Auto-retrato desconhecido de Van Gogh descoberto no verso de uma tela
A imagem escondida foi revelada através de um raio-X realizado numa operação de conservação de rotina à pintura The Head of a Peasant Woman. As National Galleries of Scotland vão tentar destapar o auto-retrato oculto por um cartão colado nas costas da tela.
Uma equipa de conservadores das National Galleries of Scotland descobriu um auto-retrato desconhecido do pintor neerlandês Van Gogh enquanto analisavam uma das pinturas da colecção do museu que fará parte de uma exposição a inaugurar em Edimburgo no final do mês.
A imagem escondida foi revelada através de um raio-X realizado numa operação de conservação de rotina à pintura The Head of a Peasant Woman (Cabeça de uma Camponesa), datada de 1885, revelou esta quinta-feira um comunicado do museu escocês sobre a descoberta.
O auto-retrato de Vicente van Gogh (1853-1890), um dos artistas mais celebrados da história da arte ocidental, estará oculto há mais de um século nas costas da tela coberta com cartão e cola. “Os nossos especialistas pensam que estes materiais foram aplicados antes de uma exposição realizada no início do século XX. Van Gogh reutilizava as telas para poupar dinheiro. No entanto, em vez de pintar sobre obras anteriores, ele virava a tela e trabalhava no verso”, explica o museu que prevê inaugurar a exposição A Taste for Impressionism - Modern French Art from Millet to Matisse a 30 de Julho, nas salas da Royal Scottish Academy.
“Quando vimos o raio-X pela primeira vez ficámos muito entusiasmados. Uma descoberta tão importante acontece uma ou duas vezes na vida de uma conservadora”, afirma Lesley Stevenson, conservadora de pintura do museu, num vídeo que acompanha a revelação da descoberta.
A imagem a preto e branco do exame, que será exibida numa caixa de luz no centro da exposição dedicada ao movimento impressionista, bem como às suas origens e influências posteriores, onde se inclui a obra de Van Gogh, mostra um homem de barbas com um chapéu de abas e um lenço ao pescoço. É semelhante a outros auto-retratos conhecidos do pintor, em que o olhar do artista é dirigido ao espectador. O lado direito do rosto está meio oculto na sombra, enquanto o lado esquerdo e a famosa orelha, aquela que viria a cortar com uma faca em 1888, são claramente visíveis.
A equipa de especialistas do museu escocês acredita que será possível destapar o auto-retrato escondido, “mas o processo de remoção do cartão e da cola requer um trabalho delicado de conservação”. Os conservadores das National Galleries of Scotland estão a investigar como é que a operação pode ser realizada sem danificar a pintura The Head of a Peasant Woman, uma das três obras de Van Gogh que a galeria de pintura tem na colecção pública.
A pintura foi integrada na colecção do museu em 1960, quando foi doada por Alexander Maitland, um conhecido advogado de Edimburgo. É o retrato de uma camponesa da cidade de Nuenen, situada no sul dos Países Baixos, onde o artista viveu entre 1883 e 1885, um dos vários estudos que fez para a pintura Os Comedores de Batata, também de 1885, influenciada pelo realismo de Jean-François Millet, um pintor que Van Gogh admirava.
É provável que o auto-retrato tenha sido pintado num momento-chave da carreira do artista, quando Van Gogh é influenciado pelos impressionistas franceses depois de se mudar para Paris em 1886 para estar perto do seu irmão Theo, um mecenas do movimento e um apoio muito importante para Van Gogh. É nesta fase que adopta uma paleta muito mais colorida e desenvolve uma pincelada mais expressiva que o tornarão um dos pintores mais famosos do mundo depois de morrer.
“Este período em que começa a produzir auto-retratos é chave para o desenvolvimento do seu estilo mais maduro, quando começa a experimentar a sua pincelada tão distintiva. Van Gogh era um pensador independente e desenvolveu o seu novo estilo radical muito rapidamente.” Um estilo geralmente classificado como pós-impressionismo.
Van Gogh morre em 1890, seguido seis meses depois pelo irmão. Todo o espólio do pintor é deixado à viúva de Theo.
O museu escocês acredita que foi por volta de 1905, quando The Head of a Peasant Woman foi emprestado para uma exposição no Stedelijk Museum, em Amesterdão, que foi tomada a decisão de colar o cartão à tela antes de a emoldurar. “Nesta altura, Peasant Woman foi evidentemente considerada mais ‘acabada’ do que o auto-retrato de Van Gogh.”
Se o museu conseguir libertar o auto-retrato do cartão e da cola, este novo rosto de Van Gogh junta-se a um grupo de auto-retratos e outras obras pintadas no verso das telas do chamado período de Nuenen. Cinco exemplos, lembra as National Galleries of Scotland, estão no Museu Van Gogh, em Amesterdão, enquanto outros se espalham pelo Metropolitan Museum of Art, Nova Iorque, pelo Wadsworth Atheneum Museum of Art, em Hartford (Connecticut, EUA) e o Kunstmuseum, em Haia.