pela jornalista Isabel Coutinho, responsável pelo site do PÚBLICO dedicado aos livros, o Leituras, e pelo jornalista da Folha de S. Paulo Eduardo Sombini, apresentador do Ilustríssima Conversa, podcast de livros de não-ficção. Os melhores momentos de cada sessão podem ser ouvidos no podcast Encontro de Leituras.

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