Direcção executiva do SNS avança. Hospitais e centros de saúde terão mais autonomia

Marta Temido apresentou o novo estatuto para o SNS, que implicará algumas mudanças estruturais, nomeadamente nos centros de saúde que vão deixar de estar sob a gestão das Administrações Regionais de Saúde. Comissão executiva será nomeada pelo Governo e terá a missão de coordenar a resposta em rede do serviço público de saúde.

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Marta Temido defende a criação de uma direcção executiva do SNS LUSA/MIGUEL A. LOPES

O Governo aprovou esta quinta-feira o Estatuto do Serviço Nacional de Saúde (SNS). Esta era a peça que faltava depois da aprovação da nova Lei de Bases da Saúde, em 2019.

“É um momento aguardado há muito. Vale a pena recordar que o actual estatuto não corresponde às necessidades actuais dos serviços públicos de saúde porque passaram 30 anos da sua aprovação e muita coisa se alterou”, disse a ministra da Saúde, Marta Temido, recordando que a ideia era proceder logo à regulamentação após a aprovação da Lei de Bases da Saúde, mas a pandemia e a crise política impediram esse avanço no imediato.

Marta Temido explicou que o novo estatuto tem três linhas de intervenção: mais organização, mais autonomia e mais motivação para os profissionais de saúde. Linhas que se vão traduzir “na criação da comissão executiva, em maior autonomia dos serviços do SNS - hospitais e centros de saúde - e mais motivação para que se possam garantir melhores cuidados, mais acesso e mais humanização. Por isso, o instrumento da dedicação plena”.

Marta Temido tem dado grande ênfase à aprovação do Estatuto do SNS, apontando-o como sendo parte da solução para a melhoria da resposta do serviço público de saúde. Com especial destaque para a criação da direcção executiva do SNS que, segundo a ministra, permitirá uma melhor organização entre as várias entidades e serviços e assegurar a agilização da resposta em rede. Na conferência de imprensa, a ministra voltou a reforçar a ideia de que a comissão executiva terá um papel fundamental para terminar com o “défice de organização” que assumiu existir no SNS. A direcção executiva, explicou, “vai assumir a coordenação de toda a resposta assistencial, assegurando funcionamento em rede”.

Esta nova estrutura vai assumir funções que hoje pertencem à Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) - que continuará a ter a competência do planeamento dos recursos humanos e financeiros, a rede de equipamentos e a contratação de cuidados com o sector privado e social - e às Administrações Regionais de Saúde (ARS) - que vão ficar com o planeamento regional dos recursos, numa óptica de coordenação intersectorial -, como “a gestão da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados e cuidados paliativos”. E terá missões novas, “como a de designar os conselhos de administração dos hospitais com estatuto empresarial e os directores executivos dos Agrupamentos de Centros de Saúde [Aces]”.

Esta comissão executiva, explicou posteriormente Marta Temido, será nomeada pelo Governo. Para já, não quis revelar nomes. "Diria que é desejável que, no próximo outono, tenhamos esta estrutura a funcionar”, afirmou no final da apresentação.

Quanto à prometida autonomia dos estabelecimentos do SNS, Marta Temido também levantou o véu e traz grandes mudanças na área dos cuidados de saúde primários. “Em relação aos Aces, haverá uma alteração da natureza jurídica. O novo estatuto vai permitir, respondendo a uma aspiração da reforma dos cuidados de saúde primários, uma autonomia efectiva dos centros de saúde, que passarão a ter a natureza de institutos públicos de regime especial, dotados de autonomia e património próprios”, disse. Sem as ARS, a contratualização de prestação de cuidados é feita directamente com a ACSS.

No que diz respeito aos hospitais, haverá maior autonomia para contratação de recursos humanos e aplicação de incentivos. “Desde logo autonomia para contratação nas várias modalidades, mas também com uma orientação clara para em termos internos promoverem a organização em centros de responsabilidade integrada”, disse. Este modelo permite que as equipas sejam pagas em função de objectivos acordados com a administração. Os hospitais, sejam eles de gestão empresarial ou do sector público administrativo vão passar a poder contratar profissionais de saúde para suprimir necessidades temporárias. No caso dos primeiros, a autonomia vai traduzir-se também na possibilidade de contratação por tempo indeterminado, desde que isso esteja previsto nos documentos de gestão estratégica da unidade.

Dedicação plena em negociação

O estatuto prevê igualmente o regime de dedicação plena, um regime voluntário, mas que seria acessível apenas a uma parte dos médicos. A proposta do Governo foi aprovada em Conselho de Ministro em Outubro de 2021, pouco antes da dissolução da Assembleia da República, e esteve em consulta pública. Segundo a proposta, previa-se que o regime de dedicação plena pudesse ser renovado de três em três anos, tendo em conta o cumprimento de objectivos acordos entre o profissional e a instituição.

Nesta matéria, o anunciado não foi diferente do que já se conhecia desde o final do ano passado. O processo negocial, relacionado com eventuais acréscimos de horários e correspondente valor financeiro, com os sindicatos médicos está a decorrer. Este será um “regime gradual e progressivo”, que terá início com os médicos. “Será essencialmente voluntário, baseado numa carta compromisso negociada entre o profissional e a instituição. Este regime será sempre incompatível com o exercício de funções de direcção em unidades do sector social ou privado, excepto em consultórios de prática individual, e será obrigatório para os novos directores de serviço.”

Estas reformas, que a ministra salientou que não seriam possíveis sem o plano de investimentos previstos do Plano de Recuperação e Resiliência, vão implicar alterações legislativas. Após a publicação estatuto, o Governo terá 180 dias para promover os diplomas necessários. Questionada, Marta Temido referiu que este prazo pretende dar resposta às negociações que estão decorrer. Já o processo de alteração do Aces, o que se prevê é que possa entrar em vigor com o Orçamento do Estado de 2023.

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